Governo divulga propaganda para rebater críticas ao BNDES; economistas veem ‘desinformação’

Publicação da Secretaria de Comunicação Social da Presidência diz que ‘não há risco de prejuízo nas operações do banco de fomento; economistas discordam

PUBLICIDADE

Publicidade
Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:
Correção:

BRASÍLIA – Depois das críticas do mercado às declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na Argentina, de que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) vai voltar a financiar projetos de empresas brasileiras no exterior para “ajudar países vizinhos a crescer”, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência publicou nas redes sociais que “não há risco de prejuízo” nos financiamentos do banco de fomento. Economistas ouvidos pelo Estadão, porém, discordam e avaliam que a publicação traz “desinformação”.

Segundo a secretaria, “os acordos do BNDES têm garantias, seguro e há uma larga tradição de receber o que emprestou”, diz o perfil no Twitter. A publicação destaca ainda que o banco só financia empresas brasileiras, ainda que para exportação de produtos.

PUBLICIDADE

“Risco sempre há”, avalia o economista-chefe da XP, Caio Megale. “Quem garante essas operações, na maioria das vezes, é o Fundo Garantidor de Exportação, que está lá no Tesouro Nacional. Se a empresa não pagar, o Tesouro paga. Pode não ter risco para o BNDES, mas tem para o País, para as contas públicas”, explica.

Ela considera que a comunicação do governo foi equivocada, porque gera “desinformação” em vez de esclarecer o funcionamento das operações. “O correto seria dizer que as operações têm garantias, o que diminui o risco; mas não dá para dizer que não tem risco. Não só tem risco como não funcionou no passado. Há operações dessas no exterior que não foram pagas ainda”, diz Megale.

Publicidade

Como mostrou o Estadão, desde fins da década de 1990, o BNDES liberou US$ 10,5 bilhões para financiar 86 obras tocadas por construtoras brasileiras em 15 países. Angola foi o país que mais recebeu empréstimos – e já pagou tudo de volta. A Argentina foi o segundo país que mais recebeu – e ainda tem uma parcela final de US$ 29 milhões para pagar de volta. Muitas dessas obras no exterior foram envolvidas em escândalos de corrupção.

Na última segunda-feira, 23, Lula defendeu o financiamento da obra de um gasoduto para transportar gás natural produzido no campo de Vaca Muerta, localizado na Província de Neuquén, a oeste da região da Patagônia, até o Brasil. O presidente disse que os empresários brasileiros têm interesse no gasoduto Néstor Kirchner, assim como nos fertilizantes.

“Será que isso é uma prioridade diante das restrições fiscais que o País tem?”, questiona José Márcio Camargo, professor da PUC-Rio e economista-chefe da Genial Investimentos, que também destaca os problemas que o modelo enfrentou no passado.

André Perfeito, economista-chefe da Necton, também avalia como o governo incorreto dizer que esse tipo de financiamento não tem riscos. “Qualquer operação que acontece ao longo do tempo embute riscos. É incorreto dizer isso. Não existe nada sem risco e esse tipo de comunicação do governo atrapalha e gera ainda mais desconfianças a uma atividade que é legítima”, avalia.

Publicidade

O economista defende, porém, que não é preciso “demonizar” o financiamento de obras de empresas brasileiras no exterior, que podem representar uma oportunidade. “É uma prática normal em qualquer tipo de negócio e que não deve ser demonizada, pois é utilizada em vários países. Ajuda a nossa paleta de serviços e comércio, porque, no fundo, é o Brasil ajudando a financiar a compra de produtos”, diz Perfeito. “Agora, é preciso aprimorar parâmetros de controle e fiscalização, que falharam miseravelmente no passado”, pontua.

Correções

Diferentemente do que foi publicado às 7h, a reportagem entrevistou o economista José Márcio Camargo, e não o economista José Roberto Afonso.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.