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Economia e políticas públicas

Opinião|O risco da "alta envergonhada"

Analistas destacam que caracterização que o Copom dará hoje ao provável início de mais um ciclo de alta da Selic é muito importante para BC conseguir seus objetivos. E o tom não pode ser suave.

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Foto do author Fernando Dantas

A decisão a ser tomada pelo Copom hoje, ao fim da reunião de setembro, deve marcar o início de mais um ciclo de alta da Selic. Como comenta o economista Tony Volpon, ex-diretor do BC, os membros do Copom já "telegrafaram" que haverá alta de 0,25 ponto porcentual (pp) na Selic, o que levará a taxa básica para 10,75%.

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Porém, como observa Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimento, "há muita coisa em aberto para amanhã -como vai começar o ciclo, o que vai ser sinalizado e se vai trazer alguma revisão nos parâmetros do modelo, como taxa neutra e hiato do produto". Sobral pensa que o BC deve iniciar com uma alta de 0,25pp e deixar "muita coisa em aberto", mas ressalva que, especialmente no caso da segunda afirmativa, é um "palpite".

De forma semelhante, Volpon nota que serão de particular importância o comunicado pós-reunião, a ata na semana seguinte e o que os principais membros do Copom dirão quando a janela de silêncio em torno da reunião terminar.

"É preciso ficar de olho em como eles vão justificar e enquadrar esse ciclo de alta dentro de um contexto, de forma a potencializar os efeitos que em tese perseguem".

Esses efeitos, na sua visão, são os de reduzir as expectativas de inflação; reforçar a credibilidade da diretoria quando esta, em breve, tiver maioria de nomeados por Lula; influenciar positivamente parâmetros do mercado ligados à política monetária, como a taxa de câmbio e a inflação implícita entre os contratos de juros pré e pós-fixados; e aumentar a percepção de que a inflação vai para a meta de 3% em 2025 e 2026.

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Um ponto importante, para Volpon, é se o BC vai reconhecer que, como crê a maior parte do mercado - em função do crescimento acelerado, da expansão do crédito, do mercado de trabalho apertado e da inflação de serviços relativamente elevada -, a economia está rodando acima do seu potencial.

Outro ponto é se e como o Copom fará algum "forward guidance", ou seja, uma orientação ao mercado sobre seus próximos passos. Volpon até considera que faz mais sentido ter forward guidance no início do que no fim de um ciclo, que tende a ser mais imprevisível.

O economista Carlos Kawall, sócio fundador da Oriz Partners, pensa que, se a opção do BC for realmente a de começar o ciclo de alta da Selic amanhã com uma elevação de 0,25pp, o Copom "deveria deixar a porta aberta para acelerar [para corte de 0,5pp por reunião], o que pode vir a ser necessário".

Tanto Volpon quanto Kawall prefeririam que a decisão de amanhã fosse por uma alta de 0,5pp da taxa básica, mas consideram que a sinalização do BC indica 0,25pp.

Para Kawall, começar com 0,25pp já pode deixar o BC um pouco "atrás da curva" diante das condições já mencionadas de atividade, crédito, mercado de trabalho, inflação de serviços, núcleos, e expectativas inflacionárias. Ele acrescenta que, se o BC sinalizar que o ciclo vai prosseguir com altas de 0,25pp, há o risco de que a autoridade monetária fique ainda mais atrás da curva.

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Kawall observa que setembro e o último trimestre do ano tendem a ter inflação corrente mais elevada, por várias razões, com destaque para energia elétrica e alimentação, ambas suscetíveis à onda de clima seco. Assim, uma eventual moderação nos serviços e núcleos ajudaria a tirar pressão do índice cheio de inflação.

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Volpon, por sua vez, em relação à comunicação do BC sobre o ciclo de alta da Selic que deve se iniciar amanhã, diz temer um "aumento envergonhado", ou o que nos Estados Unidos se chama de "dovish hike", isto é, uma elevação de juros acompanhada de um discurso muito suave em relação ao risco inflacionário.

"Nesse caso, o BC paga o preço [da alta] e não tem os benefícios [os objetivos que persegue com a alta]", pondera o analista. Para ele, "um aumento envergonhado vai ser quase como se o Copom não tivesse feito nada".

Volpon vê como particularmente importante que o diretor Gabriel Galípolo, já nomeado (o Senado tem que confirmar) para ser o novo presidente do BC a partir de 2025, assuma o discurso sobre política monetária daqui em diante, e que o atual presidente, Roberto Campos Neto, se concentre em outros temas da alçada do BC. Para Volpon, certa falta de sintonia entre o discurso de um e de outro sobre política monetária recentemente provocou perturbações no mercado. Naturalmente, na visão de Volpon, Galípolo deveria ter um discurso que fosse na direção contrária ao da "alta envergonhada".

Quanto ao provável corte dos Fed Funds (taxa básica dos EUA) amanhã pelo FOMC (comitê de política monetária estadunidense), na contramão da prevista alta da Selic pelo Copom, tanto Kawall como Volpon consideram que se trata de algo importante, mas que o decisivo para a política monetária brasileira agora é o que efetivamente ocorre na economia nacional neste momento.

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Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 17/9/2024, terça-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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