A aprovação pelo Senado no início deste mês, por unanimidade, do projeto de lei complementar (PLP) 178/2021, de facilitação de cumprimento de obrigações tributárias, pode ser uma "mão na roda" para o contribuinte e as receitas dos três níveis da Federação na fase de transição da reforma tributária.
A transição da CBS federal, que substituirá o IPI e o PIS-Cofins, se inicia em 2026, em forma de teste, com alíquota de 0,9%, mas já a partir de 2027 a nova contribuição será totalmente implementada, com o fim dos tributos atuais.
Já a transição do IBS, estadual e municipal, é bem mais longa. O novo imposto terá alíquota de apenas 0,1% no período de teste de 2026 a 2028, e a sua implementação total só ocorrerá em 2033, segundo um cronograma gradativo, mas com um grande ajuste repentino de 60% no final.
Dessa forma, receitas e contribuintes conviverão com dois regimes tributários sobre o consumo até 2033. Além disso, a busca pelas alíquotas neutras - isto é, que mantenham a carga tributária indireta, correspondente aos impostos a serem substituídos, no mesmo nível atual, como proporção do PIB - não se encerra em 2033, com o fim da transição. Isso adiciona incerteza à complexidade por um período de vários anos que se seguirá à esperada aprovação da reforma tributária.
Segundo diversos estudos e simulações, a reforma tributária trará ganhos de PIB ao Brasil, um crescimento adicional estimado entre cerca de 5% a 20% a depender de qual faceta da reforma se analisa. É evidente, no entanto, que esse impacto positivo só acontecerá no médio e longo prazo - até pela transição de 2026-2033 - ainda que os ativos brasileiros e os investimentos puxados pelo "espírito animal" dos empresários possam antecipar parcela dos impactos.
De qualquer forma, é bem possível que, na longa travessia até uma colheita mais substancial dos benefícios da reforma, o aumento temporário de complexidade e incerteza produza algum mau humor econômico e até político.
É nesse contexto que o PLP 178 pode ajudar. A facilitação do cumprimento de obrigações tributárias, em termos de preenchimento de documentos e outros tipos de obrigações acessórias, pode compensar parcialmente o aumento temporário de complexidade e ajudar a manter a popularidade da reforma.
O senador Efraim Filho (União-PB), que apresentou o projeto quando era deputado, explicou no plenário do Senado em 5/7, dia da aprovação do PLP, que as empresas brasileiras hoje gastam em média 1,5 mil horas por ano para cumprir as obrigações tributárias acessórias, que a nova legislação visa simplificar.
A lei cria a Nota Fiscal Brasil Eletrônica (NFB-e) e estabelece um comitê nacional para simplificar as obrigações acessórias, com a tarefa também de criar a Declaração Fiscal Digital (DFD), reunindo tributos de todos os níveis da Federação, com exceção do IR e do IOF. Também está previsto o compartilhamento de cadastros entre as receitas de todos os níveis da União.
Como o PLP 178, que já havia sido aprovado na Câmara, não sofreu alterações no mérito, vai seguir para a sanção presidencial.
Sua entrada em vigor pode ser considerada mais um item dos extensos avanços microeconômicos no Brasil desde pelos menos 2015, que atravessam diversos governos, independentemente da feroz polarização política dos últimos anos.
Alguns economistas veem a impressão digital dessa agenda microeconômica na surpreendente melhora recente da economia brasileira, inclusive em termos de PIB potencial. Lula faria bem em não reverter esses avanços com as pautas intervencionistas arcaicas que ainda encantam muitos personagens influentes do entorno do presidente.
Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fojdantas@gmail.com)
Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 27/7/2023, quinta-feira.
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