Soja deve responder por 22% do crescimento do PIB de 2023 e ampliar desigualdade regional, diz FGV

Desempenho extraordinário do agro sinaliza concentração de parte expressiva da riqueza gerada no País em poucos Estados produtores de grãos, dizem pesquisadores

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RIO - O crescimento maior que o previsto inicialmente para a atividade econômica neste ano não deve se traduzir em bem-estar disseminado pelo território brasileiro. Apenas o cultivo de soja deve responder por 22% de todo o avanço do Produto Interno Bruto (PIB) de 2023, sinalizando uma concentração de parte expressiva da riqueza gerada no País em poucos Estados produtores do grão, apontou o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

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“As regiões mais pobres são as que menos se beneficiam. As que mais se beneficiam são as regiões mais ricas mesmo”, apontou Claudio Considera, coordenador de Contas Nacionais do Ibre/FGV.

“Quando você vê que a agropecuária vai puxar o PIB do ano, você pensa: ok, mas vai contribuir onde? Não é no Nordeste. O Nordeste não vai contribuir nada. Isso até amplia um pouco essa questão da desigualdade regional”, complementou Juliana Trece, coordenadora do Monitor do PIB da FGV. “Não é tão bom quanto parece, não está puxando (o PIB) da mesma forma em todos os lugares”, acrescentou.

Com um avanço de 18,8%, a agropecuária respondeu por mais de 30% do expressivo crescimento de 4,0% visto no PIB no primeiro trimestre de 2023 ante o mesmo período de 2022, conforme os dados divulgados no início deste mês pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Se excluído o valor adicionado da atividade agropecuária, a expansão da economia brasileira teria sido de 2,7% no período, calculou o Ibre/FGV.

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O desempenho extraordinário do agro é explicado, principalmente, pelo cultivo de soja, destacando a relevância das regiões Sul e Centro-Oeste nesse resultado. O estudo mostra que essa aparente pujança não apenas está muito focada na atividade agropecuária, como também há alta concentração do cultivo da soja nessas duas regiões.

Produção nacional de soja é concentrada nos estados do Paraná, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás Foto: Vivi Zanatta/AE

“Tal resultado acende o alerta para a fragilidade do crescimento da economia em 2023; com forte influência da agropecuária concentrada em duas regiões”, explicita o estudo do Ibre/FGV.

Os pesquisadores estimam que o valor adicionado da atividade agropecuária suba 10,3% em 2023 em relação a 2022. Mais de 80% desse resultado será decorrente do cultivo de soja.

A projeção tem como base a expectativa de uma produção nacional recorde de soja, 24% maior que a do ano anterior, apontada pelo Levantamento Sistemático da Produção Agrícola, também do IBGE, entre outras fontes de informações sobre o setor.

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A previsão dos pesquisadores do Ibre/FGV indica que a agropecuária deva contribuir com cerca de 0,7 ponto porcentual para o crescimento do PIB de 2023, sendo que o valor adicionado apenas do cultivo de soja deva gerar uma contribuição em torno de 0,5 ponto porcentual. O último Boletim Focus do Banco Central, que traz semanalmente as projeções de economistas de mercado para o PIB, aumentou a expectativa mediana de alta para a atividade econômica neste ano de 1,84% na leitura anterior para 2,14% nesta segunda-feira, 19.

“Caso a atual expectativa de PIB do Focus para 2023 seja confirmada (2,1%), estima-se que a atividade de cultivo de soja represente 22% desse crescimento (0,5 ponto porcentual)”, afirmou Juliana Trece.

A FGV lembra que a produção nacional de soja é bastante concentrada nos estados do Paraná, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás. Após uma quebra de safra provocada pela estiagem em 2022, a região Sul tem forte recuperação prevista na produção em 2023, alta de 61,8%. O Centro-Oeste, outro grande produtor, tem alta projetada de 19,7% na colheita do grão. No Norte, o avanço deve ser de 13,5%; no Sudeste, de 3,8%; e no Nordeste, de 2,3%.

“Embora seja esperado aumento da produção de soja em todas as regiões do País, as magnitudes são muito distintas. Por esta razão, a estimativa de crescimento do valor adicionado da agropecuária é tão discrepante entre as regiões brasileiras”, ressalta o estudo da FGV.

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O Nordeste deve ter crescimento de apenas 0,6% no valor adicionado da agropecuária em 2023. No Sudeste, essa alta será de 3,3%, enquanto no Norte será de 4,4%.

Por outro lado, o valor adicionado da agropecuária na região Sul deve subir 27,1% este ano, sendo 25,9 pontos porcentuais desse crescimento uma contribuição exclusiva da soja. No Centro-Oeste, a alta esperada é de 11,9%, com participação de 9,5 pontos porcentuais da soja.

“O forte crescimento de 10,3% esperado para a agropecuária nacional tende a mascarar essas diferenças regionais e dar a impressão que a agropecuária está contribuindo fortemente para o desempenho econômico de todo o País da mesma forma; o que não é verdade”, frisam os pesquisadores.

Considerando toda a alta esperada no valor adicionado da agropecuária nacional em 2023, aproximadamente 90% desse crescimento é explicado pelas contribuições somadas das regiões Sul (6,5 pontos porcentuais) e Centro-Oeste (2,6 pontos porcentuais).

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Como o bom desempenho do PIB agropecuário foi bastante impulsionado pela soja, colhida nos primeiros meses do ano, a tendência é de perda de fôlego no segundo semestre. Após a alta de 18,8% no PIB agropecuário no primeiro trimestre de 2023 ante o mesmo trimestre do ano anterior, a FGV projeta avanço de 14,4% no segundo trimestre, seguido por quedas de 3,8% no terceiro trimestre e 0,9% no quarto trimestre.

“Tem algumas colheitas ainda para serem realizadas, como trigo e milho, mas não tem nada como a soja”, lembrou Claudio Considera. “O primeiro trimestre é espetacular, o segundo já é menos, e o terceiro e quarto já são negativos”, confirmando que pode haver sensação de piora do bem-estar econômico no segundo semestre de 2023 nas regiões beneficiadas pela colheita de soja no primeiro semestre do ano.

Embora o Rio Grande do Sul enfrente no momento as consequências da passagem de um ciclone, e que especialistas alertem sobre eventuais problemas climáticos derivados do fenômeno El Niño em outras regiões do País, os pesquisadores da FGV reforçam que a colheita da soja, principal produto agrícola brasileiro, costuma ser 93% realizada entre os meses de janeiro a abril, o que indica poucas alterações nas projeções futuras para a safra de grãos do ano.

“Mesmo que a gente tenha problema em outras colheitas, a soja é tão relevante que o número (do PIB agropecuário) vai ser expressivo”, reforçou Juliana Trece.

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Para os pesquisadores, os resultados evidenciam que a agropecuária terá um desempenho relevante para a economia em 2023, mas que o forte crescimento da geração de riqueza no setor “não é observado da mesma forma dentro da própria atividade, nem nas regiões do País e nem mesmo em todos os trimestres do ano”.

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