O ano começou com presidente da República ralhando publicamente com o presidente do Banco Central. Roberto Campos Neto, “aquele cidadão”, era o primeiro com mandato entrando por dentro de um governo de presidente adversário daquele que o nomeou.
É feio quando o presidente assume posturas tolas, parecendo apenas agradar o seu cercadinho. Pior ainda quando é sincero e ecoado pelos áulicos.
No passado, quando podia demitir o presidente do BC, o Palácio se queixava dos juros em “off”. Fazê-lo abertamente convidava a pergunta sobre por que não demitir. Quando perdeu esse poder, o presidente ganhou o privilégio de reclamar publicamente, ainda que sem consequência. Parece que Lula se sente melhor nessa nova situação.
Em seguida a tentativa foi de pazuelizar a instituição nomeando como diretores os seus “homens de confiança”, uma solução comum para outros colegiados.
Lula já indicou quatro novos dirigentes do BC, dois servidores da casa, e dois economistas “de fora”, Gabriel Galípolo e Paulo Picchetti. Todos submergiram, absorvidos pela instituição e suas práticas.
No final de 2024, terminam os mandatos de Campos Neto e de dois outros diretores. Lula terá o “controle” da instituição ao escolher seus substitutos, sobretudo o presidente, somando sete nomeados seus de um colegiado de nove. Terá?
A escolha do novo presidente do BC não será simples, uma vez que vai ocorrer, provavelmente, no mesmo momento em que o Copom vai se decidir sobre a taxa neutra, ou sobre até que nível vai cair a Selic.
Com todos esses pratos no ar, por ora, felizmente, tudo permaneceu como estava.
Em Brasília, às vezes, é preciso percorrer um caminho muito sinuoso para tudo ficar no mesmo lugar.
A meta de inflação para 2023 era de 3,25% com 1,5% de margem de tolerância, portanto com um “teto” de 4,75%. As expectativas para o IPCA em 2023 aferidas pelo Focus (de 22/12, último do ano) estavam em 4,46%.
Campos Neto cumprirá sua meta no dificílimo primeiro ano de presidente da República inimigo daquele que o nomeou. Um feito tão “histórico” quanto a passagem da reforma tributária. Impossível dizer o que é mais difícil: domar o IPCA ou engolir em seco diante de provocações públicas.
Pois Campos Neto terminou o ano de 2023 participando alegremente de churrasco na Granja do Torto em harmonia com o presidente e seu entorno. Houve um “ganho institucional”, talvez com implicações para a definição do perfil do próximo presidente do BC. Mas convém não exagerar na transcendência do gesto. Um churrasco pode ser mais que uma refeição, ou não.