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Economia e políticas públicas

Opinião | Recuo no crédito livre às empresas

Em 2023, aumento do crédito direcionado neutralizou queda dos empréstimos com recursos livres para as empresas. Gilberto Borça Jr., economista do BNDES, aponta que papel do banco nesse processo é modesto, e não afeta política monetária do Banco Central.

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A carteira de crédito na economia brasileira teve crescimento real de apenas 2,3% nos 12 meses até novembro de 2023, mas com uma diferença relevante entre o crédito com recursos livres (+0,3%) e direcionados (+5,3%).

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A desaceleração, como destaca o economista Gilberto Borça Jr., chefe do Departamento Econômico do BNDES e pesquisador associado do IBRE-FGV, ocorreu mais no crédito com recursoslivres às pessoas jurídicas (PJ), que caiu 3,3% em termos reais nos 12 meses até novembro do ano passado. O crédito com recursos livres para as pessoas físicas cresceu 3,1% no mesmo período, neutralizando a queda nas PJs.

Os números em valores reais foram calculados por Borça Jr. e sua equipe com base nos dados de crédito até novembro. Hoje, o BC divulgou os dados de crédito relativos a dezembro e ao ano fechado de 2023, mas estes ainda não foram incorporados à apresentação de Borça Jr. na qual se baseou a coluna. Todos os dados a seguir, portanto, tem como referência novembro de 2023, com exceção dos relativos à inadimplência, para os quais a coluna acessou a divulgação de hoje do BC.

No caso do crédito direcionado, o contraste no desempenho nos 12 meses até novembro de 2023 foi menor do que o mencionado acima para os recursos livres. No direcionado, a carteira PJ teve alta real de 4,2%, e a PF, de 5,8%.

Somando-se o segmento direcionado com o de recursos livres, a carteira de crédito das empresas teve recuo real de 0,7% nos 12 meses até novembro de 2023, enquanto a das pessoas físicas cresceu 4,3%.

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No caso das concessões de crédito, o recuo real no Brasil de 0,3% até novembro de 2023 foi puxado pelas operações com PJs (-4,2%), já que para as PFs houve alta de 3%. Nas concessões, não houve muita diferença entre o desempenho real do segmento de recursos livres (-0,4%) e direcionado (0%), que combinaram-se em uma queda geral de 0,3%.

Borça Jr. nota que as concessões reais para pessoas físicas foram puxadas pelo segmento de recursos livres (+4,7%), enquanto houve queda de 7% no segmento direcionado. Nas PJs, deu-se o inverso: enquanto as concessões com recursos livres recuaram 4,2%, houve alta real de 16,6% nas concessões de crédito direcionado.

Segundo o economista, a desaceleração do crédito ao longo de 2023 foi condizente com os efeitos defasados do ciclo de aperto levado a cabo pelo Banco Central (BC). Ele lembra que, desde março de 2021, a Selic foi aumentada em 11,75 pontos porcentuais (pp) ao longo de 18 meses, e a taxa básica permaneceu em 13,75% de agosto de 2022 ao mesmo mês de 2023.

Como seria de se esperar, a alta do juro básico encareceu o custo do crédito e elevou a inadimplência, que fechou 2023 em 3,3%, compostos por 3,7% das PFs e 2,7% das PJs. Em termos de tendência, porém, a inadimplência das PFs já recuou do pico recente de 4,2%, enquanto a das PJs ainda está subindo, a partir de níveis abaixo de 1,5% em 2021.

Borça Jr. acrescenta que, quando se analisam as concessões totais mensais com ajuste sazonal, transparece nitidamente o efeito negativo, a partir do início de 2023, da revelação de rombo contábil de R$ 20 bilhões seguida pelo pedido de recuperação judicial das Lojas Americanas. O impacto também se estendeu ao mercado de capitais.

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"O 'efeito Americanas' aparece com mais força justamente nas concessões para as PJs com recursos livres", comenta Borça Jr.

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É nesse contexto, no qual se percebe em 2023 um ano difícil para o crédito das empresas, quando a queda mais forte no segmento de recursos livres foi contrabalançada pelo desempenho dos empréstimos com recursos direcionados, que Borça Jr. busca dimensionar melhor o que vê como um exagero de preocupação em relação à atuação do BNDES no terceiro mandato de Lula.

Essa preocupação veio junto com o lançamento da nova política industrial, na qual o BNDES é protagonista, e do plano de levar os desembolsos anuais do banco de fomento de volta à sua média de 2% do PIB do período 1995-2023. Esse percentual chegou a cerca de 4% do PIB no início da década passada, e caiu para o atual 1,1%. Dentro desse objetivo de ajuste na atuação do BNDES, o novo governo, por meio do PL 6235/2023, propõe readequação de indexadores das taxas de juros e a criação de um título incentivado para captação de funding.

Borça Jr. nota que, nos 12 meses até novembro de 2023, o segmento direcionado representou apenas 10,9% do fluxo de novas concessões de crédito na economia brasileira. O BNDES, por sua vez, contribuiu com somente 1,4% do fluxo (queda ante o pico de 5,8% registrado em 2013) . Assim, o economista não considera sustentável a tese de que o crédito direcionado - em particular, do BNDES - eleve o juro neutro no Brasil e afete negativamente a potência da política monetária, mesmo contemplando os novos planos do governo para o BNDES.

O economista aponta ainda que crédito direcionado não significa crédito subsidiado. Na verdade, nos 12 meses até novembro de 2023, 41% do crédito direcionado (que inclui segmentos como habitacional e rural) foi a taxas de mercado. Em particular no caso do BNDES, com a substituição da TJLP pela TLP (definida por meio de taxas de mercado) em 2018, Borça Jr. pensa que a crítica de interferência na potência da política monetária carece de fundamentos.

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Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 6/2/2024, terça-feira.

 

Opinião por Fernando Dantas
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