BRASÍLIA – Gastos que não foram incluídos no Orçamento de 2025 pelo governo do presidente Lula e que precisarão ser colocados podem diminuir ou até mesmo acabar com os efeitos do pacote fiscal aprovado no fim do ano passado pelo Congresso Nacional.
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O Orçamento de 2025, enviado em agosto do ano passado pelo Poder Executivo, ainda não foi aprovado pelo Legislativo. A suspensão das emendas parlamentares pelo Supremo Tribunal Federal (STF) atrasou a votação, que só deve ser retomada após o carnaval.
Há despesas que deverão crescer mais do que o previsto inicialmente e programas que não entraram no Orçamento e precisarão ser colocados. Os ajustes podem ser feitos já no projeto de lei, o que garante um Orçamento mais realista, ou ao longo do ano, cortando recursos de outras áreas.
O Ministério do Planejamento e Orçamento informou que os eventuais ajustes no Orçamento “estão sendo discutidos internamente”.
A conta de despesas que precisarão entrar no Orçamento é de pelo menos R$ 28 bilhões, segundo especialistas consultados pelo Estadão. O valor absorve praticamente todo o ajuste projetado pela equipe econômica com o pacote fiscal em 2025, calculado pela equipe econômica em R$ 29,4 bilhões.
O aumento de gastos pode ter um efeito ainda maior porque a economia calculada pelo governo traz medidas que não significam corte efetivo de despesas, como é o caso das emendas parlamentares, propostas ainda não aprovadas, como a mudança na aposentadoria especial dos militares, e medidas administrativas que podem não ser consideradas na proposta orçamentária, como a biometria e pente-fino em benefícios sociais.
Os números finais ainda não foram fechados pelo Congresso e pelo governo, pois dependem de dados como inflação, Produto Interno Bruto (PIB), beneficiários de programas sociais e arrecadação de impostos federais que ainda não foram processados.
Só na Previdência Social, consultores do Congresso calculam que será preciso acrescentar mais R$ 14 bilhões. O aumento se deve às novas projeções de inflação e do salário mínimo, que interferem no cálculo dos benefícios. O pacote fiscal diminuiu o ganho do salário mínimo, mas mesmo assim há um aumento em relação à projeção inicial do governo. Além disso, a inflação está maior do que a estimada anteriormente. O saldo final é de aumento nos gastos.
Também há programas que não entraram inteiramente no Orçamento, como é o caso do Pé-de-Meia, uma bolsa para estudantes do ensino médio. O governo operou os pagamentos com gastos paralelos no ano passado. O Tribunal de Contas da União (TCU) mandou os recursos voltarem para a contabilidade tradicional – o governo recorreu e aguarda nova análise da Corte de Contas. Conforme o Estadão mostrou, serão necessários mais R$ 3,6 bilhões para colocar o Pé-de-Meia no eixo nas contas públicas.
O Auxílio Gás é outro que precisará de recursos não colocados pelo Poder Executivo na peça orçamentária. O governo tentou tirar o programa do Orçamento e colocou uma verba insuficiente na proposta orçamentária, mas a mudança não foi aprovada. Serão necessários mais R$ 2,8 bilhões para garantir o pagamento das parcelas para todos os beneficiários até o fim do ano.
Há ainda R$ 8 bilhões para o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais, criado pela reforma tributária. A medida instituiu que a União depositasse o valor em 2025, mas o governo não incluiu o recurso no Orçamento deste ano. O fundo foi idealizado para compensar empresas que vão perder benefícios fiscais concedidos por Estados e acabar com a chamada “guerra fiscal”, que ocorre quando um Estado dá incentivo para atrair um negócio e tirar o investimento de outro Estado.
“O relator e a Comissão Mista de Orçamento do Congresso vão ter de fazer ajustes e incorporar os efeitos do pacote, que é claramente insuficiente”, afirma o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, Marcus Pestana. “O pacote tem medidas que são corta-ventos: você está deixando de agravar o problema, mas não está corrigindo o problema.”
O Congresso deve ainda colocar mais R$ 11,5 bilhões em emendas parlamentares que o governo não incluiu no Orçamento. O valor será destinado às emendas de comissão, que herdaram o orçamento secreto, esquema revelado pelo Estadão.
Ao colocar mais dinheiro para emendas, os congressistas devem cortar verbas do Programa de Aceleração do Crescimento (Novo PAC) e de outros programas da gestão Lula. Não é um aumento direto no total das despesas, mas é uma mudança que tira a capacidade de o Poder Executivo se planejar, pois o dinheiro fica nas mãos dos parlamentares, e pode exigir aumento de gastos lá na frente para cobrir os custos do governo.
Algumas medidas mais efetivas do pacote fiscal devem aliviar as contas, mesmo com o resultado final apontando para aumento de despesas. As três principais são o ganho menor do salário mínimo, que impacta as despesas com Previdência, abono salarial e seguro-desemprego; a mudança no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que vai incorporar as despesas com o ensino em tempo integral, aliviando os gastos do governo nessa área; e a Desvinculação de Receitas da União (DRU), que vai desobrigar o governo a colocar gastos obrigatórios em alguns fundos, como o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
Juntas, as três medidas devem gerar uma economia de R$ 12,2 bilhões neste ano, de acordo com os cálculos da equipe econômica. Há, porém, alguns obstáculos. Além de não ser suficiente para compensar o aumento de gastos, o ajuste depende de mudanças concretas. No caso do Fundeb, os valores definidos para 2025 não incorporaram as mudanças do pacote de corte de gastos e precisarão ser corrigidos, como revelou o Estadão. No caso do FNDCT, será preciso superar a mobilização do setor de ciência e tecnologia no Congresso, que nos últimos anos aprovou medidas para proibir cortes no setor e blindar o fundo.
Ajustes na arrecadação podem desequilibrar contas do Orçamento
Além dos ajustes nas despesas, será necessário fazer correções nas estimativas de arrecadação dos impostos federais. O governo colocou no projeto receitas que não devem se concretizar, como o aumento de alíquotas da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e os Juros sobre Capital Próprio (JCP), cujo projeto está parado na Câmara.
Também há receitas extraordinárias no Orçamento, como a volta do voto de qualidade pró-Receita Federal no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), em que o próprio governo reconheceu que a estimativa de arrecadação de R$ 28,6 bilhões está inflada e não deve se concretizar.
O Congresso aprovou um relatório reconhecendo que as receitas do governo estão superestimadas, mas mesmo assim aumentou a previsão total da arrecadação em R$ 22,5 bilhões com crescimento da economia, o que é contestado por técnicos.
A inflação deve impulsionar a arrecadação do governo federal, mas não o suficiente para compensar os ajustes calculados. Entre as receitas e despesas, o órgão do Senado calcula que o governo fechará o ano com um resultado negativo nas contas públicas de 0,7% do PIB. “O Orçamento ainda está desequilibrado e tende ao final construir mais um resultado deficitário”, diz Pestana.