No final de 2022 o mundo conheceu o chatGPT, desenvolvido pela OpenAI (com significativo investimento da Microsoft) e que, em apenas cinco dias, atingiu a marca de um milhão de usuários. O Instagram, lançado em 2010, levou 760 dias para conseguir o mesmo feito. Mais do que isso: em apenas dois meses, o chatGPT já era utilizado por mais de cem milhões de pessoas, enquanto o mesmo Instagram levou quinze vezes mais tempo — dois anos e meio. Embora seja o mais conhecido entre os chatbots (ou robôs de conversação), certamente não é o único: há diversas opções disponíveis, com novos entrantes chegando ao mercado regularmente. Indivíduos, negócios, academia e governos ainda estão aprendendo qual a melhor forma de lidar com essa poderosa ferramenta.
A sigla “GPT” significa Generative Pre-Trained Transformer, um tipo de modelo de linguagem (LLM - large language model) introduzido pela OpenAI em 2018 capaz de produzir conteúdo inédito em múltiplas dimensões: textos, imagens, vídeos, código-fonte para programas de computador. Para serem capazes de desempenhar essas tarefas, os modelos são treinados com milhões de exemplos coletados de diversas fontes — e assim, praticamente do dia para noite, os frutos da longa jornada da Inteligência Artificial tornaram-se palpáveis para a população em geral.
As possibilidades que a Inteligência Artificial traz para a humanidade transcendem em muito uma área específica de aplicação: seu uso é absolutamente genérico, e a esmagadora maioria dos líderes de negócios dos mais variados setores estão ativamente buscando as melhores formas de alavancar essa tecnologia em seus processos. Da seleção de candidatos ao departamento financeiro, da manufatura à logística, do marketing à cibersegurança — não importa o segmento, há espaço para utilização da Inteligência Artificial.
Um dos principais motivos para isso é que podemos classificar a Inteligência Artificial como uma tecnologia de propósito geral (ou, em inglês, general-purpose technology — GPT): uma inovação que altera de forma expressiva a economia, impulsionando a produtividade em diversos setores. Em seu livro publicado em 2005, os economistas Richard Lipsey, Kenneth Carlaw e Clifford Bekhar definiram uma GPT como “uma única tecnologia genérica, reconhecível como tal ao longo de toda a sua vida útil, que inicialmente tem muito espaço para melhorias e, eventualmente, vem a ser amplamente utilizada, com muitas utilidades e efeitos secundários”.
Como a história da civilização é, em grande medida, impulsionada por inovações tecnológicas, não é surpreendente que as primeiras tecnologias de propósito geral tenham surgido justamente durante a revolução neolítica. Foi nesse período, há cerca de doze mil anos, que seres humanos trocaram a caça e a vida nômade pela agricultura e o sedentarismo. Durante os milênios subsequentes vieram o dinheiro, a roda, a escrita e os metais (bronze e ferro). As três Revoluções Industriais que varreram o mundo a partir de meados do século XVIII trouxeram a máquina a vapor, as ferrovias, o motor de combustão interna, a eletricidade, o computador e a Internet.
A Quarta Revolução Industrial e suas inovações — robótica, impressão 3D, biotecnologia, Internet das Coisas, energia — atualmente tem na inteligência artificial sua face mais visível e capilarizada. Enquanto algumas dessas tecnologias estão (por enquanto) mais concentradas nas indústrias (como robôs e impressoras 3D), a popularização do chatGPT trouxe para o presente uma discussão que ainda parecia distante para muitos: como utilizar, na prática, a inteligência artificial. Manipular bits é muito mais simples que manipular átomos, e as ferramentas para alavancagem dessa nova GPT surgem a uma velocidade sem precedentes.
Como uma tecnologia de propósito geral, a IA é extremamente versátil e pode ser utilizada virtualmente em qualquer área de negócios. Mais que isso, é capaz de servir de infraestrutura para diversos tipos de aplicações: imagine um sistema de visão computacional empregado em áreas como veículos autônomos, controle de qualidade em linhas de produção, auxílio na análise de imagens médicas ou ainda análise da atividade celular durante testes de novos medicamentos. O uso da inteligência artificial na área de saúde será o tema da nossa próxima coluna. Até lá.
*Guy Perelmuter é fundador da GRIDS Capital e autor do livro “Futuro Presente - o mundo movido à tecnologia”, vencedor do Prêmio Jabuti 2020 na categoria Ciências. É Engenheiro de Computação e Mestre em Inteligência Artificial pela PUC-Rio
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