Governo precisa reforçar caixa para fechar Orçamento de 2024; veja quais medidas estão em discussão

Lei orçamentária do próximo ano, que tem de ser enviada até dia 31, irá prever equilíbrio entre receitas e despesas para zerar rombo das contas públicas; propostas sofrem resistência no Congresso

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BRASÍLIA - O governo corre contra o tempo para terminar de apresentar até quinta-feira uma série de medidas para reforçar os cofres públicos, de modo que possam “entrar na conta” do Orçamento de 2024.

Isso porque o projeto de lei orçamentária do próximo ano, que tem de ser enviado para o Congresso até dia 31, irá prever equilíbrio entre receitas e despesas, como reforçou nesta segunda-feira o ministro da Fazenda, Fernando Haddad - que se comprometeu com a meta de zerar o rombo das contas públicas em 2024. Mas, para isso, o governo terá de aumentar a arrecadação.

Haddad reforçou compromisso com meta de zerar déficit das contas do governo em 2024. Foto: Wilton Junior/Estadão

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Para estimar as receitas no projeto de Orçamento, o governo não precisa contar com medidas já aprovadas; basta que o projeto de lei ou a medida provisória já estejam tramitando no Congresso.

Na segunda-feira, o governo engatou a marcha e enviou duas propostas que apertam a tributação dos investimentos da parcela mais rica da população: mudanças na taxação de fundos exclusivos e fundos offshore. As medidas, que foram apelidadas por parlamentares de “Robin Hood” pelo foco nos chamados “super-ricos”, se somam a outras que já tramitam no Congresso, como a taxação das apostas esportivas e a mudança no voto de desempate da Receita Federal no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf).

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O governo pisa em ovos para conseguir aprovar essas medidas tributárias, que enfrentam resistências de deputados e senadores. Antes de enviar os projetos, representantes do Ministério da Fazenda fizeram várias consultas a representantes do mercado financeiro para calibrar o aperto e viabilizar a aprovação.

Novas medidas ainda devem ser anunciadas, sinalizou Haddad nesta segunda-feira. Como mostrou o Estadão, o Ministério da Fazenda avalia, por exemplo, mudar a forma de tributação dos chamados Juros Sobre Capital Próprio (JCP). Veja a seguir as medidas arrecadatórias na mira do governo conta para reforçar o caixa do próximo ano:

Fundos exclusivos

O governo editou uma medida provisória (MP) que muda a tributação dos chamados fundos exclusivos, também conhecidos como fundos dos “super-ricos”. Eles são chamados de exclusivos por serem fechados e terem apenas um cotista, diferentemente dos fundos tradicionais do mercado, abertos a diversos cotistas.

Essa modalidade prevê um portfólio muito mais personalizado e é direcionada a investidores com patrimônio elevado. Exigem investimento mínimo de R$ 10 milhões, com custo de manutenção de até R$ 150 mil por ano.

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A MP determina cobrança de 15% a 20% sobre os rendimentos desses fundos, que será realizada duas vezes ao ano, no sistema chamado de “come-cotas”, como ocorre com os fundos tradicionais no mercado. Isso porque, hoje, a tributação dos fundos exclusivos é realizada apenas no resgate do investimento. Há 2,5 mil brasileiros com recursos aplicados nesses fundos, que acumulam R$ 756,8 bilhões de patrimônio.

O investidor que optar por iniciar o pagamento em 2023 será tributado com uma alíquota menor, de 10%. A previsão do governo é arrecadar R$ 24 bilhões entre 2023 e 2026.

Por ser uma MP, a proposta tem vigência imediata e precisa ser aprovada em um prazo de 120 dias - caso contrário, perde a validade. Como mostrou o Estadão, na Câmara, o plano é incorporar o conteúdo da MP no projeto de lei sobre a taxação dos fundos offshore (veja abaixo).

Fundos offshore

O governo enviou um projeto de lei que prevê a tributação anual de investimentos no exterior, os chamados fundos offshore, com alíquotas progressivas de 0% a 22,5%. Atualmente, o capital investido no exterior é tributado apenas quando resgatado e remetido ao Brasil.

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Boa parte desses investimentos está aplicada em países considerados paraísos fiscais, que praticam baixa ou nenhuma tributação para facilitar a aplicação do capital estrangeiro.

O projeto prevê a possibilidade de o contribuinte atualizar o valor de seus bens e direitos no exterior ainda neste ano e tributar o ganho de capital pela alíquota de 10%, em lugar dos 15% previstos na legislação vigente.

