Empréstimo, cartão de crédito e investimento: o que muda na economia quando a Selic aumenta

A elevação da taxa de juros deve resfriar a economia e tornar produtos financeiros mais caros para o consumidor; entenda como a taxa básica alta afeta o seu bolso

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Foto do author Lucas Agrela
Atualização:

O aumento de 0,25 ponto porcentual na Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom) nesta quarta-feira, 18, levando a taxa básica de juros para 10,75%, foi um mecanismo utilizado para frear a economia e conter a inflação, que dá sinais de aceleração em 2024. Mediana do relatório Focus para o IPCA de 2024 subiu pela nona semana consecutiva, de 4,30% para 4,35%, aproximando-se ainda mais do teto da meta, de 4,50%. Em outras palavras, o aumento da Selic foi um “balde de água fria” na atividade econômica do País.

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Segundo previsão do banco de investimentos BTG Pactual, a Selic deverá encerrar janeiro de 2025 a uma taxa de 12% ao ano. A elevação da Selic tende a aumentar o custo do dinheiro emprestado, em cartões de crédito, financiamentos de imóveis e carros ou crédito pessoal.

Para Miguel de Oliveira, diretor executivo de estudos e pesquisas da Anefac, é justamente a tendência de aumento da Selic para os próximos meses que pode ter impacto para a vida do consumidor, e não tanto a alta desta semana. “A continuidade da elevação da Selic passa a ter um impacto direto no bolso (do consumidor). Quando ele vai fazer um financiamento, fica mais caro fazer a compra do carro, trocar a geladeira, trocar a televisão ou comprar um imóvel”, afirma.

Por outro lado, o valor da recompensa de aplicações financeiras aumenta, estimulando o consumidor capitalizado a manter seu dinheiro no banco ou corretora em vez de investir na economia real ou gastar em produtos e serviços.

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Com isso, as taxas ligadas ao crédito pessoal também sobem, incluindo financiamentos imobiliários e veiculares.

Banco Central confirmou a expectativa do mercado de aumento da taxa de juros para conter aumento da inflação no País em 2024 Foto: Wilton Júnior/Estadão

Como fica o financiamento de imóveis e veículos

O financiamento de imóveis e veículos tende a ficar mais caro com o aumento da taxa de juros. No mercado imobiliário, o impacto será, sobretudo, em novos contratos fechados a partir de agora.

Em um cenário de juros futuros elevados, o consumidor que fechar contratos de financiamento de imóveis ou veículos antes da elevação da Selic a maiores patamares tende a fazer negócios melhores.

“O problema é que o crédito para automóveis e para imóveis é um crédito de longo prazo. O que se olha mais é para a curva de juros, e a curva de juros já está aumentando independentemente do que acontece com a Selic. Então, está aumentando o custo, está ficando mais caro”, afirma Roberto Luis Troster, ex-economista-chefe da Febraban e sócio da Troster & Associados.

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Pela estimativa da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), serão R$ 259 bilhões em concessões de crédito imobiliário em 2024, crescimento de 3% ante 2023. Porém, os saques da poupança nos últimos anos têm desafiado o setor e mantido as taxas de juros de financiamento elevadas mesmo quando a Selic caiu em 2024. O patamar de juro de financiamento neste ano está acima de 10%, sem expectativa de queda.

A formação da taxa do crédito imobiliário ocorre a partir de uma equação entre os depósitos da poupança, a expectativa do aumento do custo da captação de recursos e comportamento da curva longa de juros (acima de dez anos). O Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), que financia imóveis fora do teto da habitação social (R$ 350 mil com renda mensal máxima de R$ 8 mil), teve um saque líquido de mais de R$ 150 bilhões, indo de R$ 1,035 trilhão no fim de 2020 para R$ 983 bilhões no fim do ano passado.

Os bancos são obrigados a destinar 65% dos recursos da poupança ao SBPE. Sendo assim, quanto mais alta for a Selic, mais as instituições de crédito imobiliário vão pagar pelos recursos usados para o financiamento.

Com esse cenário, a taxa de financiamento imobiliário tende a se manter no patamar de dois dígitos, sem previsão de retornar à casa dos 7%, observada em 2020.

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Porém, a habitação social, subsidiada pelo governo federal, tem uma situação diferente. No programa Minha Casa, Minha Vida, os consumidores de baixa renda podem ter financiamentos com juros anuais de 4,00% (faixa de renda de até R$ 2 mil) a 7,66% (faixa de renda de até R$ 8 mil). Sendo assim, os imóveis residenciais comprados por consumidores fora dessas faixas de renda podem ter contratos de financiamento mais caros por causa do aumento da Selic.

A sócia da HCI Invest e planejadora financeira pela Planejar, Wanessa Guimarães, afirma que o consumidor deve estar atento ao contrato de financiamento imobiliário que irá fechar para fazer o melhor negócio, o que pode variar de acordo com o perfil de cada um. “No cenário de juros elevados, o SAC costuma ser mais vantajoso. Isso ocorre porque ele prevê a amortização maior no início do contrato, resultando em uma diminuição gradativa dos juros ao longo do tempo, reduzindo o valor total pago. Já a Tabela Price mantém prestações fixas ao longo do financiamento, o que pode ser mais atrativo no curto prazo, mas, com os juros em alta, acaba resultando em um custo total maior, especialmente em financiamentos de longo prazo”, diz.

