BRASÍLIA - O governo federal apresentou nesta terça-feira, 18, o projeto de lei que prevê a isenção de Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil por mês. A proposta prevê a compensação das perdas de receitas com a exigência de pagamento de uma alíquota mínima de IR pelos contribuintes classificados como “super-ricos” pela Receita Federal.
O evento, no Palácio do Planalto, contou com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e é uma das principais apostas do governo para tentar reverter a perda de popularidade de Lula neste mandato. Em novembro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já havia anunciado as linhas gerais da proposta em rede nacional, mas só nesta terça ela foi oficialmente apresentada e detalhada.
Pelas projeções do governo, cerca de 65% dos contribuintes de Imposto de Renda deixarão de pagar o tributo. A nova medida isentará mais 10 milhões de pessoas.
Na prática, o País passará a ter quatro grandes grupos de tributação:
- Contribuintes com rendimentos de até R$ 5 mil: isentos de IR.
- Contribuintes com renda entre R$ 5 mil e R$ 7 mil: mantém as faixas atuais de tributação, mas, no valor entre R$ 5.000,01 e R$ 7 mil, ganha um crédito que diminui o IR a ser pago.
- Contribuintes com rendimentos acima de R$ 7 mil: permanecem com as regras atuais.
- Contribuintes com rendimentos acima de R$ 50 mil por mês (R$ 600 mil por ano) deverão pagar uma cobrança extra. A alíquota é crescente até chegar a 10% (para quem tem ganhos acima de R$ 100 mil por mês (R$ 1,2 milhão por ano). Segundo o Ministério da Fazenda, a medida atinge 141 mil contribuintes.
Nada muda para quem ganha entre R$ 7 mil e R$ 50 mil por mês
A isenção de Imposto de Renda até R$ 5 mil entrará em vigor em 2026. Contribuintes que ganham entre R$ 5.001 e R$ 7 mil manterão as faixas de tributação atuais até R$ 5 mil, mas ganharão um crédito sobre o que exceder esse valor, o que, na prática, diminuirá o imposto pago. A tabela abaixo mostra simulações sobre essas faixas de renda.
Para quem ganha mais de R$ 7 mil, não haverá alterações, e a isenção de IR continuará como no modelo atual, até dois salários mínimos. Esse foi o mecanismo encontrado pelo Ministério da Fazenda para limitar as perdas de arrecadação com a proposta.
A previsão de renúncia de receitas é de R$ 25,85 bilhões para 2026. Essa perda será compensada com a exigência de pagamento de um imposto de renda mínimo de quem ganha acima de R$ 50 mil por mês (R$ 600 mil por ano). A alíquota sobre os mais ricos será crescente e, para quem recebe R$ 100 mil por mês (R$ 1,2 milhão por ano), alcançará 10%.
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A compensação fará com que o governo arrecade, segundo as estimativas da Receita, R$ 34,12 bilhões no próximo ano. Esse valor mais elevado em relação à perda prevista (R$ 25,85 bilhões), segundo a equipe econômica, servirá para repor também a renúncia de 2025 — a isenção do IR para dois salários mínimos custará R$ 5 bilhões.
Mais ricos terão que pagar ‘imposto mínimo’ de até 10%
Quem ganha mais de R$ 50 mil por mês será obrigado a pagar uma alíquota efetiva mínima de imposto. Ela começará a partir de zero e chegará a 10% para faixas de renda de R$ 100 mil por mês ou R$ 1,2 milhão por ano ou mais. A Receita classifica estes contribuintes como “super-ricos”.
A equipe econômica afirma que há cerca de 300 mil contribuintes nesta faixa de renda mais alta (acima de R$ 1 milhão/ano), mas estima que 141 mil contribuintes pagam menos IR do que deveriam pagar e, por isso, deverão ser atingidos pelas mudanças.
Para verificar a tributação sobre este grupo, a Receita vai computar toda a renda da pessoa física: salários, receitas com aluguéis, pensões, lucros e dividendos, entre outras receitas.
Três tipos de renda serão desconsiderados para o cálculo da renda total do contribuinte: recebimento de herança; ganhos de capital, como a venda de um imóvel; e também os rendimentos recebidos acumuladamente, como ações na justiça ou indenizações trabalhistas.
