Indefinição sobre pacote de corte de gastos chega à terceira semana e Haddad retorna a Brasília

Mercado financeiro prevê anuncio em torno de R$ 30 bilhões com medidas estruturais, além de pente-fino de R$ 25 bilhões, para que o governo consiga reverter a crise de confiança com as contas públicas

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Foto do author Alvaro Gribel

BRASÍLIA - O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, retornará a Brasília nesta segunda-feira pela manhã para tentar destravar o pacote de cortes de gastos em negociação com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Desde o último dia 30 de novembro, quando um jantar no Palácio do Alvorada reuniu a cúpula do governo, já foram mais de 20 horas de reuniões para discutir as medidas com ministros, secretários, e até empresários e dirigentes sindicais.

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O anúncio ainda pode levar alguns dias, porque dependerá não apenas de Lula, mas de conversas entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara, Arthur Lira. Essa seria a “fase 2″ da elaboração do pacote, que ainda está por vir. Esses encontros, contudo, ainda não estão agendados segundo as assessorias de ambos os parlamentares.

Enquanto Haddad e a ministra do Planejamento, Simone Tebet, tentam emplacar medidas “estruturais”, que garantam economias permanentes para as contas públicas nos próximos anos, ministros como Carlos Lupi (Previdência), Luiz Marinho (Trabalho) e Wellington Dias (Desenvolvimento Social) se posicionam publicamente contra alterações que atinjam as suas pastas.

Entre as principais medidas em estudo pela equipe econômica estão alterações no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), mudança de regras para o recebimento do Abono Salarial, do seguro-desemprego e também do Benefício de Prestação Continuada (BPC).

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Haddad têm discutido o pacote de cortes com outros ministros do governo Foto: Wilton Junior/Estadão

Uma mudança na principal fonte de pressão de aumento de despesas, segundo especialistas, contudo, já foi descartada. O governo não cogita desatrelar o pagamento de salário mínimo aos aposentados e pensionistas do INSS.

A ideia de limitar a indexação do salário mínimo ao teto de 2,5% do arcabouço fiscal ainda está sobre a mesa. Como o PIB de 2023 cresceu 2,9%, e o PIB deste ano pode ficar acima de 3%, já haveria uma economia em 2025 e 2026, os últimos dois anos de governo. O ganho real do salário mínimo é sempre atrelado ao crescimento da economia de dois anos anteriores.

Pelas contas do Itaú Unibanco, se o Abono Salarial ganhasse um novo desenho, tendo como base a renda per capita da família, o governo poderia economizar cerca de R$ 15 bilhões em 2026. Já o uso do FGTS para financiar despesas do seguro-desemprego, a partir do terceiro mês de desemprego, a economia chegaria a R$ 10 bilhões.

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A ampliação de 30% para 60% do dinheiro do Fundeb para compor o piso de gastos do governo com educação poderia liberar outros R$ 17 bilhões, pelas contas do banco. Isso daria maior flexibilidade para o Orçamento, deixando esse montante apto a receber medidas de bloqueios e contingenciamentos.

A conta do mercado financeiro

O mercado financeiro entende que o governo precisa conseguir cumprir a promessa de economizar cerca de R$ 25 bilhões no ano que vem com medidas de ‘pente-fino’, mas, além disso, anunciar pelo menos outros R$ 30 bilhões em propostas estruturais que teriam efeito a partir de 2026. Esses dois números somados, na casa dos R$ 55 bilhões, ou 0,5% do PIB, atenuariam a crise de confiança sobre as contas públicas na última metade do governo.

Ainda assim, o número é visto como insuficiente para reequilibrar a dívida pública. Segundo dados do Banco Central, o endividamento bruto do governo chegou a 78,5% em agosto, quase sete pontos percentuais acima dos 71,7% de dezembro de 2022.

Esse crescimento acelerado da dívida é impulsionado pelo déficit primário (que exclui o pagamento de juros), que foi de 2,26% nos 12 meses encerrados em agosto, e pelo déficit nominal (que inclui os juros) que chegou a 9,81% do PIB.

Com a inflação acima do teto da meta, 4,76% nos 12 meses encerrados em outubro, e com a piora nas expectativas para o IPCA, o Banco Central vem elevando a taxa Selic nas últimas duas reuniões. O aumento dos juros esfria a economia, por um lado, mas pressiona a dívida pública, pelo gasto com juros, por outro.

Por isso, o corte de gastos é visto como a única saída para a economia. A redução de despesas ajudaria não só a diminuir o déficit primário previsto para este ano, mas também a conter a alta da inflação, porque ajudaria a diminuir a demanda agregada. Isso conteria a alta do dólar, com a melhora da confiança dos investidores, permitindo ao Banco Central interromper a alta da Selic. O déficit nominal também ficaria menor, e a dívida cresceria mais lentamente.

PT quer medidas para o ‘andar de cima’

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já aceitou e entendeu que as medidas em discussão para cortar gastos são estruturais, e é justamente por isso que o processo vem se prolongando nas últimas duas semanas.

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Lideranças do PT também já admitem que o cenário para a economia é binário, com um forte impacto no dólar, juros, e crescimento econômico em caso de frustração com o pacote. Mas entendem que é preciso uma saída honrosa para o partido, com medidas que atinjam também o “andar de cima”. Isso facilitará a comunicação das medidas, para que elas não recaiam apenas sobre os mais pobres e não sejam vistas como uma traição por parte do eleitorado petista.

Pessoas a par das negociações dizem, porém, que ninguém sabe exatamente o que será decidido pelo presidente da República, mas garantem que ele está bem informado para definir o que sai e o que fica. Se a discussão envolvesse bloqueios e contingenciamentos, por exemplo, o anúncio já teria sido feito. Como são medidas estruturais, que envolvem muitos anos de governo à frente, Lula se sente no direito e dever de ouvir todos os lados para tomar a melhor decisão, a despeito da pressão do mercado financeiro.

O alinhamento entre Fazenda e Casa Civil já foi tornado público por Haddad, depois de quase dois anos de desentendimentos entre os chefes das duas pastas. Isso daria mais segurança a Lula para tomar uma decisão.

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