Em 1941, quando o mundo entrava no terceiro ano do conflito mais violento de sua história, o físico norte-americano John Mauchly (1907-1980) conheceu seu compatriota John Adam Presper Eckert Jr (1919-1995), um engenheiro elétrico recém-formado na Universidade da Pensilvânia, durante um curso de “eletrônica em tempos de guerra”. Juntos, eles criaram o ENIAC (Electronic Numerical Integrator and Computer, ou Integrador e Computador Numérico Eletrônico) para agilizar o cálculo das trajetórias dos projéteis disparados pela artilharia, buscando aumentar sua precisão. Concluído em 1945 e em operação por uma década, o ENIAC estabeleceu um importante marco na história da computação, como um dos primeiros computadores eletrônicos programáveis de propósito geral.
A complexidade do ENIAC — e de vários outros equipamentos desenvolvidos nas décadas subsequentes — exigia uma série de cuidados com sua localização: salas espaçosas o suficiente para acomodar as volumosas máquinas, pisos elevados e prateleiras para os cabos, fontes de energia, refrigeração e ainda segurança para controle de acesso. A “sala do computador” tornou-se a origem dos atuais data centers, que aceleraram sua expansão a partir do final do século XX com a popularização do acesso à Internet: o risco de não possuir uma presença online 24 x 7, com alta velocidade, era grande demais para a maior parte das empresas.
O crescimento exponencial da quantidade de dados gerados por nós o tempo todo, seguido da popularização da arquitetura cliente-servidor — na qual o processamento é realizado por uma máquina remota (“servidor”) e apenas o resultado é transmitido de volta para a máquina local (“cliente”) — ampliou o alcance e a necessidade da construção de data centers, que são a representação física daquilo que o mercado passou a chamar de “nuvem”: o local onde nossos dados, fotos, filmes, documentos, apresentações e códigos são armazenados e onde ficam disponíveis para acesso a partir de qualquer um dos nossos dispositivos, em qualquer lugar que estejamos.
Mais recentemente, com a popularização de aplicações baseadas em Inteligência Artificial, a demanda por data centers acelerou de forma significativa. A infraestrutura (e consequente custo) necessária para o treinamento de LLMs (large language models, ou “grandes modelos de linguagem”) está ao alcance de apenas um punhado de empresas, como Microsoft, Apple, Amazon, Alphabet (a holding que controla a Google) e Meta (a holding que controla, entre outras empresas, o Instagram, WhatsApp e Facebook), enquanto a demanda pelo uso dos resultados produzidos por chatbots como ChatGPT (Open AI), Gemini (Google), Claude (Anthropic) e Perplexity — apenas para citar alguns — continua a aumentar.
Maior demanda por data centers significa também maior demanda por energia (para alimentar os equipamentos) e por água (para resfriá-los). De acordo com relatório do banco de investimentos Goldman Sachs, um prompt do ChatGPT consome dez vezes mais energia que uma busca no Google — e a criação de uma imagem por IA generativa pode equivaler a uma carga do seu smartphone, de acordo com a MIT Technology Review. Ainda de acordo com a publicação, o treinamento de um modelo relativamente pequeno para os padrões atuais (com cerca de duzentos milhões de parâmetros) gera emissões equivalentes a cinco carros movidos a gasolina durante toda sua vida útil.
O relatório Electricity 2024, da Agência Internacional de Energia, estimou que data centers, criptomoedas e IA geraram uma demanda de 460 terawatts/hora em 2022, equivalente a 2% do consumo global (apenas as criptomoedas representam quase um quarto deste valor). Em 2026, este valor pode chegar a mais de mil TWh, uma diferença equivalente ao consumo de eletricidade anual de um país como a Alemanha. O Boston Consulting Group estima que, em 2030, nada menos que 16% de todo consumo de energia nos Estados Unidos seja feito por data centers. Isso representa um aumento de mais de seis vezes em relação a 2022.
A maior demanda por eletricidade acaba gerando também um aumento nas emissões de gases prejudiciais à atmosfera. Em seus respectivos Relatórios de Meio Ambiente deste ano, tanto Google quanto Microsoft registraram aumentos nas suas emissões: quase 50% para Google (2019-2023) e quase 30% para Microsoft (2020-2023). Como tentar conciliar este aumento na demanda com as medidas de proteção e preservação do ambiente será o tema da nossa próxima coluna. Até lá.
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