BRASÍLIA - O Fundo Clima, gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), deverá ser usado como garantia para os novos seguros cambiais que serão oferecidos aos investidores interessados na “agenda verde” - como ficou conhecido o Plano de Transformação Ecológica lançado pelo governo.
Além dele, os recursos também virão do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que fechou uma parceria com o Ministério da Fazenda em dezembro, durante a COP-28. As duas reservas serão usadas para dar garantias aos bancos privados que, no desenho do governo, serão os responsáveis por oferecer esses produtos aos investidores.
Em Dubai, o ministro Fernando Haddad sinalizou que os seguros poderiam mobilizar, inicialmente, US$ 3,4 bilhões, cifra que seria ampliada ao longo do tempo. No governo, a intenção é de que outras instituições de fomento internacionais, como o Banco Mundial e o NDB (o banco dos Brics) também possam, futuramente, oferecer recursos a esse fundo garantidor.
A engenharia financeira que está sendo desenvolvida será similar à que foi empregada no Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte), só que voltada exclusivamente a investidores da agenda verde.
No caso do Pronampe, o Fundo Garantidor de Operações (FGO), atrelado ao Banco do Brasil, financia o risco dos empréstimos concedidos a pequenos empresários e empreendedores. Também é o FGO que garante as operações do Desenrola, programa de negociação de dívidas criado pelo governo Lula e que foi prorrogado até março.
O objetivo da Fazenda, portanto, é que as instituições financeiras dividam com o governo o risco dessas operações de seguro cambial, estimulando a entrada delas nesse mercado. Hoje, investidores estrangeiros que queiram investir no Brasil só encontram proteção contra a volatilidade do dólar por um período médio de até dois anos.
Acima desse prazo, o produto acaba ficando muito caro e praticamente inacessível. No caso das operações ligadas à agenda verde, a expectativa do governo é que mobilize investimentos com prazo longo, de dez a vinte anos. Com isso, essas operações cambiais ficariam mais arriscadas para os bancos e poderiam acabar sendo inviabilizadas.
O governo ainda estuda uma forma de criar uma triagem para os projetos do Plano de Transformação Ecológica que poderão ter acesso a esse tipo de seguro com a garantia do governo. Esse filtro poderá ser feito pelo BNDES, uma vez que a instituição já tem a expertise de análise de investimentos de longo prazo.
Podem ser atendidos, por exemplo, projetos ligados a hidrogênio verde, bateria de lítio, bioinsumos e investimentos estruturantes para reciclagem de materiais.
Juntamente com o Banco Central e o BID, o Ministério da Fazenda está desenhando três instrumentos de proteção de acordo com o grau de volatilidade do câmbio. A intenção é mitigar os efeitos da volatilidade da moeda, que hoje repelem investidores de longo prazo.
Veja abaixo os detalhes do que está sendo elaborado:
Risco baixo: swap cambial
Swap, na linguagem do mercado financeiro, é a troca de taxas ou rentabilidades - e, portanto, de riscos - entre agentes econômicos.
Pode-se trocar, por exemplo, a variação do câmbio pela oscilação da taxa de juros em um determinado período de tempo - nesse caso, o investidor ficaria sujeito à variação dos juros, e não do câmbio, que é muito mais volátil. Para os investimentos verdes, o horizonte é longo: de dez a vinte anos.
Esse mecanismo de swap seria indicado para momentos de risco mais baixo e poderia ter até US$ 1,4 bilhão disponíveis, como sinalizou Ilan Goldfajn, atual presidente do BID e ex-presidente do Banco Central, na COP-28, em dezembro.
“O swap longo não tem mercado, porque é caro. O BID, que tem hoje, em projetos com o Brasil, US$ 1,4 bilhão, pode usar (essa cifra) para fazer um swap com o mercado e transferir o preço desse swap para o Brasil. E, do Brasil, (transferir) para o investidor. Qual a diferença? O BID tem uma carteira já estabelecida e é uma instituição triplo A (a classificação mais alta dentro do grau de investimento)”, afirmou o presidente do banco na ocasião.
Risco médio: linha de crédito
Para situações de risco um pouco mais elevado, estão sendo avaliadas linhas de crédito em moeda estrangeira. Seriam linhas emergenciais para resolver problemas de caixa temporários, em caso de eventos de desvalorização cambial, as quais poderiam ser combinadas com o uso dos swaps.
“Muitas vezes, a volatilidade do câmbio é de curto prazo. Não é toda volatilidade de curto prazo que fica. Portanto, às vezes, o que se precisa, é apenas permitir ao investidor sair do curtíssimo prazo e ir para o médio ou longo prazo”, explicou Goldfajn.
Para isso, segundo ele, poderia ser criado um fundo. “Nós podemos trabalhar em um fundo que forneça esses recursos no momento em que (o investidor) mais precisa, que é o momento de volatilidade maior”.
Risco alto: mecanismos de cobertura
Já para momentos de desvalorização extrema e abrupta do câmbio, seriam criados mecanismos de cobertura. Ou seja, uma espécie de seguro.
“O risco de cauda (ocorrência de evento extremo e improvável) é uma opção de proteger (o investidor) no caso em que a volatilidade não é nem a normal, em que você pode ter o swap, nem média, em que você pode simplesmente dar liquidez, mas sim de um tamanho que você precisa de proteção. E é nesse caso que você faz opções”, afirmou Goldfajn.
Um das possibilidades, portanto, seria o uso de uma espécie de opção de compra de dólares a ser acionada a partir de determinada taxa de câmbio.
“E como o BID poderia ajudar? O BID poderia ir ao mercado, com a sua reputação de anos e o seu triplo A, e tentar reestabelecer esse mercado que, nas últimas décadas, não existiu. Eu, pessoalmente, acredito que você faz isso e depois pega no tranco. Mas tem que começar com nós tentando, de alguma forma, criar esse mercado e esses instrumentos”, disse o presidente do banco multilateral.
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