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Economia e políticas públicas

Opinião|Economia está superaquecida mesmo?

Para o economista Bráulio Borges, nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Economia só chegou ao pleno emprego no segundo trimestre, e de 2015 ao 1º tri deste ano havia capacidade ociosa. Mas ele alerta que não dá para seguir agora no mesmo ritmo sem provocar desequilíbrios.

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Com a divulgação do PIB do segundo trimestre, que veio bem mais forte que o esperado, muitos economistas - especialmente do mercado financeiro - tiveram uma curiosa reação: ficaram pessimistas.

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Não é porque economistas liberais não gostem de crescimento econômico. A razão é que julgaram que houve um impulso fiscal exagerado, que está superaquecendo a economia. Assim, o PIB está rodando acima do seu potencial, o que alimenta a inflação e/ou a piora das contas externas.

Bráulio Borges, economista da consultoria LCA e do IBRE-FGV, considera que "nem tanto ao mar, nem tanto à terra".

Ele vem trabalhando numa reestimação, com metodologia bem mais sofisticada do que o habitual, do PIB potencial e do hiato do produto, para ajudar o governo a calcular o resultado primário estrutural de forma mais precisa.

Segundo os primeiros resultados dessa pesquisa, a economia ainda tinha hiato do produto negativo - isto é, sobravam recursos - até o primeiro trimestre deste ano. Borges nota que o hiato do produto calculado pelas metodologias do mercado, e dele mesmo antes desse estudo, apontavam que o hiato já estava positivo (economia acima do potencial) desde meados do ano passado.

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"Não é nada drástico, mas meus novos cálculos esticaram [o fechamento do hiato do produto] em alguns trimestres", ele diz. Ele acrescenta que a estimativa oficial do BC também indicava hiato negativo no primeiro trimestre deste ano.

Segundo Borges, se, de 2015 até o primeiro trimestre deste ano, havia excesso de ociosidade na economia, fazia sentido que a política econômica estimulasse a demanda.

O economista nota que há várias maneiras de se fazer isso. Uma é o estímulo fiscal, mas que encontra seu limite no crescimento da dívida pública. Já a política monetária está em terreno contracionista desde o final de 2021.

Há ainda a política parafiscal (expandir crédito dos bancos públicos) ou, como ele diz, "contar com a sorte de algum choque internacional favorável". Um exemplo são altas fortes das commodities, algo que poderia acontecer no caso de uma recuperação mais exuberante da economia chinesa (o que não parece provável). Evidentemente, choque internacionais favoráveis são algo totalmente fora do controle do governo brasileiro.

Na leitura de Borges, a economia brasileira realmente chegou ao pleno emprego no segundo trimestre. Não é, portanto, uma economia que vem numa marcha forçada. Isso acontecerá se o mesmo ritmo permanecer daqui para a frente.

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Ele nota que esse diagnóstico se encaixa bem com a média de dez núcleos de inflação do IPCA, que, no acumulado em 12 meses, está em 3,6% (acima da meta de 3%, mas um número que não chega a assustar), comparado a 4,2% do índice cheio.

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Borges aponta que três fatores não ligados à demanda estão somando ligeiramente mais do que 1 ponto porcentual ao IPCA de 2024, cuja estimativa pelo mercado está em 4,3%. Um deles é a depreciação do real desde abril, outro a recomposição inflacionária, após muitos anos, de um imposto sobre cigarros, e, finalmente, o ano deve fechar com bandeira amarela ou vermelha nas contas de energia elétrica, comparado à bandeira verde no final de 2023.

Borges diz que essa parte (acima) da sua análise é o "copo meio cheio". Mas há também um ângulo do "copo meio vazio". O ritmo de crescimento do primeiro e segundo trimestres, dessazonalizado e anualizado, está na casa de 5,1%, enquanto o economista vê o PIB potencial brasileiro em torno de 2%. Em outras palavras, esse ritmo não tem como prosseguir sem provocar desequilíbrios mais sérios na economia.

Mas é plausível extrapolar o ritmo do primeiro semestre para o segundo? A política monetária, nota Borges, já é contracionista, e a expectativa é de que os juros aumentem. Resta olhar para a política fiscal.

Se o governo federal cumprir as metas fiscais de 2024 e 2025, haverá um freio fiscal. Por outro lado, também ocorre um significativo expansionismo fiscal por parte dos Estados. A questão é saber se ele continuará depois do ciclo eleitoral deste ano. Nesse sentido, conclui Borges, o atual acordo da dívida estadual com a União já aprovado no Senado é bastante preocupante, já que é um acerto muito camarada e abre espaço para os Estados gastarem mais. Na visão do economista, a equipe econômica deveria tomar muito cuidado sobre o que vai finalmente ser aprovado nessa seara da renegociação da dívida estadual.

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Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 11/9/2024, quarta-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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