Indústria química pode revolucionar ESG com produtos mais sustentáveis, diz gerente da Basf

Responsável pela área de sustentabilidade da empresa, Caroline de Lima destaca que o setor, considerado um dos mais poluentes, tem avançado na agenda e se tornado cada vez mais exigente

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Foto do author Beatriz  Capirazi
Foto: Divulgação/ BASF
Entrevista comCaroline de LimaGerente de sustentabilidade para América do Sul da BASF

Considerada a base para toda a cadeia de produção da indústria e para a criação de produtos, a indústria química é tida como uma das mais poluentes do mundo. Especialistas dizem que os obstáculos do setor para se tornar mais sustentável não se resumem somente a química usada na confecção de produtos, mas também as altas quantidades necessárias para a produção.

Dentre os produtos usados pela indústria química estão as matérias-primas derivadas do petróleo e de gás natural. A grande dificuldade para o setor se adequar ao ESG, segundo especialistas, é o fato de que ainda não existem alternativas comercialmente viáveis para realizar a substituição por produtos mais sustentáveis.

Caroline de Lima, gerente de sustentabilidade para América do Sul da maior empresa da indústria química do mundo, a Basf, afirma que este cenário está mudando. “A química vem como uma revolução na agenda ESG”, diz, destacando que, embora muitos processos tenham de ser modificados, o setor está caminhando rumo à sustentabilidade.

gerente de sustentabilidade para América do Sul da BASF, Caroline de Lima.  Foto: Divulgação/BASF

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Quando os especialistas falam dos setores que têm maior dificuldade em entrar na agenda ESG, muitos deles citam a indústria química. Ele não é associado à sustentabilidade como outras áreas são. Você acredita que o setor carrega essa “má fama”?

É uma indústria, então já vem com essa pauta mais pesada. A indústria química trabalhou muito tempo a base de matérias-primas não renováveis, é esse o nosso dia a dia. Hoje, a gente também olha pra produtos sustentáveis dentro dessa cadeia, então estamos falando de uma mudança de base. Talvez no passado a gente não tivesse essa preocupação e agora é diferente. A gente está falando de ter produtos renováveis, que sejam regenerativos.

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A gente está no começo da cadeia. Eu sou fornecedora de uma gama de indústrias, então nós olhamos a sustentabilidade com um viés do futuro, trazendo as necessidades do cliente para o começo da cadeia. Para ter um cosmético mais sustentável, eu preciso da indústria química.

A indústria química vem como uma revolução na agenda ESG. A gente, como indústria química, consegue revolucionar, tanto em matéria-prima, quanto na questão de economia circular. Só conseguimos transformar o plástico em uma nova embalagem com a química. O nosso setor ajuda a ter produtos mais sustentáveis e a criar uma conexão com o futuro.

Conseguimos quantificar esses avanços para entender se os produtos da Basf, por exemplo, hoje são mais ou menos poluentes?

Eu te diria que a gente tá em mais de 75% de 100% (em grau de sustentabilidade). Globalmente, a Basf tem mais de 60 mil produtos químicos. A gente tem quatro classificações para os nossos produtos. Eu tô dizendo que destes, 45 mil são categorizados de acordo com critérios de sustentabilidade.

Os produtos que estão classificados como menos sustentáveis, deixando claro que eles atingem todos os parâmetros de legislação, é um produto menos sustentável quando a gente compara com essas três outras classificações. O que a gente faz com esse produto? Ele volta para a área de pesquisa e desenvolvimento. Aqui a gente toma uma decisão: ou a gente atribui para ele mais insumos para que ele seja mais sustentável ou em cinco anos ele sai do portfólio da Basf.

Eu trouxe esse exemplo para exemplificar que, sim, está acontecendo uma mudança na indústria e ela está cada vez mais forte. Estamos olhando para isso com cada vez mais cuidado nesse sentido.

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Você mencionou que 45 mil são categorizados como sustentáveis. Os 15 mil restantes do total de 60 mil produtos da Basf não estão nessa escala de quatro classificações?

Eles ainda estão sendo avaliados para serem classificados. A gente começou essa avaliação e até o momento somente 45 mil foram classificados do total de produtos da Basf. Eles não tem classificação, na verdade.

Estes que não foram avaliados ainda são poluentes?

Difícil responder essa pergunta porque são muitos critérios que entram aí. Critérios, inclusive, de manuseio de segurança. Mas eu diria que diante dos atributos que a gente usa para considerar um produto mais sustentável, obviamente ele não tem 100% dos atributos e é por isso que ele é revisitado para entender se é possível transformá-lo com mais atributos de sustentabilidade.

Para mim isso exemplifica essa mudança da indústria química. Ok, entendemos que a gente é de uma indústria, mas estamos olhando para isso com muito critério. Aqui na ponta eu tenho as indústrias me pedindo e do outro lado consumidores, que querem produtos sustentáveis, sem trabalho análogo a escravidão, trabalho infantil.

Falando de sustentabilidade na indústria química, você acredita que essa é uma preocupação da Basf ou do setor como um todo?

