‘Alumínio vai ser essencial na transição para uma economia de baixo carbono’, afirma CEO da CBA

Luciano Alves diz que material deve ser fundamental, por exemplo, na fabricação de carros elétricos e placas solares

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Foto do author Beatriz  Capirazi
Foto: WERTHER SANTANA
Entrevista com Luciano AlvesPresidente-executivo da Companhia Brasileira de Alumínio (CBA)

Com a urgência das mudanças climáticas, fomentar uma economia de baixo carbono tornou-se um dos principais focos dos governos e das empresas, que discutem cada vez mais as tecnologias a serem desenvolvidas para tornar a bioeconomia uma realidade e o quão custosas podem ser.

No entanto, muitas delas já existem e estão disponíveis no mercado, segundo o presidente-executivo da Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), Luciano Alves. “O alumínio vai ser essencial na transição para uma economia de baixo carbono”, afirma.

Segundo ele, os veículos elétricos e híbridos, cada vez mais citados como essenciais para diminuir o impacto das emissões dos veículos, demandam uma quantidade maior de alumínio, colocando o componente como essencial na equação.

“Um veículo elétrico ou híbrido leva 40% mais alumínio do que um veículo a combustão interna. Você precisa reduzir o peso do veículo porque a bateria é muito pesada. Tendo mais demanda por veículos elétricos, você vai ter uma demanda maior por alumínio naturalmente”, explica.

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A companhia tem expandido a sua produção de alumínio reciclado. Com um investimento de R$115 milhões em reciclagem na subsidiária Metalex no segundo semestre de 2023, a expectativa é que sejam adicionadas 50 mil toneladas por ano em capacidade de reciclagem de alumínio da empresa através da instalação de uma nova linha de tratamento de sucata.

Luciano Alves Presidente da CBA. Foto: Werther Santana/ Estadão

Pertencente ao grupo Votorantim e única no Brasil com atuação integrada dentro do mercado de alumínio, a comapanhia enfrentou um ano desafiador em 2023, com prejuízo líquido de R$ 586 milhões no quarto trimestre de 2023 ― um montante sete vezes maior do que o reportado no mesmo intervalo de 2022, quando registrou perdas de R$ 80 milhões.

Os resultados negativos são consequência do ajuste nos contratos futuros de energia e em função do baixo patamar de preços que a tonelada de alumínio registrou, com os custos permanecendo elevados.

Abaixo, confira os principais destaques da entrevista:

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Commodities como o petróleo ou o minério de ferro são considerados poluentes, enquanto o alumínio tem, de maneira geral, um impacto menor. Qual o papel do setor em uma transição para uma economia de baixo carbono?

Se a gente pensar em transição energética, muito provavelmente o alumínio vai exercer um papel fundamental. Como a gente fala de carros elétricos sem envolver o volume necessário de alumínio para a sua criação? Como a gente fala de ampliar transmissão e geração de energia sem falar das placas solares?

Um veículo elétrico ou híbrido leva 40% mais alumínio do que um veículo a combustão interna. Você precisa reduzir o peso do veículo porque a bateria é muito pesada. Então o alumínio entra ajudando nessa transição. Você tendo mais demanda por veículos elétricos, você vai ter uma demanda maior por alumínio naturalmente por causa desse componente.

O alumínio é muito utilizado nas embalagens, nas linhas de transmissão e nos painéis de energia solar, pela resistência do material. Se o mundo ficar mais eletrificado, você terá mais linha de transmissão e mais demanda de alumínio.

É claro que, para isso acontecer, o mercado precisa estimular as coisas, e os consumidores precisam também elevar o nível de consciência. Nada disso funciona se essa parte não se envolver nesse processo de evolução.

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E essa conscientização vem acontecendo?

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Nos últimos anos você vê uma demanda maior do consumidor (por esses produtos), mas essa conscientização ainda é focada. A gente viu uma demanda específica nas grandes montadoras de veículos mais sofisticados, uma BMW e uma Land Rover. Mesmo assim, temos visto também movimentos de Honda e Toyota. Quando você tem esse nicho dos equipamentos mais sofisticados atuando, é claro que isso vai para o restante da economia no futuro.

Essa demanda do consumidor naturalmente vai exigir que as empresas façam as coisas da forma correta, busquem certificações. Isso vai ser algo que se espera que todo mundo faça e quem não fizer vai ter uma dificuldade de colocar o seu produto no mercado ou vai ter que ter algum tipo de penalização, seja em impacto no volume produzido ou no preço.

