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Economia e políticas públicas

Opinião | Governo vacila no pacote, Congresso joga boia

Para analista político Rafael Cortez, da consultoria Tendências, governo errou por ser muito receoso em relação ao seu próprio capital político, e ainda viver sob o fantasma do desastrado governo Dilma, que terminou em impeachment.

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Foto do author Fernando Dantas

Os ativos brasileiros hoje [29/12, sexta, quando a coluna foi publicada] começaram de mal a pior e deram uma "despiorada" há pouco. O dólar, que chegou a quase R$ 6,1, é cotado agora a R$ 5,996. O Ibovespa, que chegou a cair 0,5%, neste momento tem alta de 0,49% (em ambos os caso, em relação ao fechamento de ontem). Houve alívio também na curva de juros. As cotações de hoje são do momento em que a coluna foi enviada para publicação.

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Segundo Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimentos, num dia de pouca liquidez por causa do feriado de Thanksgiving nos Estados Unidos, o que quebrou a dinâmica negativa dos mercados hoje foram as comunicações sobre o pacote dos presidentes do Senado e da Câmara, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Arthur Lira (PP/AL), respectivamente.

Pacheco e Lira foram firmes e claros numa mensagem com dois aspectos principais. As medidas efetivas de ajuste fiscal anunciadas ontem pelo governo terão seu apoio decidido. O mesmo, porém, não pode ser dito da ideia de isentar o IR até R$ 5 mil, que não só fica para uma outra etapa, mas, nas palavras tanto de um quanto de outro, ficará dependente da situação fiscal do País.

Talvez seja exagero dizer que a isenção subiu no telhado (mesmo por ser uma bandeira de potencial popular), mas ao menos se aproximou.

O Congresso, portanto, onde impera o tão difamado Centrão, jogou hoje uma boia para o governo, que estava se afogando em termos da repercussão negativa do pacote no mercado.

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Na visão de Rafael Cortez, sócio e analista político da consultoria Tendências, o imbróglio do pacote de contenção de gastos misturado com uma medida popularesca como a isenção até R$ 5 mil deve ser debitado numa característica que vem se manifestando desde o início do terceiro mandato de Lula. Nas suas palavras, "este é um governo muito receoso em relação ao seu capital político e ao fantasma do governo Dilma".

Como se sabe, a presidente Dilma Rousseff tentou agradar ao empresariado e ao mercado financeiro no seu governo. No primeiro mandato, com isenções e o pacote de barateamento da energia elétrica. No segundo, chamando Joaquim Levy para fazer um duro ajuste ortodoxo e liberal.

No final, Dilma sofreu impeachment com apoio explícito da Fiesp e com aprovação entusiástica da Faria Lima.

Daí, na visão de Cortez, vem a relutância de Lula em tentar agradar o mercado de forma mais firme e explícita. O temor é de perda de popularidade, sem que a melhora econômica de atender ao mercado se manifeste a tempo de trazer dividendos políticos para o presidente.

Esse temor é amplificado pela fase política polarizada e turbulenta que o País vive. Como nota o analista, Lula e os estrategistas políticos do PT assistem a um momento econômico de forte recuperação da atividade, desemprego em baixa recorde e renda em alta, sem que isso se reflita em ganhos de popularidade para Lula. Na verdade, os índices do presidente são razoáveis, mas não avançaram em relação ao segundo turno da eleição, quando o Brasil estava dividido praticamente meio a meio entre Lula e Bolsonaro.

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Nesse contexto, a PEC da Transição foi uma primeira reação a essa insegurança em relação ao capital político, garantindo um grande aumento de gasto no primeiro ano de governo. O novo arcabouço fiscal entrou como a ferramenta para acalmar o mercado, mas, apesar de ter tido algum sucesso nesse objetivo logo após seu lançamento, o efeito durou pouco.

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Haddad, que fez todo o ajuste pela receita que conseguiu, chegou chegando aos limites dessa opção. Com a perda de credibilidade fiscal e os ativos brasileiros em forte piora, só restava atacar os gastos, com o pacote divulgado ontem.

A construção do pacote envolveu um longo processo de convencimento de Lula e de outras áreas do governo mais avessas a ideia de que o ajuste fiscal é imperioso. A "solução" supostamente salomônica que foi encontrada, de mesclar o pacote de ajuste com o anúncio da isenção de IR até R$ 5 mil, acabou não atendendo a nenhum objetivo. O mercado piorou fortemente e a medida parece uma promessa remota e de prazo relativamente longo, que dificilmente vai fortalecer a popularidade de Lula no horizonte temporal visível.

Cortez, no entanto, observa que há um ângulo do tipo "fazer do limão uma limonada" em toda essa história. A piora forte do mercado, e especialmente a disparada do dólar, costuma aguçar o sentimento do Congresso da necessidade de fazer ajustes, mesmo que impopulares.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

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Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 29/11/2024, sexta-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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