Depois, será calculado o imposto efetivo que esse contribuinte paga atualmente. Se o percentual for menor do que a alíquota mínima prevista para a sua faixa de renda, ele pagará a diferença. Se for maior, ele não pagará mais imposto.
Para calcular a alíquota incidente sobre essa parcela da população, serão descontadas rendas que têm isenção prevista em lei, como é o caso de rendimentos obtidos na poupança, em títulos e valores mobiliários, como LCIs e LCAs, aposentadorias e pensões por doenças graves e indenizações judiciais e trabalhistas.
O intuito da Fazenda é fazer com que esses contribuintes paguem um mínimo que pode chegar a 10% de IR (para quem ganha R$ 100 mil por mês ou mais). O argumento da equipe econômica é que a alíquota efetiva desses contribuintes é baixa — em média de 2,5%. Com as mudanças, segundo a Receita, a estimativa é que a alíquota efetiva de IR média dos mais ricos suba para 9%. Como comparação, a alíquota de IR efetiva sobre os rendimentos de um policial é de 9,8% e de 9,6% sobre os rendimentos de um professor de ensino médio.
Um trabalhador CLT que ganha R$ 60 mil por mês, por exemplo, tem alíquota efetiva de 25,74%, sem considerar as opções de abatimento. Ou seja, ele não seria atingido pelo novo tributo.
Dividendos acima de R$ 50 mil por mês serão tributados na fonte
O projeto do governo traz como novidade a tributação sobre dividendos, que terão a incidência de uma alíquota fixa de IR sobre valores que excedam R$ 50 mil por mês por empresa. Isso vale também para investidores não residentes no País.
A tributação ocorrerá na fonte e começará a vigorar em 2026, para compensar a renúncia fiscal do ano. O valor de R$ 50 mil será calculado por empresa. No caso de investidores que recebem dividendos de diferentes companhias, para ser tributado, tem que receber mais de R$ 50 mil por mês por empresa.
A Receita Federal devolverá os valores retidos caso o contribuinte não seja enquadrado como mais rico no ajuste da declaração do IR, no ano seguinte. Ou se ele for enquadrado como mais rico, mas tenha pagado o imposto mínimo de IR estipulado para a sua faixa de renda.
A tributação incidente sobre os dividendos também será devolvida caso a empresa que distribuiu os dividendos tenha recolhido o Imposto de Renda sem abatimentos, ou seja, na alíquota nominal de 34% (para a maioria dos setores), 40% (seguradoras) e 45% (instituições financeiras).
O Ministério da Fazenda argumenta que o intuito não é tributar os dividendos, mas considerar esses valores como parte da renda dos sócios e investidores na hora de tributá-los. Se eles forem enquadrados como mais ricos, mas estiverem pagando o IR mínimo, não haverá tributação sobre os dividendos.
O argumento contrário à tributação dos dividendos sempre foi o de que as empresas são excessivamente tributadas e, caso fossem tributados os dividendos, haveria uma espécie de bitributação. Esse argumento bloqueou a tributação em tentativas recentes de reforma do IR, como a do governo Jair Bolsonaro.
Para se desviar desse argumento, a Fazenda afirma que, caso a empresa já tenha pagado o IR, a pessoa física não precisará pagá-lo. Para tanto, será feito um cálculo em que se soma a alíquota efetiva de IR da pessoa física e a da pessoa jurídica. Se os porcentuais superarem 34% (para a maioria dos segmentos), 40% (seguradoras) e 45% (instituições financeiras), o excedente será devolvido na restituição do Imposto de Renda.
Esse excedente funcionará como um redutor do IR para os contribuintes de alta renda que serão atingidos pelo imposto mínimo.
O governo estima que serão poucos os sócios de empresas do Simples atingidos pela tributação de dividendos, que recairá principalmente sobre os mais ricos que são sócios ou investidores de empresas do regime do lucro presumido.
No caso das empresas que recolhem impostos pelo lucro real (caso das maiores empresas do País), a avaliação inicial é a de que elas já repassam parte dos lucros aos acionistas por meio de JCP (juros sobre capital próprio), cuja alíquota é considerada mais elevada (15%) e por isso poderá ajudar a reduzir o imposto mínimo sobre os mais ricos.