A preocupação com a forma como o Brasil está lidando com a questão ambiental ganhou espaço no debate dos principais banqueiros brasileiros, incluindo presidentes do Itaú e do Bradesco, mesmo em um 'palanque virtual', onde o assunto chave deveria ser tecnologia bancária. O alerta para consequências silenciosas e que podem se prolongar além dos estragos da própria pandemia ocorre em meio à repercussão do tema junto ao olhar estrangeiro enquanto o presidente Jair Bolsonaro vê apenas 'desinformação'.
A questão ambiental é, na opinião do presidente do Itaú Unibanco, Candido Bracher, o principal 'perigo' que ameaça o Brasil é o ambiental. "No momento em que a sociedade se percebe frágil, a gente deve olhar para outros perigos. As consequências ambientais podem até vir de uma maneira mais lenta do que as da saúde como a covid-19, mas são mais duradouras e difíceis de reverter", avaliou o executivo, durante debate no CIAB, feira de tecnologia bancária, promovida pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e que teve a sua primeira versão virtual.
O presidente do maior banco da América Latina, com quase R$ 2 trilhões em ativos totais, alertou para o aumento dos incêndios na Amazônia no início deste ano, enquanto o Brasil tenta combater a propagação do novo coronavírus - é o terceiro maior país em mortes por covid-19. "Estamos vendo neste início ano incêndios 60% maiores do que foram no ano passado e nós precisamos enquanto sociedade nos mover contra isso", disse ele, acrescentando que os bancos têm um "peso importantíssimo" no tema.
"Todo mundo falava de sustentabilidade, de problema com o Planeta, de aquecimento global, reflorestamento, derrubada, de qualidade do ar, da água. Todo mundo falava sobre isso, mas de fato nós temos de reconhecer que fizemos muito pouco em relação a isso", observou o presidente do Bradesco, Octavio de Lazari.
Para o executivo, a pandemia alertou o mundo sobre a maneira como todos estavam vivendo até então. "Parece que o Planeta deu um grito e falou: vocês têm a chance de recuperarem o que estão fazendo", disse Lazari.
O alerta vem no mesmo dia de uma ameaça da Europa. Embaixadas do Brasil no continente europeu receberam uma carta de um grupo formado por 29 instituições financeiras, com US$ 3,7 trilhões em ativos totais, e que ameaçam retirar seus recursos do País caso o governo Bolsonaro não atue para conter o desmatamento na Amazônia. O documento, que ganhou espaço no jornal britânico Financial Times, encorpou um coro de críticas negativas às políticas ambientais do governo.
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido), contudo, credita o fato de a imagem do País não estar 'muito boa' em relação à questão ambiental por 'desinformação'. "Nós sabemos que nossa imagem não está muito boa aí fora por desinformação", afirmou ele, ontem, alegando que o Brasil é o País que "mais preserva". Como de costume, rebateu as avaliações negativas que seu governo tem recebido sobre a questão ambiental. Segundo ele, há país estrangeiro que critica o Brasil não tendo "um palmo de mata ciliar".
Segundo o presidente do BTG Pactual, Roberto Sallouti, a agenda ASG, sigla para ações ambientais, sociais e de governança, não é mais 'opcional'. "É algo que se nós não incorporarmos, os nossos clientes vão escolher outros bancos porque essa é uma demanda da sociedade. Acho que como setor temos muito que mostrar", avaliou ele, durante debate com outros banqueiros no CIAB.
Sallouti fez uma 'provocação' aos demais presidentes de bancos e defendeu uma ação coletiva. Segundo ele, o setor bancário é o que tem mais agenda ASG no País. Nesse sentido, o presidente do BTG sugeriu aos bancos publicarem um balanço consolidado das ações ambientais, sociais e de governança. Bracher, do Itaú, concordou com o concorrente e avaliou como 'importante' a iniciativa.
Algumas instituições financeiras no Brasil já publicam o balanço ASG (ambiental, social e governança). No entanto, como a iniciativa não é mandatória nem todas a fazem. Ao Estadão/Broadcast, a Febraban informou que os bancos estão revendo a norma de autorregulação e que esse ponto pode ser trabalhado no âmbito dos compromissos do setor bancário.
Correções
A reportagem tinha informado que as embaixadas do Brasil na Europa receberam uma carta de um grupo formado por 29 instituições financeiras, com US$ 3,7 bilhões em ativos totais e que ameaçaram retirar seus recursos do País. Na verdade, o valor correto é de U$ 3,7 trilhões.
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