‘Lula ainda é favorito, mas mercado quer vê-lo mais ao centro’, diz economista do Goldman Sachs

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NOVA YORK E SÃO PAULO - O Goldman Sachs, um dos gigantes de Wall Street, ainda vê o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como favorito para vencer as eleições no Brasil, apesar da margem apertada ante o seu rival, o presidente Jair Bolsonaro (PL), no primeiro turno. No entanto, há uma expectativa no mercado de que o petista se mova mais ao centro e detalhe suas propostas, principalmente sob a ótica econômica e, em especial, a questão fiscal, de acordo com o diretor de Pesquisa Macroeconômica para América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos.

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“O Lula fez uma campanha muito do tipo ‘acredite em mim, você me conhece e eu não preciso dizer o que vou fazer’. Basicamente, a gente não sabe quem vai ser o próximo ministro da Fazenda. A gente sabe que o PT e o Lula não gostam do teto dos gastos, mas ninguém se deu ao trabalho de formular o que seria o substituto”, diz o economista, em entrevista ao Estadão/Broadcast, da sede do banco, em Nova York. Ele não espera, porém, que Lula anuncie quem será o ministro da Fazenda antes de vencer as eleições.

Das urnas, os sinais mais relevantes, na sua visão, foram o bolsonarismo como uma “força política relevante” à frente e um Congresso que pode atuar como uma “barreira de contenção” a propostas mais radicais, em um cenário de vitória de Lula. Abaixo, os principais trechos da entrevista:

Alberto Ramos, diretor de Pesquisa Macroeconômica para América Latina do Goldman Sachs Foto: Felipe Rau/Estadão - 16.mai.2022

Qual a sua avaliação do primeiro turno das eleições no Brasil?

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Acho que o presidente Lula ainda é o favorito, dado que ficou muito próximo dos 50% e precisa converter apenas uns 20% dos votos que foram para outros candidatos, assumindo que não perde nenhum dos que votaram no primeiro turno e que quem não votou não votará também no segundo turno. Mas acho que o ponto importante é que o bolsonarismo, como identidade política e como filosofia política, não só sobreviveu como se expandiu em termos de representação no Congresso e a um nível local, em termos das eleições de governadores. Figuras proeminentes associadas ao governo se deram bem nessa eleição. Então, parece que o apoio de Bolsonaro fez a diferença nessas eleições, em níveis regionais e para o Congresso. Isso significa que o bolsonarismo vai se manter vivo e talvez esteja a olhar o jogo um pouco mais longo, daqui a quatro anos, para se manter como força política relevante.

O que se espera agora, dos candidatos, em termos de posicionamento?

Olhando para a frente, o Bolsonaro parece ter um pouco de momentum. Ele excedeu o que as pesquisas mostravam, e isso pode energizar um pouco a base e, certamente, a base política. Na última semana, a imprensa reportou que Bolsonaro estava meio desanimado e que alguns partidos estavam tirando o corpo fora, mas pode ser que, agora, fiquem um pouco mais comprometidos. Os governadores que foram eleitos no primeiro turno também podem ter um papel significativo na campanha, principalmente em Minas [Gerais] e no Rio [de Janeiro]. E Bolsonaro também tem a favor dele o fato de que vamos continuar a ter uma sequência de números negativos de inflação, de que a economia está razoavelmente bem, particularmente em termos do mercado de trabalho. E ele ainda pode turbinar um pouco mais os benefícios sociais, como vimos com o anúncio do décimo terceiro do Auxílio Brasil para mulheres. Esses são os fatores que poderiam, eventualmente, encurtar um pouco a distância.

E no caso do ex-presidente Lula?

