Embora muito se fale sobre a necessidade de investimentos para desenvolver novas tecnologias que viabilizem a descarbonização, muitas delas já estão disponíveis no mercado, segundo o CEO da Schneider Electric para América do Sul, Rafael Segrera. O executivo avalia que ainda é preciso aumentar a escala dessas tecnologias para viabilizá-las para a maioria das companhias, não as deixando disponíveis apenas para as grandes empresas.
O especialista avalia que a eletrificação é hoje muito mais uma questão de foco central para as empresas. “Nessa discussão, muito se fala da falta de tecnologia para impulsionar a transição energética em empresas, mas a resposta que a gente dá é que mais de 70% das tecnologias que a gente precisa para atacar essa eletrificação e essa descarbonização em consequência já estão disponíveis no mercado”, argumenta.
Ele aponta que hoje muito pode ser feito apenas mudando sistemas que ajudem a otimizar os negócios das companhias por tecnologia. Para haver uma mudança factível, é preciso dar celeridade a esse processo. “A gente acredita que é mais uma necessidade de velocidade de implementação. É preciso vontade”, aponta ele.
Abaixo, os principais trechos da entrevista:
As empresas têm colocado a transição energética como um foco central, e as companhias de energia estão em uma posição privilegiada. Como o senhor vê esse cenário?
Temos visto várias tendências no setor, mas a que efetivamente está no centro e é global, que todo mundo compartilha, é a transição energética. Faz parte da agenda e das prioridades de todos os governos, e, em consequência, está no foco das ações de todas as empresas e governos.
O cenário coloca obviamente as empresas de energia em uma posição privilegiada, mas também de muita responsabilidade, porque a gente sabe que essa transição energética será fundamental para combater as mudanças climáticas. Ainda não estamos na velocidade na qual a gente precisa estar para conseguirmos chegar a um cenário melhor para o Brasil.
Sei que nessa discussão muito se fala da falta de tecnologia para impulsionar a transição energética em empresas, mas a resposta que a gente dá é que mais de 70% das tecnologias que a gente precisa para atacar essa eletrificação e essa descarbonização em consequência já estão disponíveis no mercado. Por isso a gente acredita que é mais uma necessidade de uma velocidade de implementação. É preciso vontade.
Acredita que hoje as tecnologias estão disponíveis para todas as empresas?
Não está tudo disponíveis e ainda faltam tecnologias. Certamente as empresas de energia fóssil, sobretudo, não só as empresas de energia fóssil, mas também os grandes consumidores que têm processo que precisa de muita demanda, precisariam de uma quantidade de energia maior para poder fazer seus processos de maneira economicamente viável.
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Mas insisto: não tem 100%, mas já tem muito. Seja no aço, seja na petroquímica, seja na produção off-stream, tem processos que já hoje são economicamente viáveis e já têm empresas do setor fóssil que estão aplicando. Mas eles não são os únicos responsáveis. É um processo que será feito em conjunto por todos.
Se tem essa ajuda dos governos, seja federal, seja estadual, seja ao nível da cidade, para um hospital, uma pequena fábrica, o impacto será total.
O que falta para conferir celeridade ao processo?
Acredito que o que pode dar impulso para essa pauta é ter foco na eficiência energética. Uma vez que a empresa tem eficiência energética, vai ter uma eficiência operacional também através da digitalização e, em consequência, um benefício econômico. A adesão em várias áreas seria benéfica para impulsionar esse processo.
Se a gente vê os prédios, os edifícios onde a gente mora, onde a gente trabalha, 30% não têm tecnologias para otimização de eletrificação e visando a eficiência energética. E, para edifícios, prédios, já têm disponíveis praticamente 100%. Você pode eletrificar tudo, os aplicativos, todos os processos que estão no centro comercial, prédios, hospitais, tudo isso.
As empresas vão mudar, em um momento ou outro. A opção por escolhas mais sustentáveis já não é uma escolha para as empresas. Ou se muda por convicção, ou pela dor. Temos visto tudo o que está acontecendo em questão de mudanças climáticas e tragédias ambientais. Mudar é uma necessidade.
As empresas nunca falaram tanto de ESG. Hoje, a sustentabilidade já é lucrativa para as empresas?
Se olharmos para a valorização e a capitalização da nossa empresa nos últimos anos, especialmente nos últimos cinco anos, veremos um crescimento incrível. Há duas coisas a serem consideradas aqui. Primeiro, ao adotarmos uma estratégia de sustentabilidade, não estamos apenas visando o lucro financeiro. Quando falamos de sustentabilidade, falamos do ESG, ou seja, do compromisso ambiental, da transição energética, da redução da pegada de carbono, mas também de um forte impacto social, com planos que visam não apenas o acesso à energia e à informação, mas também o engajamento comunitário e o compromisso com a diversidade, equidade e inclusão.
Todos esses resultados são apresentados trimestralmente, juntamente com os resultados financeiros. E a resposta é sim, a sustentabilidade é lucrativa. Além disso, há uma redução nos custos operacionais das empresas, que implementam tecnologias para reduzir seus custos. É uma questão de benefício tanto financeiro quanto ambiental e social.
Em que momento a agenda ESG se encontra?
Em relação à sustentabilidade, acredito que a maioria das pessoas está reconhecendo a importância disso. Há diferenças entre países em desenvolvimento e desenvolvidos, as agendas e prioridades são diferentes, mas a sustentabilidade é importante para todos. O que não podemos é nos acomodar com o estado atual das coisas. É preciso medir o progresso e estar atento ao greenwashing (falsa aparência de sustentabilidade). Além disso, é necessário mostrar casos concretos de sucesso, como empresas que adotaram estratégias sustentáveis e obtiveram resultados positivos.
Quando conversamos com indústrias, há sempre a reclamação de falta de mão de obra especializada. Essa é uma ‘dor’ que também afeta o setor de energia?
Sim, de fato não temos uma abundância de mão de obra qualificada. Há competências muito específicas, como no hidrogênio verde, onde é necessário um conhecimento aprofundado, por exemplo, em catalisadores. No entanto, o Brasil possui uma infraestrutura educacional bastante avançada, uma das melhores da região, sem dúvida. Entretanto, é preciso trazer mais quantidade de profissionais capacitados.
Sou um entusiasta desse tema, como promover ainda mais a participação das mulheres em áreas como tecnologia, matemática, engenharia, competências na área digital. Grandes empresas e governos têm programas para impulsionar esse progresso, tanto no nível mais avançado quanto na base da pirâmide, onde é fundamental formar mais pessoas para esse mercado de trabalho. Portanto, são necessários novos trabalhadores com espírito empreendedor para atender a essas necessidades. Acredito que isso não seja necessariamente um gargalo, pois conseguimos formar essa mão de obra.
Temos visto a entrada de empresas elétricas no mercado de crédito de carbono. Como vocês veem essa tendência? A Schneider tem interesse em comercializar esses créditos?
O mercado de crédito de carbono é uma oportunidade importante para promover a descarbonização e a sustentabilidade. Acreditamos que a competição no mercado é benéfica para todos, ao gerar eficiência e benefícios para os consumidores. Embora a Schneider Electric não esteja diretamente envolvida na geração de energia, estamos focados em tecnologias que promovam a eficiência energética e a transição para uma economia mais sustentável. Portanto, por enquanto não temos um interesse direto em comercializar créditos de carbono, mas reconhecemos a importância desse mercado como um catalisador para a adoção de práticas mais sustentáveis.
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