Ao longo da última década, o perfil do conselheiro de administração buscado pelas grandes empresas no Brasil teve uma transformação importante. Atualmente, esse é um profissional com atuação cada vez mais ativa junto à área executiva e mais atento às agendas urgentes do mercado. A prova disso aparece em um cenário corporativo marcado por conselhos com mais mulheres, mais membros recrutados fora dos núcleos familiares e com ofertas de remuneração tão atrativas quanto as recebidas nas funções executivas.
Os dados da pesquisa anual da consultoria Korn Ferry intitulada “Práticas de Governança e Remuneração de Conselhos” mostram que, em 2024, 6 em cada 10 membros dos conselhos de administração no País eram independentes (profissionais que não possuem vínculo pessoal ou financeiro com a empresa); 20% desses conselheiros eram mulheres; e parte deles tinha remuneração anual acima de R$ 1 milhão.
As informações da pesquisa são compiladas desde 2014. Em 2024, o levantamento, que está na 12.ª edição, mapeou mais de 100 grandes companhias no Brasil, tendo como maioria de sua base amostral dados não públicos, coletados diretamente com as empresas.

Ao catalogar as informações, a pesquisa observou de forma panorâmica informações gerais sobre remuneração de conselheiros, além de aspectos de governança e da estrutura dos conselhos. A maior parte das companhias ouvidas pertence ao segmento industrial, seguida das representantes de áreas de varejo, holding, serviços, finanças e de mais nove setores.
O líder da prática de serviços para conselhos da Korn Ferry, Jorge Maluf, explica, que ao longo do tempo, controladores das empresas no Brasil, que costumavam deter uma grande fatia das ações, passaram a abrir capital e ceder até 50% de sua parte para novos investidores. Com esses novos acionistas, vieram também novas exigências para governança, demandando mais membros independentes e mais diversidade de gênero.
“As empresas começaram a avançar na governança justamente para atender a essas demandas”, afirma.
Avanço na diversidade
Entre 2014 e 2024, a presença de mulheres nos conselhos saltou de 7% para 20%, segundo o estudo. O número é ainda inferior ao de mercados internacionais, como os dos EUA (25%) e da Europa (39%), mas aponta para uma tendência de aumento. Na presidência dos conselhos, as mulheres estavam em sete cadeiras em 2024, ante seis em 2023.
Segundo Maluf, essa rota de crescimento já era esperada, uma vez que houve forte influência da agenda ESG no mercado, principalmente por exigências de acionistas.
“Os investidores, lá fora, esperavam ver que os conselhos das empresas tivessem gradativamente um aumento de participação feminina. E, quando nos referimos aos conselheiros independentes, foi muito mais acelerada essa curva de crescimento de diversidade de gênero”, diz.
Membros independentes
O porcentual de membros independentes nos conselhos de administração quase dobrou em dez anos. Em 2014, eles eram 35% na composição desses colegiados. Agora, chegam a 60%. O estudo também registrou aumento no número de presidentes independentes. Entre 2023 e 2024, eles passaram de 27 para 34 entre as empresas mapeadas.
O aumento desse tipo de conselheiro nas empresas reflete a profissionalização e a mudança estratégica dos conselhos no Brasil, diz Maluf. A composição passou a exigir pessoas que pudessem apoiar não só decisões de auditoria, mas colaborar com a gestão efetivamente em novas e diversificadas demandas.
“A agenda temática dos conselhos começou a aumentar. Antes, ele se reunia para aprovar as contas, os demonstrativos financeiros. Era uma agenda de controle, de supervisão. Agora, o conselho tem de discutir transição energética, transformação digital, ESG, geopolítica global.”

Houve, com isso, a exigência de novos perfis, geralmente vindos de fora dos núcleos familiares. “Os conselhos passaram a perceber que aquele perfil tradicional de conselheiro, geralmente alguém com background em finanças e em direito, não dava mais conta de atender a essas demandas. Então, começaram a trazer pessoas de fora, que pudessem contribuir com essas outras discussões. Com isso, o conselho passou a ser mais atuante.”
Remuneração competitiva
A demanda por profissionais especialistas em diversas áreas não só influenciou o aumento de membros independentes, como também a oferta de remuneração mais competitiva, para atração de profissionais e maior dedicação de tempo deles às funções dos conselhos.
O estudo não apresenta uma série histórica sobre remuneração, mas aponta que, em 2024, o pagamento anual de um conselheiro independente podia atingir cifras milionárias. Um total de 25% das empresas com receita líquida de até R$ 5 bilhões oferecia mais de R$ 639 mil anuais para seus membros independentes, enquanto 25% das empresas com receita líquida acima de R$ 30 bilhões pagavam mais de R$ 1,1 milhão por ano para esse perfil de conselheiro.
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“Há 15 anos, a remuneração de um conselheiro não era uma preocupação, pois essa não era uma profissão. Quem estava lá havia sido convidado ou tinha relação com o controlador, como uma espécie de clube”, explica Maluf. “Hoje, os conselhos se reúnem muito, e a dedicação de tempo dos conselheiros é muito intensa. Eles têm de estar muito preparados para participar de uma reunião.”
O movimento, conforme o especialista, criou um mercado de conselheiros, com a remuneração crescendo em um ritmo maior do que a remuneração executiva, embora o valor final ainda seja menor. A tendência é que o mercado atraia cada vez mais interessados. “O resultado da pesquisa é muito mais o efeito do que uma causa. A causa é essa mudança que os conselhos vêm vivendo e o efeito é que a remuneração reflete esse contexto. Ela começa a refletir o tamanho da contribuição esperada desses conselheiros.”