Dados do Ministério da Fazenda apontam que investidores pessoas físicas têm mais de R$ 1 trilhão em ativos no exterior. A proposta, segundo a pasta, tem potencial de arrecadação da ordem de R$ 7 bilhões em 2024, R$ 6,7 bilhões em 2025 e R$ 7,1 bilhões para 2026.

O entendimento de Arthur Lira (PP-AL) e de líderes da Câmara, porém, é de que a taxação para a atualização dos ativos que já estão aplicados também deverá ser reduzida, tanto de fundos offshore como exclusivos, dos 10% propostos pela equipe econômica para 6%, como defendem os parlamentares.

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Carf

O governo deseja aprovar o projeto que restabelece o voto de desempate da Receita Federal no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) nesta quarta-feira, 30, no plenário do Senado. Ainda que a aprovação não seja necessária para que a medida seja estimada no Orçamento, ela serviria, segundo governistas, para amenizar o ceticismo do mercado com a meta da Fazenda de zerar o déficit das contas públicas no ano que vem. A equipe de Haddad afirma que a medida responderá, sozinha, por um terço do esforço de arrecadação necessário em 2024.

O Carf é o tribunal administrativo onde é possível recorrer de autuações da Receita Federal. O projeto institui o chamado “voto de qualidade”, espécie de voto de minerva a favor da Receita em casos de empate. Ele altera a legislação atual, aprovada em 2020, que dá vantagem ao contribuinte.

O argumento do governo é que a medida fez despencar a arrecadação nas disputas que são levadas por grandes empresas ao tribunal. O texto ainda perdoa multas e juros dos contribuintes que reconhecerem o débito.

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O relator, o senador Otto Alencar (PSD-BA), disse que manteve o mesmo texto aprovado na Câmara e crê que não haverá alterações no Senado. “Aprovando o Carf agora, é possível o governo arrecadar de R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões ainda neste ano”, afirma Alencar. “Digo isso porque, só na vigência da MP do Carf (que durou quatro meses e expirou em junho), as empresas tiveram que recolher R$ 16 bilhões”, disse.

Apostas esportivas

A proposta do governo para taxar as apostas esportivas online foi anunciada em julho. Pelas novas regras, uma empresa só poderá atuar no Brasil se for credenciada junto ao governo federal. Para isso, terá de pagar outorga à União, ter sede no País e capital mínimo de R$ 100 mil.

A taxação das empresas será de 18% sobre o GGR (gross gaming revenue, na sigla em inglês) – ou seja, sobre a receita obtida com os jogos, subtraídos os prêmios pagos. Já os apostadores pagarão uma alíquota de 30% de Imposto de Renda sobre o prêmio, mas com isenção para valores até R$ 2.112.

Apostadores pagarão uma alíquota de 30% de Imposto de Renda sobre o prêmio. Foto: Felipe Rau / Estadão

A proposta também prevê uma série de regras para impedir ilegalidades no setor, como, por exemplo, a proibição para que jogadores, árbitros, dirigentes e menores de 18 anos realizem apostas.

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Como mostrou o Estadão, foi feito um acordo para que a proposta fosse fatiada em uma MP e em um projeto de lei. A tendência, porém, a contragosto da Fazenda, é que o texto da MP, focado na taxação, seja incorporado ao projeto de lei, que aborda a estrutura e processos administrativos para fiscalização.

Nesta terça-feira, Lira falou que o projeto deve ser votado na próxima semana. O relator é o deputado Adolfo Viana (PSDB-BA). Por tramitar em regime de urgência, a partir de 9 de setembro, ele passa a trancar a pauta da Câmara.

Para 2024, a Fazenda estima uma arrecadação de R$ 2 bilhões com a nova cobrança, mas prevê que o montante possa chegar a R$ 12 bilhões em um mercado totalmente regulado.

Juros sobre capital próprio

A equipe econômica avalia mudar a forma de tributação dos chamados Juros Sobre Capital Próprio (JCP) em vez de acabar de fato com esse instrumento de remuneração dos acionistas das empresas.

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O JCP é um instrumento usado por grandes empresas que permite que a remuneração (distribuição de lucros) aos acionistas seja enquadrada como despesa - e, assim, abatida do Imposto de Renda.

Dessa forma, o pagamento de JCP estimula o uso de capital próprio das empresas em vez de buscarem empréstimos, ao rebaixar o custo do uso de recursos do acionista em projetos de investimento.

A Receita Federal pode mudar o critério de dedução do JCP da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL). Com a mudança do critério de dedução, aumenta a alíquota efetiva do imposto a pagar e sua arrecadação.

O foco do governo é atacar o planejamento tributário agressivo feito por empresas de grande porte da chamada economia real para não pagar o Imposto de Renda. A ideia inicial do governo era acabar com o JCP, mas a medida sofre muita resistência.

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