A queda recente na popularidade de Lula animou o mercado financeiro, mostrando uma preferência pela derrota do atual presidente (se de fato concorrer) no pleito eleitoral de 2026. Como Bolsonaro, que acaba de se tornar réu, é visto como carta fora do baralho, as apostas convergem para um perfil mais "light" de direita populista, como Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo.
É possível contestar a aplicação do adjetivo "populista" a Tarcísio, que tem sólida formação e atuação como tecnocrata. Mas é o próprio político que, seguindo as recomendações do seu marketing político, mantém-se como fiel aliado de Bolsonaro, e adotou uma política de segurança em São Paulo ao gosto do ex-presidente. A percepção é que, em 2026, mais uma vez a polarização entre petismo e bolsonarismo dominará o eleitorado, e quem não se colocar em algum desses dois campos não terá como ser protagonista.
No entanto, em tempos turbulentos como os atuais, as mudanças costumam ser mais rápidas. Com a acachapante vitória eleitoral de Donald Trump em novembro passado, o populismo de direita pareceu chegar ao seu auge, mas alguns sinais de corrosão já se fazem sentir.
A popularidade do presidente americano já entrou no território negativo neste final de março (49,7% de desaprovação contra 47,5% de aprovação) no agregado de pesquisas divulgado por Nate Silver, conhecido estatístico e analista quantitativo de política e esportes. O aumento das expectativas de recessão e alta da inflação nos Estados Unidos, assim como o imbróglio da inclusão de um jornalista num grupo de mensagens do alto escalão do governo em que se tratou de possível ataque ao houthis no Iêmen, podem trazer mais problemas para a popularidade de Trump.
Outra faceta de possível mudança no clima político global é o "efeito Trump" na popularidade de diversos chefes de Estado de diferentes países. Na verdade, o estilo agressivo e ofensivo com que o presidente dos EUA vêm tratando seus pares em reuniões e fóruns internacionais está turbinando a popularidade de presidentes e primeiros-ministros que dão a impressão de se contrapor aos ataques trumpistas.
Assim, houve um salto na aprovação líquida (aprovação menos desaprovação) de vários chefes de Estado desde que Trump tomou posse. Mesmo ainda se mantendo em território amplamente negativo (-40%), Emmanuel Macron, presidente da França, recuperou vinte pontos porcentuais (pp). Volodmir Zelensky, presidente da Ucrânia, avançou 15pp em território positivo (para +40%), mesmo com o ritual de humilhação que sofreu na Casa Branca. Claudia Sheinbaum, presidente do México, avançou 10pp para uma aprovação líquida de aproximadamente +70%.
O caso mais impressionante foi o do Canadá - possivelmente, após a Ucrânia, o país mais hostilizado por Trump. O ex-primeiro ministro, Justin Trudeau, zerou a aprovação líquida, saindo de um nível abaixo de -55% para zero. Ele foi substituído como primeiro-ministro por Mark Carney, novo líder do Partido Liberal (que estava péssimo nas pesquisas antes de Trump assumir), que já parte de uma popularidade líquida de +20%.
Chama a atenção que todos os chefes de Estado que se beneficiaram da belicosidade de Trump, citados acima, são centristas ou, num caso (Sheinbaum, do México), de esquerda.
No Brasil, é muito difícil antecipar quais serão as consequências político-eleitorais do processo contra Bolsonaro no Supremo, por tentativa de golpe de Estado. Pode-se pensar que, ao tentar posar de vítima, o ex-presidente consiga galvanizar a sua base e se manter como protagonista da cena político-eleitoral. Mas a contínua exposição dos seus ataques contra a democracia, somada ao comportamento destemperado de Bolsonaro, também podem ter efeito contrário. Que poderia ser reforçado por um fiasco mais agudo do governo Trump.
Assim, não é tão cristalino que Bolsonaro será um trunfo indispensável para qualquer candidato à direita em 2026. A mesma radicalização intransigente que levou Trump ao seu maior triunfo há poucos meses (e que guia os passos do bolsonarismo) pode desestabilizar e precipitar o recuo - eventualmente rápido - do populismo de direita na sua versão mais nua e crua.
Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)
Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 26/03/2025, quarta-feira.