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Economia e políticas públicas

Opinião | Como fazer os ricos pagarem

Relatório prefaciado por Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de Economia, e que tem como um dos coordenadores Gabriel Zucman, ganhador da "Clark Medal" deste ano, analisa resultado de iniciativas dos últimos dez anos (e apresenta sugestões) para tentar fazer com que multinacionais e os muitos ricos paguem mais impostos.

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Foto do author Fernando Dantas

Uma das questões mais candentes no debate econômico-político em boa parte do mundo, e fortemente presente também no Brasil, é a tributação dos ricos. A sensação geral é de que os que mais ganham e as empresas mais poderosas contribuem menos do que deveriam, valendo-se de uma miríade de artifícios legais, como a transferência contábil de lucros para paraísos fiscais.

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Nos últimos dez anos, entretanto, surgiram importantes iniciativas multilaterais para combater a evasão e elisão fiscal pelas multinacionais e os muito ricos. Em 2017, foi lançado um sistema automático de compartilhamento de informações bancárias que hoje inclui mais de 100 países. E, em 2021, mais de 140 países chegaram a um acordo histórico em torno da proposta de um imposto de renda mínimo corporativo global de 15%.

Mas essas iniciativas estão tendo resultado? A resposta é mista, com algumas trazendo avanços, outras decepcionando, segundo um minucioso relatório recém-lançado pelo think-tank EU Tax Observatory (observatório tributário da União Europeia) sobre a evasão global de impostos.

O trabalho, que envolveu mais de 100 pesquisadores no mundo todo, foi coordenado pelos economistas Annette Alstadsäter, Sarah Godar, Panayiotis Nicolaides e Gabriel Zucman.

O francês Zucman, da Universidade de Califórnia em Berkeley, ganhador da Clark Medal deste ano (prêmio americano para economistas de menos de 40 anos, que têm muitos ganhadores que vieram a ganhar o Nobel também), é especialista em evasão e elisão fiscal de multinacionais e tem parcerias (incluindo coautoria de um livro) com Thomas Piketty, também francês, e o economista que mais contribuiu para trazer de volta o tema da desigualdade no debate global.

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No prefácio ao documento do EU Tax Observatory, Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel de Economia, que é cochairman da Comissão Independente pela Reforma da Tributação Internacional das Corporações (ICRICT, na sigla em inglês), escreve que a troca automática de informações bancárias mencionada acima, que restringiu o sigilo bancário em termos globais, levou a uma redução a um terço da evasão fiscal offshore.

Por outro lado, Stiglitz nota que a iniciativa do G20-OCDE conhecida como "Projeto Erosão de Base e Desvio de Lucros (BEPS, na sigla em inglês)", lançada em 2013 para combater a elisão fiscal pelas multinacionais, desapontou. A elisão corporativa continuou a aumentar e brechas e exceções neutralizaram os efeitos da proposta de 2021 de IR corporativo global mínimo de 15%.

Aliás, Stiglitz e as instituições pró-aumento da taxação de ricos e multinacionais nas quais o Nobel milita consideram que 15% é muito pouco para o IR corporativo mínimo global, e defendem a alíquota de 25%.

Em relação ao acordo do IR global mínimo de 15% para as multinacionais, o relatório aponta que as expectativas positivas de 2021 foram "dramaticamente reduzidas". Segundo o estudo, uma crescente lista de brechas criadas pelos países reduziu pela metade a projeção de que a iniciativa levaria a um aumento de 10% nessa fonte de receita tributária em termos globais.

Em 2022, cerca de US$ 1 trilhão em lucros das multinacionais, ou 35% do total, foi desviado para paraísos fiscais, levando a uma perda tributária global de 10% nessa base de impostos.

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O estudo também indica que um fenômeno crescente no mundo é a evasão fiscal dos muitos ricos "na zona cinzenta na fronteira da legalidade". Segundo o trabalho, os bilionários globais pagam taxas de impostos equivalentes 0,5-1% do seu patrimônio, principalmente usando holdings para evitar o imposto de renda.

Uma das propostas do relatório é um imposto mínimo aos bilionários equivalente a 2% do seu patrimônio, que geraria receitas tributárias globais de US$ 250 bilhões a partir de uma base de menos de 3 mil pessoas.

Em relação ao Brasil, é interessante notar que a estimativa do relatório do EU Tax Observatory é de um ganho de quase R$ 40 bilhões por ano no IRPJ/CSLL com o acordo de tributação mínima da OCDE (e também aspectos relacionados à realocação da tributação das empresas bigtechs), que passavigorar no ano que vem.

Esse número inclui mudanças - já aprovadas no Congresso em maio deste ano - relativas a "preços de transferência" de multinacionais. Trata-se de reprimir a prática de subfaturar vendas das multís do Brasil para subsidiárias próprias em paraísos fiscais ou países com impostos menores, como forma de transferir o lucro do Brasil para essas jurisdições.

Outro aspecto relevante do relatório do EU Tax Observatory, relativamente ao Brasil, é que, caso a alíquota mínima internacional de tributação das multinacionais subisse de 15% para 25%, como os autores do trabalho defendem, o aumento de arrecadação anual no Brasil com IRPJ/CSLL aumentaria para cerca de R$ 85 bilhões.

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Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças-, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 24/10/2023, terça-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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