A projeção populacional realizada pelo IBGE em 2018 indicou que a população brasileira em meados de 2022 seria de 214,8 milhões. Assim, houve certo susto quando o Censo de 2022 apontou uma população de 203,1 milhões. Porém, agora em agosto de 2024, o IBGE fez nova revisão para a população de 2022, que seria de 210,9 milhões.
Foi um alívio, porque se o número do Censo 2022 estivesse correto, o envelhecimento demográfico do Brasil seria ainda mais veloz e intenso do que imaginava, com todas as suas consequências sociais e econômicas ligadas ao aumento, em termos proporcionais, de idosos e inativos.
Ainda assim, a população brasileira em 2022, segundo a revisão de agosto, é 3,8 milhões inferior à projeção de 2018.
O economista Francisco Pessoa Faria, da LCA Consultores - que, em setembro de 2023, alertou acertadamente para a possibilidade de subenumeração populacional do Censo 2022 em artigo no Blog do IBRE -, acaba de publicar um relatório sobre a revisão populacional mais recente do IBGE, de agosto deste ano.
Entre outros temas e detalhes, Faria chama a atenção para o fato de que a grande estrela da explicação da diferença entre a projeção de 2018 e a revisão de 2024 para a população brasileira em 2022 é algo a que normalmente não se dá muita atenção nas discussões demográficas no Brasil: o saldo migratório internacional. Isto é, a diferença entre os imigrantes que vêm para o Brasil e os emigrantes que saem do País.
O pesquisador mostra uma comparação entre as estimativas do crescimento da população entre 2010 e 2022 a partir das projeção do IBGE de 2018 e da revisão de 2024. Da diferença de 3,8 milhões do crescimento populacional no período 2010-22 entre a projeção de 2018 e a revisão de 2024 (esta última é menor, como já mencionado), uma parcela de 0,8 milhão é explicada por menos nascimentos, 0,7 milhão por mais mortes e 2,3 milhões por um saldo migratório internacional negativo nesse mesmo montante. O que significa que a projeção de 2018 para a variação do saldo migratório entre 2010 e 2022 era praticamente nula.
Faria aponta adicionalmente que esse protagonismo do saldo migratório internacional ocorre mesmo levando em conta que tanto o aumento da projeção de óbitos quanto a redução da projeção de nascimentos no período 2010-22, entre a projeção de 2018 e a revisão de 2024, foram significativas. A razão é a ocorrência da pandemia em 2020-21. Obviamente, esse é um fato não antecipado em 2018, que levou não só a mais mortes mas também a menos nascimentos.
No relatório, Faria mostra que há razões para que o Brasil se preocupe com as consequências econômicas desse vazamento líquido de população para o exterior. A onda emigratória provavelmente está concentrada na população em idade de trabalhar, e não há nenhuma razão para supor que tenha um nível médio de escolaridade (que impacta a produtividade) inferior à média brasileira.
O pesquisador nota ainda que é bem possível que esse fluxo emigratório se concentre em idades que estão bem no "miolo" da população em idade de trabalhar, que têm maiores taxas de participação no mercado de trabalho.
Faria observa ainda que a revisão das projeções populacionais de 2024 supôs que o fluxo migratório vai convergir para zero nos próximos anos, depois de ter sido negativo em 2,3 milhões entre 2010 e 2022.
"Se isso não se confirmar, a população [brasileira] deverá crescer ainda menos e com um perfil etário diferente daqueles incorporados nas projeções atuais", aponta o economista.
Ou seja, um Brasil que vai perder mais população em plena idade de trabalhar do que se supõe, o que definitivamente não é uma boa notícia.
Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)
Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 2/10/2024, terça-feira.
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