O site de varejo Mercado Livre divulgou a edição do Relatório de Transparência de Dados referente ao segundo semestre de 2022. De acordo com o documento, ao qual o Estadão teve acesso, o Brasil é o mercado que mais exige a gestão dos dados dos usuários na plataforma em relação aos 18 países latino-americanos em que a empresa opera - de forma desproporcional à quantidade de vendas. A situação configura um desafio para a governança da companhia.
De acordo com o marketplace, os brasileiros respondem por 55% das vendas do Mercado Livre. Ainda assim, dentre os pedidos para exercer os direitos ARCO (Acesso, Retificação, Cancelamento e Oposição), 67% são do Brasil. Os direitos ARCO são previstos na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), para que os usuários de plataformas online possam controlar o que os site obtém deles, com as possibilidades de saber quais informações são obtidas, corrigir as que estiverem erradas, cancelar operações que não estiverem de acordo e se opor a tratamentos dos dados que não sejam autorizados previamente.
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No total, foram 73 mil pedidos de brasileiros para exercer esses direitos no Mercado Livre, ou cerca de dois terços do total, enquanto os outros países onde a companhia opera respondem pelos 33% restantes. A própria existência da LGPD é considerada um fator importante para a atenção dada à situação.
“Desde o início, o Brasil foi um país de destaque, supomos que pela novidade da lei e da Autoridade Nacional de Proteção de Dados. Também é um assunto muito tratado na mídia. Há uma conscientização dos usuários brasileiros em relação a ter seus direitos protegidos”, considera Ricardo Lagreca, diretor Jurídico sênior do Mercado Livre. Segundo ele, a pandemia também teria tido um efeito em trazer atenção ao tema, devido ao maior acesso às plataformas digitais. “É um tema que é novidade, todo mundo quer entender, saber, se proteger.”
Países como Chile e Argentina também têm leis de proteção de dados, mas são mais antigas (1999 e 2000, respectivamente) e foram aplicadas à internet, o que fez com que o efeito novidade não existisse. Contudo, o Mercado Livre afirmou que aplica o padrão brasileiro, considerado mais rígido, mesmo em países com legislação diferente.
Outra razão, contudo, seria a arquitetura do próprio site, que facilitaria a autogestão por meio da plataforma. “O usuário vê, vai lá e tem uma facilidade de acesso, com comunicação clara. Também tem o interesse dos usuários brasileiros”, reforça o diretor jurídico da empresa. Para ele, a tendência é de que a exigência continue em alta, conforme mais brasileiros forem aderindo à internet e comecem a comprar digitalmente.
Relatório
O relatório está na quarta edição e busca trazer confiança para os usuários. “Ninguém vai comprar se não acreditar que é uma plataforma segura, ninguém vai se cadastrar para vender”, explica Lagreca. Por isso, apesar da prática da publicação não estar prevista em lei, é adotada pela organização. Os efeitos seriam os de prestar contas e buscar uma melhora constante nos indicadores.
Entre os quesitos avaliados, estão questões como os anúncios retirados do ar por serem produtos falsos, os que violam os termos e condições da empresa e os pedidos de informações feitos por autoridades.
De acordo com a publicação, 2,3 milhões de anúncios foram detectados e removidos devido à violação aos termos e condições de uso da plataforma do Mercado Livre — sendo 889 mil no Brasil. Desse mesmo total, pouco mais de 36 mil publicações foram denunciadas na região por meio do botão de denúncia presente nos anúncios. Dos conteúdos que acabaram removidos, 98% foram detectados pelas equipes de prevenção a fraudes e por sistemas do Mercado Livre, que utilizam tecnologias baseadas em inteligência artificial e machine learning. Os 2% restantes são denúncias de usuários ou autoridades.
De janeiro a junho, as autoridades latino-americanas fizeram mais de 19 mil solicitações de informações de usuários ou transações. O Mercado Livre considera que 95% desses pedidos foram respondidos adequadamente, enquanto os outros 5% foram solicitações incorretas ou informações que a plataforma não possui. Em relação aos direitos intelectuais, a plataforma detectou 1,2 milhão, das quais 300 mil violações acabaram se confirmando.
Para Lagreca, os números mostram uma tendência positiva. “São menos de 1% de anúncios removidos e esse número vem baixando. O relatório mostra como a tendência é de baixar cada vez mais”, celebra, citando um investimento na casa de US$ 100 milhões (R$ 522 milhões) para utilizar a tecnologia de inteligência artificial, que estaria trazendo os resultados esperados.
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