As normas de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade, o International Financial Reporting Standards (IFRS), foram lançadas globalmente no início deste mês, prometendo mudar como as companhias, principalmente as listadas na Bolsa de Valores do Brasil, a B3, reportam as suas informações da agenda ESG (sigla em inglês para meio ambiente, social e governança).
As normativas visam promover a integração entre os relatórios financeiros e de sustentabilidade. Com isso, a ideia é que, com o lançamento do IFRS 1, com foco em sustentabilidade, e do IFRS 2, voltado a divulgações relacionadas ao clima, as empresas passem a seguir um padrão.
Segundo especialistas, com a mudança, haveria o combate ao greenwashing (“lavagem verde”, em inglês), quando há falsas ações de sustentabilidade, que historicamente já aconteceram em relatórios de ESG justamente por não haver um padrão a ser seguido ou balizadores que norteassem os documentos, o que enfraquece a governança corporativa das empresas como consequência.
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Agora, a ideia é que seja possível comparar os mesmos dados e indicadores de diferentes empresas que atuam no mesmo setor, graças à criação de métricas quantitativas para o mercado de ESG. Com isso, os objetivos de sustentabilidade traçados pela empresa que tenham impacto financeiro precisam ser justificados no reporte financeiro.
Publicadas em junho deste ano, as normas entram em vigor no Brasil somente em janeiro de 2024. No entanto, o lançamento global em setembro era um dos tópicos mais aguardados pelos empresários ainda neste ano. “A ansiedade do mercado pelas normas era unânime. Todo mundo precisa de normas comparáveis e esse é um primeiro passo”, afirma a sócia da EY Brasil na área de sustentabilidade e mudanças climáticas, Ana Luci Grizzi.
A existência de métricas que tornassem os dados sustentáveis relatados pelas empresas comparáveis era uma antiga exigência do mercado, considerando que a agenda ESG tem se tornado cada vez mais um fator a ser considerado na tomada de decisão dos negócios.
“Apenas os números já não são mais suficientes para medir risco. A informação que agrega valor é importante para um stakeholder tomar uma decisão e para que ela seja mensurável é preciso que seja auditável. O IFRS é útil para que essa informação de sustentabilidade seja integrada com a informação contábil”, explica a vice-coordenadora de Relações Internacionais do Comitê Brasileiro de Pronunciamentos de Sustentabilidade (CBPS), Vania Borgerth.
Ela explica que a tendência é que as métricas sigam um caminho similar ao do que aconteceu com a contabilidade. “Anos atrás, as métricas diversas causavam confusão porque algumas empresas davam lucro pela regra de um país e prejuízo pela regra de outro, o que acabava dificultando a realização de acordos internacionais e forçando o surgimento de uma linguagem global.”
Qual o impacto do lançamento do IFRS?
Antes das normativas de caráter global, as companhias adotavam diferentes formas para a divulgação de relatórios de sustentabilidade — cada empresa reportava as informações que julgava importantes, criando uma dificuldade na hora de comparar empresas ou quantificar o avanço da agenda.
A preocupação com as normativas era uma demanda também das entidades internacionais. A IOSCO, que se tornou o principal fórum internacional para as autoridades reguladoras dos mercados de valores, já havia mencionado a necessidade de uma padronização para esse mercado.
“Na época, a IOSCO, inclusive, afirmou que, se houvesse o lançamento pelo ISSB, eles iam endossar e referendar as normas. O que foi feito rapidamente, inclusive, incentivando que todas as ‘CVMs’ do mundo sugerissem as normas para as empresas de seus países”, afirma Grizzi.
A especialista da EY destaca que a expectativa do mercado é que as normativas sejam referendadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no Brasil após serem traduzidas pelo Comitê Brasileiro de Pronunciamentos de Sustentabilidade (CBPS). A expectativa é que isso aconteça até o começo do próximo ano.
Embora a CVM deva coordenar, algumas empresas especulam que o Banco Central (BC) possa também referendar as normativas, o que faria com que não só empresas de capital aberto fizessem a adesão das normas, mas também os bancos e cooperativas.
Vale destacar que as normas não têm caráter obrigatório, mas são uma recomendação. A expectativa é que o órgão que coordenará a implementação do IFRS no Brasil conceda um período de adaptação à transição.
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