O que está atrasando a economia da Índia em sua tentativa de alcançar a da China?

Investimento de longo prazo no país por parte das empresas estagnou, e o dinheiro estrangeiro está em queda, mesmo com o governo impulsionando o crescimento com gastos de infraestrutura

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Por Alex Travelli

THE NEW YORK TIMES - A economia da Índia está prosperando. O preço das ações está na estratosfera, apresentando um dos melhores desempenhos do mundo. O investimento do governo em aeroportos, pontes e estradas e na infraestrutura de energia limpa pode ser visto quase em toda parte. Espera-se que a produção total da Índia, ou seu Produto Interno Bruto (PIB), tenha crescimento de 6% este ano, superior ao dos Estados Unidos e da China.

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Mas há um porém: o investimento por parte das empresas indianas não está acompanhando o mesmo ritmo. O dinheiro que as empresas investem no seu próprio futuro, em itens como novo maquinário e novas fábricas, estagnou. Enquanto fração da economia indiana, esse investimento está encolhendo. E com o dinheiro chegando aos mercados de ações indianos, o investimento exterior de longo prazo está em queda.

Há sinais positivos e negativos ao mesmo tempo. Em algum momento de um futuro próximo, o governo terá de reduzir seus extraordinários gastos, o que pode pesar na economia se o dinheiro do setor privado não ocupar esse espaço.

Ninguém espera que a Índia pare de crescer, mas um ganho de 6% não é suficiente para atender às ambições do país. Sua população, agora a maior do mundo, está crescendo. O governo definiu como meta nacional alcançar a China e se tornar um país desenvolvido até 2047. Um salto desse tipo exigiria um crescimento sustentado mais perto de 8% ou 9% ao ano, segundo a maioria dos economistas.

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Índia deve se beneficiar com a desaceleração da China, precipitada por uma crise imobiliária em andamento, segundo economistas Foto: Rebecca Conway/The New York Times

A falta de investimento também pode representar um desafio para Narendra Modi, primeiro-ministro desde 2014, que se concentrou na ideia de tornar a Índia um destino mais fácil para os negócios de empresas estrangeiras e indianas.

Modi está no modo candidato, enfrentando eleições no segundo trimestre e estimulando o país a celebrar seus sucessos. O investimento lerdo não é algo que executivos, banqueiros ou diplomatas estrangeiros gostem de comentar, por medo de parecerem pessimistas. Mas os investidores estão se protegendo enquanto a economia dá sinais tanto positivos quanto negativos.

Uma questão a respeito da qual todos concordam é que a Índia deve se beneficiar com a desaceleração da China, precipitada por uma crise imobiliária em andamento. As tensões geopolíticas da China com o Ocidente apresentam à Índia outra abertura, motivando empresas estrangeiras a transferir sua produção da China para outros países.

Nascido na Índia, Sriram Viswanathan, sócio e administrador do Celesta, um fundo de investimento do Vale do Silício, descreve investidores “interessados em preencher o vácuo criado na cadeia de fornecimento”.

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“Acredito que esta seja a oportunidade para a Índia”, disse ele.

O Banco Mundial aplaudiu o compromisso da Índia com os gastos de infraestrutura, que aumentaram durante a pandemia quando o setor privado precisou de um resgate. Desde então, o governo dobrou a aposta, pagando por reformas nas estradas desgastadas, nos portos e em uma rede elétrica que antes afastavam o investimento das empresas.

Mas o Banco Mundial, cuja missão é estimular as economias em desenvolvimento a crescer, diz que é fundamental que esses bilhões em gastos do governo desencadeiem uma rodada de gastos corporativos. Seus economistas falam em um “efeito cumulativo”, observado quando, por exemplo, um novo porto vizinho a um novo e reluzente parque industrial atrai empresas que constroem plantas e contratam trabalhadores. No ano passado, o banco disse esperar um efeito cumulativo iminente, como já previu quase seguidamente nos três anos mais recentes.

Para o Banco Mundial, só o investimento público não basta para acelerar o crescimento da confiança na Índia Foto: Rebecca Conway/The New York Times

“Para acelerar o crescimento da confiança, o investimento público não basta”, disse Auguste Tano Kouamé, diretor do Banco Mundial para a Índia, em entrevista coletiva em abril. “São necessárias reformas mais profundas para levar o setor privado a investir.”