A especialista diz ainda que os juros de financiamento para carros também devem ser impactados pelo aumento da Selic. De acordo com dados do Banco Central, o financiamento veicular oferecido por instituições financeiras varia entre 8,31% ao ano e 46,88% ao ano, com média em 24,1%. A variação ocorre dependendo do valor financiado, do prazo e da empresa escolhida para tomar crédito.

“Quando se trata de financiamento de veículos, esse momento de juros altos não é o mais ideal. Financiamentos de veículos já têm, em geral, prazos menores e taxas de juros mais altas em comparação a financiamentos imobiliários, e a elevação da Selic apenas agrava esse cenário. Se o consumidor puder postergar a compra, pode ser interessante esperar um momento de queda dos juros ou buscar outras formas de pagamento, como consórcios, que não carregam juros embutidos, mas sim taxas administrativas”, afirma Wanessa.

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Como fica o cartão de crédito

As taxas cobradas pela inadimplência em cartões de crédito tendem a não ser afetadas pela elevação da Selic porque seguem uma dinâmica particular e já são consideravelmente mais elevadas do que a taxa básica da economia. Ou seja, o rotativo do cartão de crédito deve seguir aumentando as dívidas do consumidor em ritmo acelerado, como sempre, em especial, com o aumento do risco da inadimplência causado pelos juros elevados previstos para os próximos meses.

“As dívidas no cartão são rodadas a 200%, 300% ou 400% ao ano. Aumentar a taxa de juros de 0,25% até 1% não faz muita diferença. (A taxa) é muito mais guiada pela demanda de crédito, pela expectativa de dinheiro em caixa, do que pela Selic em si. São taxas absurdamente altas”, diz Troster.

De acordo com dados do Banco Central referentes ao mês de agosto deste ano, a taxa média de juros do rotativo do cartão de crédito é de 477% ao ano, entre as 62 instituições listadas. A mais alta, da Crefisa, chega a 993% ao ano.

Como ficam os empréstimos

O valor dos empréstimos pessoais sobe com o aumento da Selic. Com isso, o consumidor precisa procurar opções de menor custo para obter o crédito que precisa sem se endividar ou pagar caro demais pelo dinheiro. A elevação se dá pelo aumento do risco de inadimplência do consumidor, uma vez que a economia é desacelerada pelo juro alto. Com isso, menos empregos são gerados e o risco de não pagar as contas por falta de renda sobe.

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O valor médio da taxa de juros anual do crédito pessoal em 86 instituições financeiras é de 150%, segundo os dados de agosto do Banco Central. A Crefisa é a mais cara, com taxa anual de 805%.

Segundo especialistas, é um momento para tomar cuidado com a decisão de onde solicitar o empréstimo, olhando com lupa para as taxas cobradas e pesquisando em duas ou três instituições financeiras antes de fechar o contrato. Também vale buscar alternativas mais criativas para obter capital.

“O crédito consignado é a melhor alternativa, com juros mais baratos. O penhor de jóias na Caixa é outra alternativa, que é muito mais barata. Quem precisa de mais dinheiro, eventualmente, pode fazer um financiamento agregando um imóvel em garantia, mas isso é mais indicado para pequenos empresários. Não vale a pena o cara que precisa de R$ 2 mil alienar um imóvel (com essa dívida)”, diz Oliveira.

Como fica o rendimento de investimentos

O rendimento de investimentos de renda fixa tende a aumentar com a alta dos juros. Isso vale para as aplicações pós-fixadas, ou seja, aquelas que não têm rentabilidade previamente acordada no ato da contratação. Exemplo disso seria o Tesouro Selic, título do tesouro nacional que acompanha a rentabilidade da taxa básica de juros.

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Nesse exemplo, com o juro a 10,50%, como estava desde a última reunião do Copom, uma aplicação financeira com valor R$ 1 mil se transformaria em R$ 1.084 (excluídos 20% de imposto de renda). Com o juro a 10,75%, o valor final da aplicação em 12 meses passa para R$ 1.086.

Com o aumento do custo do dinheiro, o crédito para as empresas fica mais caro. Por isso, é comum encontrar investimentos de renda fixa que paguem rentabilidade anual acima da Selic, especialmente quando o juro sobe. O mais popular é o CDB, Certificado de Depósito Bancário, uma aplicação financeira na qual, em termos simples, o investidor empresta seu dinheiro a um banco. O valor costuma ficar retido por um prazo pré-determinado, como dois ou cinco anos, remunerando a uma taxa fixa anual, como 14% ou 15%.

Essa modalidade de investimento é protegida pelo Fundo Garantidor de Crédito, uma instituição privada sem fins lucrativos que protege o dinheiro de investidores em caso de problemas com os bancos que emitiram esses títulos. Pelas regras, cada consumidor tem direito à proteção no valor de até R$250 mil por CPF e instituição financeira.

Mais arriscada por não conter a proteção do fundo, a debênture também se torna uma oportunidade de investimento atraente para o consumidor em tempos de juros altos. Nesse caso, empresas de qualquer setor podem emitir esses títulos de dívida, que remuneram a aplicação do consumidor com taxas fixas, como 15% ao ano, ou pós-fixadas, como IPCA+7%.

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