Nesse cenário, entra também o governo em criar mecanismos de regulação, o que já está acontecendo na Europa, em que haverá uma taxação do carbono contido no produto que vai ser consumido pelo europeu.

A transição é um processo longo e ainda vai demorar um tempo para ser implementado, mas já começa a se diferenciar no mercado quem tem produto de baixo carbono. Para vender na Europa, por exemplo, os produtores de baixo carbono no futuro vão ter uma vantagem porque lá existe essa forte preocupação.

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Luciano Alves afirma que esta deve ser uma das commodities fundamentais para possibilitar a transição energética no Brasil. Foto: Robson Fernandes/ AE

Justamente para dar esse poder de escolha pro consumidor, temos um selo, que tem como objetivo mostrar para o consumidor lá da gôndola do supermercado que aquele produto foi feito com alumínio de baixo carbono. Quem compra sabe que está comprando um produto de baixo carbono, quem fabrica sabe que está adquirindo um alumínio de baixo carbono e proporcionando essa escolha para o cliente dele.

O alumínio é considerado um material 100% reciclável e justamente por isso é visto como uma ‘opção mais verde’ que o plástico. No entanto, o setor conta com altas emissões de gases do efeito estufa. A indústria vem se movimentando para sanar isso?

Essa é uma indústria que tem uma emissão alta, mas importante dizer que a emissão do alumínio não está na produção dele, mas na energia que é consumida para produção. Hoje, a maior parte do mercado produz alumínio com termelétricas a carvão, assim como operações com termelétricas a gás. Uma pequena parcela, eu diria que mais ou menos uns 25% da indústria, usa renováveis como solares e hidrelétricas.

Tem um caminho para a indústria reduzir as emissões e ou de melhorar a pegada de carbono simplesmente mudando a matriz energética, o que coloca o setor em uma posição de vantagem em relação a outras indústrias.

A gente sabe que existe uma dificuldade: você não muda a matriz energética de um país ou de uma operação da noite para o dia. Vai demorar um tempo até isso acontecer, mas, na prática, a gente acha que a indústria está caminhando nesse sentido. Existe o interesse da indústria de fazer isso, até porque existe uma demanda do público consumidor final dos nossos clientes.

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A CBA coloca como um dos seus principais diferenciais no setor em que atua o fato de estar apostando cada vez mais na produção reciclada de tarugos de alumínio, vendidos aos setores automotivo e de infraestrutura. Como a companhia vem investindo nesta área?

Diferente de muitas empresas de alumínio, a gente está na cadeia inteira. O que significa isso? A gente produz a bauxita, que é o minério que vai produzir o alumínio, mas também materiais reciclados. Isso traz uma grande vantagem competitiva, porque você controla os custos da cadeia toda. Além disso, a gente consegue trabalhar em toda a cadeia para redução de emissões.

Por ter 100% da matriz energética de energia renovável ― 90% energia hidrelétrica e 10% de energia eólica ―, conseguimos ter um produto de baixa pegada de carbono. Para um produto ser considerado de baixo carbono tem que ter uma pegada abaixo de quatro toneladas de CO2 para cada tonelada de alumínio. A nossa pegada é três. Na indústria, a média é acima de 11.

A gente já é um negócio competitivo com baixa pegada de carbono e a gente tem várias iniciativas para continuar melhorando. Na nossa visão, essa vai ser a maneira de atuar no futuro. O mercado vai demandar isso, então a gente tem que estar na frente, até para ser utilizado como referência.

A gente conhece uma boa parcela do caminho para reduzir ainda mais as nossas emissões. A gente pode usar mais material reciclado, desenvolver outras iniciativas de tecnologia para a nossa produção. Além disso, atualmente temos o trabalho de geração de créditos de carbono e a comercialização de créditos. Estamos nos preparando também para esse momento do mercado regulado.

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Os créditos de carbono foram verificados, auditados e ficaram viáveis em 2021. Começamos todo esse processo em 2017 e desde então geramos 316 mil créditos. Algumas indústrias têm feito a aquisição desses créditos conosco. Estamos buscando essas oportunidades.

O mercado de carbono acumulou polêmicas ao longo do ano passado, envolvendo tanto a exploração de terras públicas, assim como a confiabilidade dos créditos. Essa é uma preocupação para a companhia?

Não e não vai ser um problema porque a terra em que estamos explorando créditos é nossa. Temos absoluto domínio e gestão sobre essa propriedade e isso já elimina uma uma série de questões que podem vir a se tornar problemas.

