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Economia e políticas públicas

Opinião|A ajuda da alta da produtividade

Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central, chama a atenção para possível fator que pode aumentar chances de pouso suave nos Estados Unidos... e no Brasil.

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Foto do author Fernando Dantas

O mercado está comemorando a desaceleração, mais forte que as projeções, da criação de empregos nos Estados Unidos, divulgada hoje. Isso é um sinal de que a política monetária apertada na economia norte-americana está funcionando de acordo com os planos do Federal Reserve (Fed, BC dos EUA), o que por sua vez aumenta a possibilidade de que os Fed Funds, a taxa básica (hoje em 5,25-5,50%), estejam no seu pico e não subam mais neste ciclo.

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A alta dos Fed Funds suga capitais para a economia central e atrapalha o afrouxamento monetário em países como o Brasil. É por isso que a notícia de hoje está fazendo a festa no mercado de ativos brasileiros, com alta forte da Bolsa e queda do câmbio e dos juros.

Mas há outra boa notícia recém-divulgada (na verdade, ontem) sobre a economia dos Estados Unidos, para a qual chama a atenção o economista Tony Volpon, ex-diretor do BC do Brasil e atualmente lecionando na Universidade de Georgetown, em Washington DC: a produtividade do trabalho nos Estados Unidos subiu em ritmo forte no terceiro trimestre, e em circunstâncias que podem significar uma tendência bastante alvissareira.

O crescimento anualizado da produtividade americana no terceiro trimestre foi de robustos 4,7%. Um detalhe importante para o qual o analista chama a atenção é de que essa alta se dá com o mercado de trabalho bastante aquecido, perto de pleno emprego, ainda que (como mostra o dado de hoje) possa se estar no início de uma desaceleração.

A relevância dessa circunstância, explica Volpon, é que os dois momentos anteriores de alta da produtividade do trabalho na economia americana em quase duas décadas tiveram um padrão comum: foram em momentos recessivos (após a crise global de 2008-9 e em 2020, ano auge de impacto econômica da pandemia), com grande perda de empregos.

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Segundo Volpon, é típico de recessões que, quando o emprego cai rapidamente, a produção não cai tanto num primeiro momento, e a produtividade sobe. Porém, como mostram tanto o caso pós crise financeira global quanto o pós-pandemia, quando o emprego volta, a produção também não acompanha no mesmo ritmo, e a produtividade "devolve" o que tinha ganhado antes, voltando a crescer no seu trilho tendencial.

Assim, o que parece bastante promissor na alta da produtividade no terceiro trimestre deste ano, para um ritmo bem acima do nível tendencial das últimas duas décadas, é que ela aconteceu sem um ambiente recessivo e de perda significativa de empregos.

Evidentemente, observa o economista, é cedo para saber de forma mais segura se essa alta recente da produtividade é o início de uma tendência mais duradoura ou um acidente temporário. Mas, na sua visão, BCs e autoridades econômicas tanto nos Estados Unidos quanto em outros países em que fenômenos parecidos ocorreram (como o Brasil), devem ficar atentos.

O efeito de uma alta mais consistente de produtividade na atual quadra econômica seria "tudo de bom", na visão de Volpon. Significa possibilidade de mais PIB com menos inflação e menos juro. Em relação ao atual momento das condições monetárias e financeiras, pode apontar que a reprecificação recente para um nível mais contracionista da trajetória futura dos juros pode até ter ido um pouco além da realidade (daí o alívio hoje nos mercados).

Com o potencial da economia subindo, torna-se de fato possível o pouso suave e a desinflação indolor que tanto vêm sendo discutidos por mercados e autoridades econômicas, ora com perplexidade de que isso esteja ocorrendo, ora com ceticismo sobre se de fato está ocorrendo. Nesse sentido, se uma tendência de alta da produtividade se confirmar, isso ajuda a colocar nos seus lugares algumas importantes peças do quebra-cabeças da economia americana e de vários outros países na atualidade.

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Segundo Volpon, uma alta da produtividade em termos mais microeconômicos, de ganhos de eficiência, poderia estar derivando do fato de que as empresas foram jogada nos mar caótico das turbulências econômicas ligadas à pandemia e tiveram que aprender a nadar nessas condições.

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Assim, de um dia para o outro, as empresas tiveram que aprender a funcionar com todos os empregados trabalhando em casa e em meio a enormes gargalos e entupimentos logísticos e de oferta.

"Isso pode ter levado muitas empresas a saírem de certa inércia dada pela estabilidade anterior e a revisarem todos os seus processos de gerenciamento, produção, controle e custos", aponta o economista. E essa reação, por sua vez, pode ter criado ganhos de eficiência, sobretudo no setor privado, tão disseminados que acabaram por se refletir na produtividade agregada.

Volpon acrescenta que essa camada de ganho de produtividade hipoteticamente derivada de avanço de eficiência ligado à reação das empresas à pandemia se soma aos ganhos pelo lado da oferta da reconstituição do estado normal de funcionamento das cadeias logísticas e de produção. E uma terceira camada que poderia estar começando a crescer - novamente ele frisa que essas são considerações por enquanto especulativas, a serem mais bem investigadas - são efeitos positivos da inteligência artificial na produtividade.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

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Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 3/11/2023, sexta-feira.

 

O colunista está entrando de férias e volta a escrever esta coluna em 17/11/2023, sexta-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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