Somos uma indústria que trabalha sustentabilidade desde sempre. A economia circular é existente desde a concepção da nossa empresa. A agenda ESG ganhou força e impulsionou, mas essa concepção é das Américas. Se você perguntar para um funcionário Basf na Europa ele não tem esse conceito, porque veio de Dow Jones.

A indústria vem nesse movimento. Não vou te responder por outras indústrias, mas por cadeia. A Abiquim está trabalhando pontos, trazendo mudanças climáticas e como a indústria química ajuda nesse sentido. A Basf sempre teve isso por estar na Europa e ter de atender legislações de lá, mas podemos dizer que a gente vem nessa onda de sustentabilidade no ramo químico.

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Caroline de Lima destaca que o setor, considerado um dos mais poluentes atualmente, tem registrado avançados para alcançar graus maiores de sustentabilidade  Foto: Christian Hartmann/Reuters

Em relação a este ponto do mercado internacional, alguns especialistas destacam que as companhias hoje líderes em ESG no Brasil são aquelas que são grandes empresas multinacionais ou transnacionais. Você acredita que, no Brasil, as boas práticas são derivadas das que já são feitas em outros países?

Quando a gente fala de multinacional, a gente fala de uma indústria que tem diretrizes mais bem definidas, porque temos metas globais. Mas acho que é importante ressaltar que estas empresas regionalizam.

Quando a gente traz para o âmbito de regionalização aqui na América do Sul, a gente sempre considera os aspectos aqui da região. Temos uma matriz mais limpa, mas temos um desafio logístico, só que o tamanho do Brasil é maior do que a junção de muitos países em outras regiões.

Ainda temos muito a desenvolver, principalmente porque estamos falando de países em desenvolvimento, mas essa movimentação já está acontecendo. Você vê indústrias nacionais já definidas. O que puxa isso? O consumidor final. Estamos cada vez mais exigentes e com isso nós fazemos a movimentação também da indústria.

Especialistas consultados pelo Estadão destacam que há uma dificuldade muito grande do setor em fazer produtos mais sustentáveis, principalmente pela volumetria que é utilizada. Como vocês enxergam esse ponto?

Nesse sentido também olhamos cada vez mais para isso. A tecnologia e a inovação tem que estar juntas com sustentabilidade e é nisso que conseguimos avançar. Como fica o volume? É com a inovação que conseguimos reduzir a quantidade.

Nós já temos os drones nos ajudando na aplicação de produtos, onde a gente tem cada vez quantidades menores porque a gente vai atuar onde tem o desafio. Onde não precisa, nós não vamos mais atuar. Acredito sim que a gente tem a tecnologia e a inovação a nosso favor. Nesse sentido, essa agenda só está começando e tem muito o que avançar.

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O setor faz uso de carbono, matérias-primas derivadas do petróleo, de gás natural. Entendo que a tecnologia pode ser uma aliada a longo prazo para zerar as emissões, mas hoje existem alternativas que sejam comercialmente viáveis para substituir por recursos mais sustentáveis?

Nessa jornada de produtos mais sustentáveis, obviamente quando falamos de um produto de matéria-prima fóssil, nós podemos ter um acréscimo no valor final desse produto. E a gente vai ter situações onde a gente tem o cliente disposto a pagar mais por entender que ele traz benefícios no final. Pode ser, inclusive, que esse produto traga uma redução na linha de produção da empresa.

Quando a gente tá falando de ESG, estamos falando do âmbito econômico. Acho que estamos nesse momento, olhando para esse portfólio e entender o que o produto sustentável me traz de economia, pode ser que ele me traga na circularidade uma nova linha de produtos.

Quando você me pergunta: “Você acha que o cliente investiria num produto sustentável, se o custo for mais alto?”. Muitas vezes, sim, outras vezes, não. Depende do contexto que a gente tá falando e da aplicação deste produto.

Nesse sentido, o setor que ele faz parte também influencia?

Com certeza. Quando a gente olha para os segmentos, a maturidade do nível de sustentabilidade se diferenciam, muito puxado pelo consumidor. Estamos olhando para setores muito mais à frente do que outros, mas acredito que esse caminho não tem volta.

A gente não vai voltar a fazer o que a gente fazia, poluente como a gente era. Daqui em diante é só só a visão para frente de cada vez mais ter produtos nesse sentido.

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Como a indústria está atuando hoje para ser menos poluente? Quais são as atitudes práticas?

A Suvinil, por exemplo, reduziu a quantidade de ingredientes para fazer tintas de 25 para 15, diminuindo 60% da pegada de carbono na produção da empresa. A gente tem exemplo de uso de produto químico para a lavagem de equipamentos e redução de energia, porque a lavagem passa a ser a frio.

Em quanto tempo todo este cenário de sustentabilidade que você mencionou deve se tornar real? A gente pode falar talvez em 20 anos, 30 anos?

Para uma mudança expressiva? Não vou arriscar porque depois sai a notícia e os experts vão me matar, né? Para energia, a expectativa é 2030, que vai de acordo com a meta COP.

Se a gente está falando que uma indústria química vai zerar a emissão de carbono em 2050, estamos com a expectativa que a tecnologia avance para que essa mudança seja possível. Precisamos lembrar que estamos falando de mudança de processo, de tecnologia e da gama de fornecedores se olharmos a cadeia como um todo.

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