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Economia e políticas públicas

Opinião|América Latina, o patinho feio

Grandes economias da região, como Brasil, México e Colômbia, desempenharam mal nos mercados em junho. Os motivos variam, segundo os analistas.

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O economista Robin Brooks, do Instituto Brookings (think-tank americano), ex-Goldman Sachs, está desapontado com o Brasil. Ele, que até há pouco tempo era um dos analistas internacionais mais otimistas com as perspectivas brasileiras, assiste agora à deterioração dos ativos nacionais e, como quase todo o mercado, responsabilizou em alguns comentários na rede social X a gestão fiscal do governo Lula.

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Em outro recente comentário no X, ele estende à sua decepção à América Latina, notando que junho foi um mês ruim para a região: o peso mexicano se desvalorizou 7,6%; o peso colombiano, 6,9%; e o real do Brasil, 6%. Nesse comentário, ele recua de atribuir a piora no Brasil sobretudo à Lula, escrevendo que parte do efeito é simplesmente a América Latina como um todo apanhando dos mercados globais.

E, de fato, a relação entre a taxa média de risco das economias latino-americanas e a taxa média de risco das demais economias emergentes, em gráfico da consultoria LCA com base em dados JP Morgan, está em seu ponto mais alto desde pelos menos 1998, situando-se num ponto aproximadamente médio entre 2,5 e 3.

Como explica Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimentos, no caso mexicano, o resultado das eleições em 2 de junho, em que Claudia Sheinbaum - a candidata da coligação eleitoral do atual presidente, Andrés Manuel Lopez Obrador - foi eleita presidente, mexeu com os mercados. Não porque a vitória de Sheinbaum não fosse amplamente antecipada, mas sim porque a coligação vencedora, de esquerda, obteve uma supermaioria no Congresso (maiorias expressivas na Câmara e no Senado), o que possibilita que reforme a Constituição mexicana.

Fernando Rocha, economista-chefe da gestora JGP, inclusive considera a comparação entre México e Brasil meio "injusta", exatamente por causa do resultado das eleições mexicanas. Ele acrescenta que Brooks durante um bom período foi bastante otimista com o Brasil, com o grande aumento das receitas com petróleo sendo um dos principais motivos, e agora está naturalmente decepcionado pelo caminho tomado pelos ativos nacionais, especialmente pela forte desvalorização do real.

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Já na Colômbia, acrescenta Sobral, onde o também esquerdista Gustavo Petro é presidente, há um processo de piora fiscal. Esses eventos na América Latina ocorrem com o pano de fundo do fortalecimento do dólar no mundo, o que amplifica as desvalorizações na região ligadas a preocupações com os fundamentos, justificadas ou não.

No Brasil, na visão de boa parte do mercado, o problema está na área fiscal, e é amplificado pelos sinais emitidos pelo governo - principalmente pelo presidente Lula em sucessivas declarações públicas - de pouca disposição para cortar gastos. Além disso, Lula está transferindo toda a "culpa" pelo mau momento dos ativos brasileiros ao presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, apesar de a última reunião do Copom, que manteve a Selic em 10,5%, ter tido votação unânime, incluindo os quatro diretores nomeados por Lula.

Segundo um experiente gestor, uma sucessão de sinais negativos do governo - incluindo o que ele chama de "sincericídio" do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em reunião com o Santander que vazou para o mercado, na qual o ministro "deixou claro que quem decide sobre fiscal é o Lula e o Lula não quer cortar despesas" - foi deixando o mercado descrente sobre a vontade e a capacidade do governo de fazer o ajuste fiscal. Inclusive essa decepção do mercado pegou muitos fundos posicionados de forma mais otimista, levando a fortes perdas.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 2/7/2024, segunda-feira.

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Opinião por Fernando Dantas
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