BRASÍLIA- As novas regras do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) têm o potencial de revolucionar o mercado de “vales” com maior aceitação dos cartões de alimentação nos estabelecimentos e custo mais baixo para os restaurantes e mercados, defende o secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Marcos Barbosa Pinto, em entrevista ao Broadcast/Estadão.
Para ver essa revolução na prática, contudo, a Fazenda vai ter de barrar iniciativas do Congresso para reverter as principais mudanças da legislação aprovada em setembro de 2022: a interoperabilidade e a portabilidade.
O assunto voltou ao Parlamento pelas mãos do próprio governo, que não teve tempo de regulamentar a lei antes do prazo final de maio deste ano e precisou enviar uma Medida Provisória (MP) para ganhar um ano a mais para finalizar as regras. O texto vem sendo alvo de diversas emendas.
Com a lei atual, todas as bandeiras de vale-alimentação e refeição poderão ser usadas nos estabelecimentos que aceitarem o benefício como forma de pagamento, aumentando o rol de acesso, o que é chamado de interoperabilidade. Além disso, será permitida a portabilidade: o trabalhador poderá optar por trocar o cartão concedido por sua empresa por outro de sua preferência, como já acontece, por exemplo, com a conta-salário.
”Consideramos as mudanças bem importantes e estamos trabalhando para regulamentar. Achamos que o PAT vai passar por uma transformação muito parecida com a que o mercado de cartões de crédito passou no Brasil quando foi determinado pelos órgãos de defesa de concorrência a interoperabilidade dos arranjos de pagamento”, disse Barbosa Pinto.
Antes da abertura do mercado de cartões, cada “maquininha” só trabalhava com uma bandeira, aumentando o custo para o lojista que desejasse aceitar todas. A mudança gerou o “boom” das maquininhas. “Quando se permitiu o credenciamento livre e a interoperabilidade entre as credenciadoras, caiu muito o custo da operação para o lojista. Hoje, no mercado de vale refeição e alimentação, é uma situação parecida: custo elevado para o lojista e arranjos fechados predominando no mercado”, explicou.
“O arranjo é sub-ótimo de várias maneiras. O trabalhador tem a restrição de não conseguir comprar o produto no estabelecimento que quer. O lojista acaba pagando mais em termos de taxas de desconto. E isso causa um aumento de preços.
”Criado em 1976, o PAT tem o objetivo de melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores, dando incentivos para que as empresas empregadoras forneçam valores à alimentação aos funcionários. Hoje, o mercado é concentrado em poucas empresas, sendo as mais conhecidas VR, Sodexo, Ticket e Alelo.
No Congresso, na última semana, foi criada a comissão mista para analisar a MP, com relatoria do senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR). O plano de ação envolve audiências públicas antes da apresentação do parecer. A MP vence no início de setembro. Até o momento, há 33 emendas ao projeto, sendo que oito delas revogam a possibilidade de portabilidade ou interoperabilidade. Outras tratam de tributação, prazos e a possibilidade de saque do benefício, dispositivo que foi vetado à época da sanção pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.
Outro destaque versa sobre um assunto que traz dúvidas ao mercado: a regulamentação. O deputado capitão Alberto Neto (PL-AM) quer que a regulamentação seja realizada pelo Banco Central. Em janeiro, porém, o BC reafirmou que não tem competência para tratar de benefícios. No mercado, por sua vez, há uma leitura de que a autoridade monetária seria um regulador natural, porque já tem conhecimento sobre portabilidade. A lei aprovada no ano passado diz que a regulação sobre portabilidade será definida em ato do Poder Executivo, lembra o secretário.
”O mais provável é que essa regulação seja dividida dentro do governo, com os aspectos mais ligados à área trabalhista acumulados pelo Ministério do Trabalho. E que a área econômica regule os aspectos dos arranjos de pagamento”, diz Marcos Barbosa, sem dar mais detalhes de que órgão seria apontado como regulador. Ele disse que pode ser uma decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN). “Isso ainda está em discussão.”
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