Análise | Frear a inflação é um desafio técnico e político para o Banco Central e Lula

Enquanto confundir governo com gastança, o presidente dará ao Copom um motivo respeitável para aumentar os juros

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Foto do author Rolf Kuntz

Piora das expectativas, inflação longe da meta, contas públicas em risco, crescimento excessivo, desemprego baixo, dólar em alta e riscos agravados pelas promessas de Donald Trump justificam, em conjunto, novas altas de juros no Brasil, segundo o Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC). Esses argumentos são listados na ata da última reunião do comitê realizada em 2024, quando a taxa básica foi aumentada para 12,25%. Na segunda-feira, 16, véspera da publicação da ata, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) classificou como “incompreensível” e “totalmente injustificada” a nova série de aumentos da Selic, a taxa básica de juros.

Segundo a confederação, a decisão do BC ignora a desaceleração da atividade, observada no terceiro trimestre, e a tendência de juros em baixa nas principais economias do mundo. O novo aperto da política monetária, acrescentaram os autores da nota, prejudicará os investimentos empresariais, o crescimento econômico, o emprego e a geração de renda para os trabalhadores. A argumentação inclui referência ao recuo da inflação - de 0,56% para 0,39% - registrado na sequência de outubro para novembro.

Sede do Banco Central, em Brasília Foto: Rafael de Matos Carvalho

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Bem menos otimistas que a nota da CNI, em relação ao risco inflacionário, são as projeções contidas no boletim Focus, baseado em avaliações do mercado financeiro. As projeções divulgadas na última segunda-feira apontam inflação de 4,80% neste ano, 4,60% no próximo, 4% em 2026 e 3,66% em 2027. Todas essas taxas superam a meta oficial, 3% ao ano, e as duas primeiras ultrapassam o limite superior de tolerância, 4,5%.

A nota do Copom menciona, com base em seu cenário de referência, perspectivas de inflação de 4,9% em 2024, 4,5% no próximo ano e 4% nos quatro trimestres até o segundo de 2026. Também esses números sugerem pressões inflacionárias persistentes e taxas distantes da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional, formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente do BC.

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A perspectiva de inflação persistente é indicada pelo Copom como justificativa para uma política mais severa, com elevação da Selic de 11,25% para 12,25% e mais duas elevações de 1 ponto porcentual, em janeiro e em março. Se esse roteiro for cumprido, a taxa básica atingirá um patamar - 14,25% - superior àquele alcançado em agosto de 2022 - 13,75% - e mantido até o início de agosto de 2023, quando houve redução para 13,25%. O último boletim Focus indica uma taxa Selic de 14% no final de 2025 e de 11,25% em dezembro do ano seguinte.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode abominar juros altos e crédito restrito, mas tem-se manifestado de modo mais discreto, procurando evitar conflito com o atual diretor de Política Monetária e futuro presidente do BC, Gabriel Galípolo, por ele mesmo indicado para as novas posições. Mas o próprio Lula fornece - e poderá continuar fornecendo - uma das justificativas mais importantes para o aperto monetário: a insegurança fiscal, com excesso de gastos e muita incerteza quanto à evolução das finanças públicas.

Enquanto confundir governo com gastança, o presidente dará ao Copom um motivo respeitável para aumentar os juros. Uma política fiscal mais cuidadosa e mais sustentável envolve mudanças políticas e negociações com parlamentares, um processo complicado e potencialmente custoso, como já se vem comprovando mais uma vez.

Análise por Rolf Kuntz

Jornalista

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