Na reunião que começa na terça-feira e termina na quarta-feira, o Copom estará diante de um cenário desafiador para tomar uma decisão sobre a taxa básica de juros. Qualquer que seja o resultado diante dos critérios técnicos, será importante o colegiado demonstrar coerência e se comunicar bem. O momento da sucessão na presidência do Banco Central requer isso, em nome da credibilidade.
Há sinais aparentemente opostos no cenário. Agosto registrou deflação, baseada na queda nos preços dos alimentos. Mas há expectativa de aumentos de preços em setores, como o de energia, no futuro próximo. A inflação deste ano está próxima do limite do intervalo da meta e a dos anos seguintes está fora da meta.
Diante disso, o mercado oscila entre apostas na manutenção da Selic em 10,5% ao ano e em elevações de 0,25 ponto porcentual nas próximas reuniões. Os dados que serão expostos na reunião do Copom dirão qual o melhor caminho.
O Copom não precisa tomar uma decisão unânime, pode haver divergências. Precisa, isto sim, demonstrar com clareza no comunicado e na ata da reunião, os motivos que embasaram a decisão. Isso é essencial devido ao processo sucessório. Gabriel Galípolo foi indicado presidente do Banco Central a partir do ano que vem. Será sabatinado e aprovado pelo Senado em outubro, não há dúvidas.
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Mas o mercado estará atento a seus posicionamentos como diretor de Política Monetária nas próximas reuniões este ano e no início do ano que vem. A despeito dos esforços, Galípolo terá de provar que será um presidente de BC independente, à altura da lei da autonomia. Não só terá de tomar decisões técnicas, como terá de demonstrar isso a cada dia.
Quando fui escolhido presidente Banco central, em 2002, pelo então presidente eleito Lula, mantive conversas com meu antecessor, Armínio Fraga, que colaborou bastante com minha chegada. Sua gestão elevou algumas vezes a Selic, num movimento necessário naquele contexto.
Como já contei, quando assumi, muitos apostavam que o BC de um governo do PT seria leniente com a inflação. Nas duas primeiras reuniões sob meu comando, o Copom elevou os juros de 25% para 25,5% e 26,5% - a despeito de críticas. O mercado compreendeu que o BC seria independente, as expectativas se ancoraram e em janeiro de 2004 a taxa era de 16,5%. Como dizia o economista Allan Wentzel, “a principal qualificação de um presidente de Banco Central é a coragem”.
Conto essa e outras histórias em meu livro de memórias “Calma sob pressão”, que será lançado no dia 24, às 19h, na Livraria Travessa do shopping Iguatemi, em São Paulo. Será um prazer receber a todos.
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