A disparada do dólar, que subiu 27% em relação ao real em 2024, ampliou a cautela da chinesa Gree no Brasil. Maior fabricante de aparelhos de ar-condicionado do mundo e há 25 anos produzindo esses equipamentos em Manaus (AM), a companhia projeta um crescimento de vendas para 2025 ainda robusto, na casa de dois dígitos, porém menor que o registrado ano passado. Também prepara para este mês de janeiro um reajuste de preço de 5% para os aparelhos de ar-condicionado, por conta da alta de custos dos kits importados, usados na montagem dos equipamentos.
“Economia e clima têm de andar juntos”, afirmou ao Estadão o gerente executivo de vendas da empresa no Brasil, Carlos Murano. Essa coordenação entre a economia e o tempo ocorreu em 2024. No ano mais quente da história da humanidade, quando os termômetros registraram temperaturas 1,5º C acima do período pré-industrial, a Gree ampliou as vendas no País acima das expectativas.
A previsão era crescer 25% em faturamento, mas a companhia avançou 38% ante 2023. Em número de unidades comercializadas, a alta foi de 21%, na mesma base de comparação. Para 2025, a empresa espera um avanço de 15% em faturamento e de 17% em volume.
Segundo o executivo, o fator de preocupação para 2025 é a conjuntura econômica, já que as projeções meteorológicas indicam que as fortes ondas de calor devem continuar.
Com preços mais altos e as incertezas que rondam a economia, a demanda pode perder fôlego. “Não sabemos o que pode acontecer em 2025,” observou o executivo, argumentando que se a inflação continuar em rota ascendente, o consumidor deve dar preferência para compra de itens de primeira necessidade e a aquisição do aparelho de ar condicionado pode ficar para segundo plano.
Recorde
Em 2024, no entanto, o cenário foi muito mais favorável aos fabricantes de aparelhos de ar-condicionado. Com as ondas de calor extremo e a economia crescendo, puxada pelo aumento do emprego e da renda, as vendas desses aparelhos foram recordes.
De janeiro a setembro - o último dado disponível -, foram comercializadas 4,3 milhões de unidades, ante 2,8 milhões no mesmo período de 2023, alta de 54%, segundo dados da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros).
Além disso, existe uma demanda potencial muito grande a ser atendida. Os aparelhos de ar-condicionado estão presentes em menos de 25% dos domicílios brasileiros. E, em razão das altas temperaturas, o produto virou um eletrodoméstico muito desejado pelos brasileiros.
Leia também
Com produção 100% concentrada na Zona Franca de Manaus (AM), o Brasil possui o segundo maior polo produtor de ar condicionado do mundo, atrás apenas da China, de acordo com a Eletros.
Dados de mercado indicam que atualmente 12 indústrias disputam esse segmento, liderado hoje pela Midea, seguido pela Gree – as duas chinesas –, e, na sequência, a coreana LG. A perspectiva é de que oito novos fabricantes ingressem nesse segmento em 2025.
“Estamos cautelosos”, disse Murano. A cautela se justifica não só pelas pressões de custos que devem levar a alta de preços de todos os fabricantes por conta da disparada do dólar, às incertezas da macroeconomia, mas também à entrada de novos competidores.
O executivo frisa que a concorrência não é ruim, mas admite que a entrada de novos fabricantes contribui para uma postura mais “pé no chão” da companhia em relação às projeções de crescimento para 2025.
Murano não revela os investimentos, mas observa que hoje a fábrica de 100 mil metros quadrados localizada em Manaus tem capacidade total de produção para um pouco mais de 1,5 milhão de aparelhos por ano. É a única fábrica de grande porte do grupo localizada fora da China. Em 2024, Manaus produziu 800 mil aparelhos. “Temos espaço para crescer dentro do parque instalado.”
Atualmente são fabricados cinco modelos de aparelhos de ar-condicionado e está sendo iniciada a produção de um sexto modelo. Para isso, será implantado um terceiro turno com a contratação de trabalhadores temporários.
Apesar de ser a maior fabricante de aparelhos de ar-condicionado do mundo, no Brasil a companhia tem 17% do mercado, segundo o executivo, e está atrás da compatriota Midea. Mas, segundo Murano, a meta da Gree é alcançar a liderança também no Brasil nos próximos dois anos.
Diversificação
Hoje a Gree atua no País só com aparelhos de ar-condicionado. No entanto, estuda o ingresso na linha branca, como lavadoras e refrigeradores, por exemplo. Segundo o executivo, esse é um plano que está sendo avaliado para ser colocado em prática a partir do segundo semestre de 2025. Os produtos seriam importados, pelo fato de ser mais vantajoso do que iniciar a produção local.
A concorrente Midea, por exemplo, acaba de inaugurar a primeira fábrica de lavadoras e geladeiras no País, em Pouso Alegre (MG). A decisão veio depois de a empresa testar o mercado de linha branca com a venda de produtos importados por dois anos, entre 2016 e 2017.
Em recente entrevista ao Estadão, Felipe Costa, CEO da Midea no Brasil, disse que a decisão de ter produção local de refrigeradores e lavadores foi tomada porque esse é um dos mercados mais relevantes no Brasil no segmento de eletrodomésticos. Ao que tudo indica, a Gree deve seguir o caminho da concorrente.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.