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Há uma expectativa no mercado de que Lula tenha de se mover um pouco mais ao centro. Eu acho que ele já se moveu bastante ao centro, pelo fato de ter escolhido [Geraldo] Alckmin como vice-presidente e por todo o posicionamento político e retórico, fazendo o apelo forte ao voto útil. Desse ponto de vista, acho que não há muito mais o que extrair dessa estratégia, porque mais ao centro já vira quase direita. Mas Lula fez uma campanha muito do tipo ‘acredite em mim, você me conhece e eu não preciso dizer o que vou fazer’. Basicamente, a gente não sabe quem vai ser o próximo ministro da Fazenda. A gente sabe que o PT e o Lula não gostam do teto dos gastos, mas ninguém se deu ao trabalho de formular o que seria o substituto. A gente não sabe que tipo de reforma tributária exatamente o PT vai perseguir, se vai ou não tentar aprovar uma reforma administrativa. Pode ser que, neste contexto de uma eleição mais competitiva, a campanha resolva dar um pouco mais de especificidade a algumas das propostas. Ou não. Eu não espero que vão anunciar quem será o ministro da Fazenda.

Há uma preocupação geral com o teto dos gastos, independente de quem vença. Os dois candidatos ainda têm mais a sinalizar nessa área?

Os estudos que vieram a público, elaborados pela Secretaria de Política Econômica - que são servidores, não são necessariamente membros do bolsonarismo e podem continuar num próximo governo Lula - são de um teto que se parece muito com o que tem hoje, mas que sobe um pouco o gasto em termos reais. Do lado do PT, não tem nenhuma clareza. Eu me encontrei com gente do PT em São Paulo e o que eu ouvi é que o teto tem de ser ‘flexível, simples, crível e contracíclico’ e que, além disso, deixe espaço para aumentar o investimento público, que tem sido muito baixo nos últimos anos, e também para perseguir políticas redistributivas. Me parece, nessa caracterização muito abstrata, que é um teto que limita pouco. É muito mais fácil dizer quais são as características de uma boa âncora do que formular qual é esse teto exatamente.

Qual a sua visão sobre o atual teto de gastos?

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Eu nunca acreditei muito no valor do teto, e a razão não é que eu ache que esteja mal formulado do ponto de vista técnico, tem mais a ver com a cultura política. O teto tinha uma visão meio poética, meio romântica, de que você tem um teto que limita o gasto e que, quando começar a ser limitante, os congressistas se sentariam em volta de uma mesa redonda e diriam: ‘vamos estabelecer prioridades, infelizmente não dá para gastar em tudo que a gente quer’. Essa discussão nunca aconteceu. Eu sempre achei que, quando o teto passasse a ser limitante, eles não iriam discutir como priorizar o gasto, iriam discutir como gastar para além do teto. E foi exatamente isso que aconteceu, porque não dá dividendo político cortar gastos.

A composição do Congresso eleito neste domingo muda de alguma forma as expectativas para a agenda de reformas e a política fiscal de um novo governo?

Acho que esse Congresso, com uma maior representação de centro-direita, pode resistir mais a determinados tipos de políticas como o aumento da carga tributária, imposto sobre riqueza, coisas desse gênero. Mas é um Congresso muito fluído e os partidos não têm uma identidade ideológica e programática muito forte. Eu diria que não faz muita diferença, mas, talvez, se o presidente Lula for eleito, vai encontrar um Congresso um pouco mais aguerrido e menos disposto a compor com o governo.

Um cenário de Lula eleito, com um Congresso mais conservador, seria bom?

Seria bom que quem viesse a ser eleito tivesse governabilidade. Eu acho que, seja Bolsonaro reeleito, seja Lula voltando à Presidência, eles vão ser capazes de compor uma base política no Congresso, mas nenhum deles vai ser capaz de ter uma base política que seja muito estável ou muito fiável. Mas vocês perguntaram se isso é bom ou isso é mau. Acho que, tendo um Congresso que funciona como uma barreira de contenção a propostas mais extremas e radicais, eventualmente vindo de um governo do PT, é bom. Tudo que sejam coisas muito controversas: ter um Congresso limitando essa possibilidade é algo que acho que o mercado veria com bons olhos.

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