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Fábricas na Europa reduzem produção por conta da energia cara

Salto nos custos, com a interrupção do gás vindo da Rússia, abala empresas e afeta milhares de trabalhadores

Por Liz Alderman
Atualização:

THE NEW YORK TIMES, FRANÇA - O forno aquecido a 1.500 graus Celsius estava vermelho em brasa. Os trabalhadores da fábrica de vidro Arc International colocaram areia nele, que aos poucos foi se unindo até formar uma massa derretida. Perto dali, com um sopro de ar quente, máquinas transformavam o líquido disforme em milhares de taças de vinho delicadas, destinadas à venda para restaurantes e casas em todo o mundo.

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Nicholas Hodler, o CEO, inspecionava a linha de produção azul-cintilante devido às chamas de gás natural. Por anos, a Arc funcionou com energia barata, o que ajudou a transformar a empresa na maior produtora mundial de utensílios de mesa em vidro – e um empregador vital na região de classe trabalhadora no norte da França.

Mas o impacto da interrupção abrupta do fornecimento de gás da Rússia para a Europa apresentou novos riscos à empresa. Os preços da energia subiram tão rapidamente que Hodler precisou reescrever as previsões para os negócios seis vezes em dois meses. Recentemente, ele colocou um terço dos 4.500 funcionários da Arc em licença parcial para economizar dinheiro. Quatro dos nove fornos da fábrica vão ficar inativos, os demais passarão a funcionar com diesel, um combustível mais barato, porém mais poluente. “É a situação mais dramática com a qual já nos deparamos”, disse Hodler, gritando para ser ouvido em meio ao barulho das taças tilintando. “Para as empresas que consomem muita energia, como a nossa, é inviável.”

Impacto da interrupção abrupta do fornecimento de gás da Rússia para a Europa apresentou novos riscos à fábrica de vidro Arc International.  Foto: Dmitry Lovetsky/AP Photo

Uma cidade assustada

A Arc não é um caso isolado. Os preços elevados da energia estão afetando a indústria europeia, obrigando as fábricas a reduzir depressa a produção e a dispensar temporariamente dezenas de milhares de trabalhadores. A mudança repentina tem assustado os habitantes de Arques, uma cidade cuja sorte está associada à indústria do vidro há mais de um século. A atual Arc foi fundada em 1825 como Verrerie Cristallerie d’Arques, então uma pequena fabricante local de taças de cristal delicadas.

Hoje, as operações da Arc são enormes, abrangendo uma área equivalente a quase metade do tamanho do Central Park em Nova York. Sua grandeza é tamanha, que ela gera indiretamente outros 15 mil empregos na região, das fábricas de papelão que embalam seus produtos até as empresas de frete que transportam as peças. As demais fábricas da Arc estão na China; em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos; e em Nova Jersey, nos Estados Unidos.

”A paralisação dos fornos é uma péssima notícia”, disse um trabalhador que falou sob a condição de anonimato por medo de comprometer seu emprego de 28 anos. “Claro, os preços altos da energia estão tendo um impacto”, acrescentou, “mas é assustador como isso está acontecendo rápido”.

Hodler está trabalhando para afastar a Arc dos problemas, depois de anos de dificuldades financeiras relacionadas à expansão excessiva e, mais recentemente, aos lockdowns provocados pela pandemia. Em dezembro, pouco depois de Holder assumir o cargo após uma reestruturação da empresa, a Arc recebeu um empréstimo de emergência de €45 milhões do governo francês e agora está solicitando uma ajuda adicional para poder pagar as contas de energia salgadas.

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O local, com consumo equivalente ao de 200 mil casas, fabrica itens para mesa posta, entre eles pratos rasos Luminarc e utensílios para mesa e bebidas da marca Cristal d’Arques. Globalmente, a Arc produz 4 milhões de taças por dia, assim como artigos como castiçais para a Bath & Body Works e copos promocionais para a Heineken e o McDonald’s.

Isso requer calor intenso para derreter e transformar areia em vidro em fornos que devem permanecer ativos 24 horas por dia. A recente crise de energia na Europa fez com que a conta da empresa disparasse no verão para € 75 milhões – há um ano ela era de € 19 milhões. Além disso, os consumidores pararam repentinamente de comprar artigos como castiçais e máquinas de lavar, para as quais a Arc fabrica as janelas de vidro, fazendo com que as encomendas caíssem.

O baque duplo fez com que a equipe de gestão da Arc se esforçasse para encontrar saídas – nenhuma delas parecia ser das mais agradáveis.

Operação de risco

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Ainda mais assustadora era a perspectiva de desativar os fornos da Arc. “Não dá para simplesmente desligar um forno de vidro, isso o destruiria”, disse Hodler. “Se forem desligados aos poucos, sobrevivem, mas depois vão demorar mais de um mês para serem reaquecidos.”

Dois fornos programados para passar por manutenção talvez permaneçam desligados no futuro próximo, disse Hodler. Outros dois serão temporariamente desativados para compensar a queda na demanda. “Não queremos interromper completamente as operações”, disse Hodler. “Mas não vamos produzir se perdermos dinheiro.” / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

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