Estamos a três dias de distância do trigésimo aniversário da URV, que era como o real se chamava na sua criptoexistência como moeda de conta.
Aproveitando a ocasião, e a efervescência dos assuntos tecnológicos, fui perguntar à ferramenta mais popular de IA sobre os 30 anos do Plano Real, e vi muitos elogios. Não estou acostumado.
Há uns reparos, mas todos sobre desafios remanescentes – como acabar com a pobreza, por exemplo – que não eram parte do plano.
Que não se perca de vista que os large language models que formam a base da ferramenta de IA, constroem texto a partir de material existente na internet, portanto, trata-se de produto da soma de tudo que se escreveu.
Mais ou menos como na opção autocomplete que existe no Whatsapp, e que é bem conhecida de seus usuários, inclusive pelas gafes que nos faz cometer.
Se assim é, então a pergunta sobre o real deveria refletir nada mais que a mediana das opiniões. É claro que isso não é fácil de se fazer, sobretudo nos assuntos muito controversos, nos quais a IA fica “defensiva” e protegida por clichês.
Há certa discussão sobre se a ferramenta tem viés ideológico pois não é simples formar médias de substâncias que não se misturam. O leitor pode apenas imaginar a temperatura dessa discussão quando se trata de assuntos de guerra cultural.
O fato é que os economistas brasileiros conhecem muito de estatística, e especialmente as medianas. A pesquisa Focus, publicada pela Banco Central pela manhã todas as segundas feiras, trabalha com medianas de expectativas de mais de uma centena de instituições especializadas. Essas medianas são a base da operação da política monetária, a bússola para o sistema de “metas para a inflação”.
O Focus, ou o sistema de expectativas de mercado, foi criado pelo BC junto com o Copom, em 1996, primeiro de um jeito muito informal. Mas depois foi magnificamente aperfeiçoado quando se consolidou o sistema de Metas a partir de 1999.
Um dos efeitos da ferramenta foi demonstrar a força da mediana, ou dos grandes números, para reduzir a importância de previsões individuais. Os vaticínios muito agourentos, bem como os “chapa-branca”, acabam sumindo no burburinho de inúmeros fulanos e beltranos que sabem fazer conta.
Não será interessante pensar que a inteligência artificial permite que se produza algo semelhante, uma espécie de “mediana das opiniões”? Inclusive corrigindo pelo engajamento? Ou será ingênuo pensar assim? Será por isso que a IA tem um julgamento positivo sobre o Plano Real? Ou será por que deu certo mesmo?
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.