Mas é claro que é um mercado que tem altos e baixos e está em um momento de baixa agora. Significa dizer que a gente tem a capacidade de manejar esse crédito, usar ele internamente para esse fim de neutralidade.

No mercado, hoje uma das principais discussões são as dificuldades para as empresas que já são consideradas pertencentes à bioeconomia conseguir financiamento, já que muitas são startups ou empresas de tamanho médio. Para as grandes, a dificuldade é manter a lucratividade do negócio atual conciliando o investimento no desenvolvimento de tecnologias mais limpas que sejam rentáveis. Como a companhia vê esse equilíbrio entre a velha e a nova economia?

Acho que é uma evolução natural. Há 20 anos, a digitalização era um diferencial, hoje faz parte de todos os negócios. Nessa pauta vai ser mais ou menos a mesma coisa. Hoje se fala como um diferencial, mas no futuro isso vai ser exigido de todo mundo.

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Cada empresa vai ter a sua realidade e você vai ter que traçar um caminho de acordo com as suas possibilidades. Entendo que, para algumas empresas, pode ser muito investimento e ela não vai ter capacidade de fazer tudo, enquanto para outras empresas vai ser menos, mas o caminho está dado. A empresa vai ter que priorizar aquilo que é mais importante para ela.

No caso do alumínio, muitas empresas devem estar priorizando uma matriz energética renovável, porque é o principal fator que faz você reduzir as suas emissões no futuro. Ter metas é muito importante, porque tendo esses compromissos você cria na empresa a necessidade de criar planos para chegar até lá. Você não necessariamente vai seguir estritamente equilibrando, porque o mercado muda, você tem volatilidade, crises que vão acontecendo, mas você não muda o norte.

No nosso caso, por exemplo, as commodities têm ciclo de alta e de baixa. A gente tá em um momento de baixa, mas a gente não mudou as nossas estratégias, nossas metas. Não mudamos nada do nosso longo prazo, mas ajustes no curto prazo.

Luciano Alves Presirente da CBA. Foto: Werther Santana/ Estadão

Por sermos uma empresa grande e termos um negócio mais sustentável, temos uma posição vantajosa. Nós já temos 100% de energia renovável, a gente não vai precisar investir em mais energia renovável para mudar a nossa matriz energética, mas investir para crescer para que eu continue com essa integração na energia renovável. Atualmente, alguns dos nossos concorrentes mundiais têm essa preocupação de mudança de matriz.

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Você mencionou que hoje as marcas que já enxergam e colocam a sustentabilidade como um agregador de valor para o público são as marcas de luxo. Sustentabilidade é visto como luxo?

Eu diria que é um nicho de mercado. Você tem um consumidor consciente atualmente, aquele consumidor que vê a pegada de carbono, a história que aquele produto conta. Ele quer comprar o produto por causa disso e prefere até pagar mais por isso. É uma fase de transição crescente e vem aumentando essa conscientização da população dos públicos em relação à cultura. É claro que não dá pra gente desapegar de preço, ele importa.

Você vai criando um grau crescente de conscientização da população até o momento em que algumas vão começar a rejeitar a marca X ou Y porque ele simplesmente não aceita comprar um produto com aquela pegada de carbono, com aquele impacto.

O mercado segue até uma tendência. Se a gente for ver, a maioria das novas tecnologias tem um preço mais elevado até por ser pouco escalável algumas vezes, para depois ir barateando conforme ganhar aderência.

O Plano Nova Indústria causou polêmica ao ser anunciado, com a maioria das indústrias achando que não houve muitas novidades em comparação com anos anteriores. Qual a opinião de vocês?

Ele é importante, positivo. É uma política industrial que nos coloca numa posição favorável em relação aos nossos concorrentes do mundo, mas isso precisa se traduzir em investimentos e ações concretas, de fato, para que a gente chegue lá.

Muita gente falou que não saiu do jeito que todo mundo queria. Enfim, tem essa discussão, mas também tem a fase de implementação, isso é uma adaptação.

Você tem visto o governo se movimentar em ações em prol de uma bioeconomia?

Temos que relembrar que o Brasil é um país diferenciado nesta pauta específica, né? Políticas de incentivo à indústria são sempre bem-vindas. Então pelo fato da gente ter energia renovável amplamente disponível no país e a grande maioria da nossa matriz energética ser limpa.

Naturalmente as indústrias que estão no Brasil vão conseguir ter uma pegada de carbono mais baixa do que outras similares no restante do mundo. Não só no setor do alumínio, mas para outras indústrias também é importante ter uma política pública que incentive as indústrias e coloque o Brasil no seu papel adequado perante o mundo.

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