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Inadimplência do cartão de crédito sobe e atinge nível recorde de 31,5%

Calote no rotativo e do parcelado chegou a quase um terço do saldo dessas duas linhas juntas em abril, a maior marca em 12 anos, aponta a Serasa Experian

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Foto do author Márcia De Chiara
Atualização:

A inadimplência do brasileiro no cartão de crédito rotativo e no parcelado atingiu o pico e se mantém em níveis recordes nos últimos meses. Em março e abril deste ano, quase um terço (31,5%) do saldo de R$ 135,6 bilhões de crédito nessas duas modalidades estava inadimplente. É a maior taxa da série histórica mensal do calote iniciada em março de 2011.

O cálculo da inadimplência do cartão de crédito rotativo e do parcelado foi feito, a pedido do Estadão, por Luiz Rabi, economista-chefe da Serasa Experian, empresa especializada em informações financeiras.

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Com base nos dados do Banco Central (BC), o economista expurgou o cartão de crédito à vista, que representa 70% do crédito. Como não há inadimplência no cartão à vista, considerar essa cifra no cálculo da taxa acaba suavizando o índice real de calote, observa Rabi.

De acordo com as regras do BC, tudo que não é pago no vencimento vai para o rotativo. Após um mês, esse montante tem de ser parcelado (como crédito pessoal). No rotativo, o calote bateu em março deste ano 52,12% - é o nível mais elevado da série que começou em março de 2011. Em abril deste ano, a inadimplência recuou um pouco, para 51,75%, apontam os dados do BC.

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Em abril, a inadimplência média do cartão, que inclui os saldos à vista, parcelado e do rotativo, estava em 8,65%. Nesse caso, também é o maior resultado mensal desde setembro de 2012 (8,67%) e está mais de dois pontos acima do de abril de 2022 (6,3%).

Outro dado da Serasa Experian que confirma a explosão da inadimplência do cartão de crédito é que a dívidas com cartão e bancos responderam em maio de 2023 por 31,9% do número de créditos em atraso, a maior fatia desde o início da série mensal, em janeiro de 2018.

Rabi pondera que não é possível separar nas estatísticas a parcela da inadimplência com cartões e com bancos. Mas, por outras evidências, está convencido de que o calote está sendo puxado pelos cartões de crédito.

País tem 71 milhões de brasileiros inadimplentes somando todas as linhas destinadas a pessoas físicas Foto: Werther Santana/ Estadão

Ele observa que faz um ano e meio que as duas únicas linhas de crédito cuja concessão cresce para pessoa física são o cheque especial e o cartão rotativo e parcelado. Como a carteira do cartão é quatro vezes maior do que a do cheque, ele conclui que quem está puxando a inadimplência dos bancos é o cartão de crédito. “A inadimplência do cartão é um dos principais problemas do mercado de crédito hoje”, afirma Rabi.

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Já o vice-presidente executivo da Associação Brasileira das Empresas de Cartão de Crédito e Serviços (Abecs), Ricardo Vieira, apesar de admitir que a inadimplência preocupa o setor, pondera que a trajetória da curva do calote do cartão acompanha a tendência da inadimplência da pessoa física. “A inadimplência das pessoas físicas como um todo está em um pouco mais de 6%, é um pouco menor (do que a do cartão), mas evolução da curva é similar, não tem nada de errado com o cartão, não há nenhum descolamento”, afirma o executivo.

Ressaca da pandemia e da Selic

Vários fatores combinados contribuíram para aceleração da inadimplência do cartão. Boanerges Ramos Freire, presidente da Boanerges & Cia, consultoria especializada em serviços financeiros, destaca a ressaca que houve por conta da pandemia e da alta da taxa básica de juros (Selic) como motivos que levaram ao aumento da inadimplência. “Não foi tanto a deterioração do emprego, mas da renda corroída pela inflação”, observa o consultor.

Rabi, da Serasa, frisa que o principal fator do aumento da inadimplência foi a disparada da inflação. “Quando a inflação acumulada em 12 meses em setembro de 2021 passou de 10% e permaneceu nesse patamar até setembro de 2022, o estrago foi brutal na renda familiar”, lembra ele. O total de inadimplentes, não apenas no cartão, saiu de 62 milhões em setembro de 2021 para 71 milhões em maio deste ano. “Esse número foi puxado principalmente por bancos e cartões”, afirma.

Outro fator que turbinou o crédito no cartão e, consequentemente, levou à alta da inadimplência, foi o aumento da liquidez de recursos com a expansão dos benefícios sociais por causa da pandemia, observa Vieira, da Abecs. “Como houve um empoçamento da liquidez, o sistema como um todo ficou muito menos rigoroso na concessão”, diz.

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O executivo lembra que, com a entrada de muitos bancos eletrônicos no mercado, a competição entre as instituições financeiras ocorreu por meio da maior oferta de cartões. “O número de cartões aumentou muito no período”, observa Vieira.

Estatísticas do BC mostram que de 2020, o primeiro ano da pandemia, para 2021 o estoque de cartões de crédito aumentou quase 45%, de 263 milhões para 381,3 milhões. Ao final do ano passado, esse volume tinha subido para 430,6 milhões, com crescimento de cerca de 13%.

Segundo o vice-presidente da Abecs, esse cenário de forte crescimento no número de plásticos começou a mudar no início do segundo semestre do ano passado. “Grandes bancos começaram a mudar a ‘scoragem’ (critério para concessão do crédito) para frear a expansão e controlar a inadimplência futura, que é a inadimplência que estamos vendo agora.”

Perspectivas para inadimplência

Essa mudança de critério deve ter reflexos nos índices de inadimplência. Na análise de Vieira, a inadimplência deve estar muito perto do pico e, a partir do segundo semestre, deve começar a recuar.

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Na opinião de Boanerges, no entanto, a queda da inadimplência será mais lenta. “A tendência é de manutenção de um patamar alto durante algum tempo, porque as condições gerais não são favoráveis”, diz o consultor. Ele acredita num recuo ao longo do próximo ano.

Do ponto de vista geral da inadimplência da pessoa física, que reúne hoje 71 milhões de brasileiros em todas as linhas de crédito, o economista-chefe da Serasa ressalta que o que ocorre no momento é uma desaceleração na taxa de crescimento do número de inadimplentes. “Já esteve pior: antes crescia a uma taxa de 10% o número de inadimplentes e hoje está crescendo a 8%, mas não está caindo”, frisa.

A tendência projetada por Rabi é que o número de inadimplentes em geral pare de subir do terceiro para o quarto trimestre deste ano. O recuo dependerá da continuidade da queda da inflação e do corte data básica de juros. “Se a inadimplência parar de piora este ano, já vai estar de bom tamanho.”

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