EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do Banco Central

Opinião | Saída da Argentina não parece estar no que o Brasil fez em 2018, mas no que fez nos anos 1990 e 2000

País vizinho lembra o Brasil das décadas de 1970 e 1980, com muita inflação e poucas reservas

PUBLICIDADE

Publicidade
Foto do author Henrique  Meirelles

No dia 22, a Argentina terá uma das eleições presidenciais mais importantes da sua história recente. Terá de escolher entre o candidato populista, Javier Milei, o governista Sergio Massa e a direitista Patricia Bullrich em meio a uma monumental crise econômica e social, com hiperinflação e aumento da pobreza.

PUBLICIDADE

Até agora, nenhum dos três candidatos se mostrou em condições para lidar com o problema e apontar as soluções necessárias. Existe alguma similaridade, apesar das comparações não serem exatas, com a eleição de 2018 no Brasil, quando fui candidato a presidente.

Assim como fazia o candidato Jair Bolsonaro, Milei é o favorito ao se apresentar como o candidato antipolítica, que propõe uma série de rupturas radicais e, assim, capta o interesse de pessoas cansadas de quase 30 anos de retrocesso econômico e decepcionadas com a política.

Em um aspecto diferente do brasileiro, no entanto, o governista Sergio Massa tem dificuldades porque é ministro da Fazenda de um governo que enfrenta uma crise gravíssima: a hiperinflação está em mais de 130% ao ano e o país não tem reservas internacionais para pagar o que deve. Ao emitir dinheiro para se financiar, o Banco Central argentino retroalimenta a inflação. A pobreza nunca cresceu tanto no país como nos últimos anos.

A situação argentina lembra a do Brasil das décadas de 1970 e 1980. Na época, o Brasil também tinha inflação de mais e reservas em dólar de menos — estava quebrado, vivia de empréstimo em empréstimo. Entre 1985 e 1994, o Brasil teve seis planos econômicos baseados no fim da inflação por decreto, alguns com congelamento de preços — só que a inflação não concordava e sempre voltava, até o próximo plano que não atacava o cerne da questão. A Argentina também tentou diversos congelamentos de preços, sem resultados.

Publicidade

Argentina precisa abandonar os planos mágicos, atacar o problema da inflação alimentada pelo gasto público e ter um Banco Central realmente independente Foto: Agustin Marcarian/Reuters

O quadro começou a mudar com o plano Real, que criou uma âncora para a inflação em 1994. Mais tarde, em 2003, quando assumi o Banco Central, iniciamos um programa de acúmulo de reservas, que já contei aqui como foi — e é — fundamental para o Brasil resistir às mais graves crises.

Uma diferença entre os dois países é que a Argentina ainda não teve força política para atacar os gastos públicos, romper a inércia da inflação e criar condições para reduzir a pobreza.

A Argentina precisa abandonar os planos mágicos, atacar o problema da inflação alimentada pelo gasto público e ter um Banco Central realmente independente. A saída não me parece estar no que o Brasil fez em 2018, mas no que fez nos anos 1990 e 2000. Espero que os eleitores argentinos façam uma boa escolha para o seu futuro.

Opinião por Henrique Meirelles

Ex-presidente do Banco Central e ex-ministro da Fazenda

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.