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Economia e políticas públicas

Opinião|Dança entre El Niño e La Niña fica melhor para Brasil em 2025

Fenômeno El Niño prevaleceu de meados de 2023 a meados de 2024, e foi choque negativo para agricultura brasileira. Agora, a previsão é de La Niña moderado ou neutralidade. Estudo da Nature mostra que El Niño é muito pior economicamente do que La Niña.

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Segundo previsão da Conab, o Brasil deve ter em 2025 (safra 2024/2025) a maior safra de grãos da sua história, atingindo 322,47 milhões de toneladas. Como se sabe, o Brasil também teve um recorde histórico na safra 2022/2023 (319,8 milhões de toneladas), mas, na sequência, há a queda de 6,9% na safra de 2023/2024, com 297,8 milhões de toneladas. Agora, a previsão de crescimento da Conab para a safra de 2024/2025 é de 8,3%.

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O economista Bráulio Borges, da consultoria LCA e do IBRE-FGV, que vem se debruçando sobre a influência do clima na economia, nota que essa melhora da safra de 2024 para 2025 pode estar associada às flutuações recentes dos chamados fenômenos El Niño-La Niña. O El Niño é um aquecimento anômalo das águas centrais e orientais do Pacífico equatorial. O La Niña é o fenômeno inverso, resfriamento anômalo, portanto. Ambos causam alterações consideráveis no clima global.

Borges observa que um El Niño de moderado e forte prevaleceu entre meados de 2023 e 2024. Como explica o pesquisador, "no Brasil, o El Niño provoca seca no Norte e Nordeste e excesso de chuvas no Sul, além de aumento da temperatura no país como um todo, e isso é negativo para boa parte das lavouras".

Foi portanto, um choque de oferta negativo para a agricultura brasileira, que se refletiu na safra 2023-2024.

A boa notícia, no entanto, é que hoje se verifica uma transição de El Niño para situação neutra (nem El Niño nem La Niña) ou La Niña moderado. O que significa a reversão de um choque negativo desfavorável e, portanto, uma boa notícia para a agricultura no Brasil (e em outras países), tendo em vista a próxima safra. Esse fato, por sua vez, correlaciona-se com a previsão da Conab de recorde histórico da safra de grãos no Brasil em 2025.

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Um estudo publicado pela Nature em setembro de 2023 por cinco cientistas (Yi Liu, Wenju Cai, Xiaopei Lin, Ziguang Li e Ying Zhang) mostra que, em nível global, há de fato uma assimetria entre os efeitos econômicos do El Niño e do La Niña. Enquanto o primeiro tem efeitos econômicos extremamente negativos, os do La Niña ficam entre neutros e ligeiramente positivos, quando se analisa o padrão de prejuízos ou ganhos a depender do país e da região do mundo.

Os cientistas estimam que o El Niño provocou perdas econômicas globais (num horizonte de três anos) de US$ 2,1 trilhões na sua ocorrência entre os anos de 1997-98, e de US$ 3,9 trilhões em 2015-16. Em ambos os casos, tratou-se de El Niños extremos. É um efeito muitíssimo maior do que o ganho líquido global de cerca de US$ 60 bilhões no La Niña extremo de 1998-99.

Os autores do estudo alertam que o aquecimento global intensifica as variações de temperatura do Pacífico associadas aos fenômenos El Niño-La Niña, o que pode fazer as perdas econômicas aumentarem exponencialmente. Eles estimam que, num cenário de elevadas emissões, pode haver uma perda de US$ 33 trilhões para a economia global até o fim deste século, considerando uma taxa de desconto de 3%. No melhor dos cenários de emissões, a perda é de US$ 14 trilhões.

Voltando ao Brasil, o economista Ricardo Barboza, professor do IBMEC e pesquisador associado do IBRE, nota que, caso a previsão da Conab para a safra 2024-2025 se confirme, pode ser um fator favorável no front da "cheapflation", o fenômeno de a inflação dos produtos baratos superar aquela dos produtos caros, discutido neste espaço em coluna recente. Ele que dizer que uma boa safra poderia ajudar a reduzir ou até a reverter a "cheapflation".

Barboza observa, por exemplo, que a safra de arroz em 2025 tem previsão de crescimento de 14% (em parte, possivelmente, porque a deste ano foi prejudicada pelas enchentes no Rio Grande do Sul). De qualquer forma, uma safra brasileira maior de produtos agrícolas em geral significa pressão para baixo no preço dos alimentos (não é o único fator, claro), o que é um boa notícia para a população e para o governo.

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Um último aspecto, lembrado por Borges, que também pode ser favorável à agricultura em 2024 - e também para a produção de energia e para o PIB em geral - é a projeção oficial atual de que, no ano que vem, as chuvas serão de cerca de 80% da média histórica (a boa notícia depende, claro, de a projeção se confirmar). Evidentemente, poderia ser ainda melhor, já que se permanece abaixo da média histórica. Mas já seria uma mudança positiva significativa em relação a 2024, que parece caminhar para precipitações de 60% da média histórica.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 15/10/2024, terça-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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