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A falta de confiança ajuda a explicar por que os mercados de ações estão registrando recordes, mesmo enquanto investidores estrangeiros hesitam em comprar startups e bens apostando na economia indiana.

Os mercados de ações em Mumbai, capital econômica da Índia, valem quase US$ 4 trilhões, uma alta em relação aos US$ 3 trilhões de um ano atrás, ultrapassando o de Hong Kong. Os pequenos investidores da Índia são uma parte importante disso, mas a negociação de ações é rápida e fácil, se comparada à compra e venda de empresas. Uma recente média anual de US$ 40 bilhões em investimento direto estrangeiro recuou para US$ 13 bilhões no ano passado.

Uma razão que leva as empresas a observar e esperar antes de investir é o poderoso governo nacional de Modi.

Por um lado, as empresas buscam estabilidade na liderança política, e raramente viu-se na Índia um líder tão consolidado. Ele demoliu o principal partido da oposição em três grandes eleições na região original dos hindus em dezembro e parece ter sua reeleição garantida este ano. Além disso, Modi se manifesta em favor dos negócios.

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O governo dele desempenha um papel notadamente intervencionista na gestão da economia, de uma forma que pode tornar mais arriscadas as apostas das empresas.

Em agosto, o governo anunciou súbitas restrições à importação de computadores laptop, para estimular a produção doméstica. Isso tirou do rumo as empresas que dependem deles, e a medida foi cancelada de forma igualmente súbita. Da mesma forma, em julho, o governo aplicou às empresas de apostas online um imposto retroativo de 28%, eviscerando de uma hora para a outra um setor que movimenta US$ 1,5 bilhão.

Empresas próximas a Modi e seu círculo político tiveram desempenho particularmente notável. Os exemplos de maior destaque são a Reliance Industries, de Mukesh Ambani, e o Adani Group, conglomerados que operam em múltiplas áreas do cotidiano indiano. Seu poder de mercado combinado se agigantou nos anos mais recentes: as principais ações de cada uma dessas empresas valem seis vezes mais, aproximadamente, do que o seu valor na época em que Modi se tornou primeiro-ministro.

Algumas empresas menores foram alvo de investigações chamativas por parte das agências fiscais.

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Grande dúvida dos analistas é se a Índia conseguirá ficar com uma parte significativa dos negócios globais herdada da China Foto: Rebecca Conway/The New York Times

“Para quem não for dos dois grandes As” — Adani ou Ambani — pode ser difícil navegar pelos caminhos da regulação indiana, disse o economista Arvind Subramanian, da Universidade Brown, que trabalhou no governo de Modi como conselheiro-chefe da economia de 2014 a 2018. “Os investidores domésticos se sentem um pouco vulneráveis”, acrescentou ele.

Os nove anos mais recentes do governo de Modi melhoraram muitos aspectos do ambiente dos negócios para todos. Sistemas fundamentais funcionam melhor, muitos tipos de corrupção foram contidos e a digitalização do comércio abriu novas áreas para o crescimento.

“O mais complexo e interessante no fenômeno de Modi é o quanto há de empolgação, fanfarronice e manipulação”, disse Subramanian. “Mas, por trás de tudo isso, há um núcleo de melhorias.”

Ainda assim, funcionários estrangeiros incumbidos de levar bilhões em capital de investimento à Índia se queixam dizendo que boa parte do desgaste tradicional de se fazer negócios com a Índia perdura. O problema mais citado é a burocracia. Muitos funcionários são envolvidos em cada etapa de aprovação, e continua sendo dolorosamente lento obter julgamentos legais, que dirá fazê-los valer.

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Outro fator que limita o investimento de prazo mais longo é uma fraqueza subjacente na “narrativa do crescimento da Índia”. A mais poderosa fonte de demanda, do tipo almejado pelos investidores estrangeiros e os negócios locais, está entre os consumidores mais ricos. Em uma população de 1,4 bilhão, cerca de 20 milhões de indianos vivem bem o suficiente para comprar produtos europeus, construir lares de luxo e comprar os modelos mais caros do setor automotivo.

A maior parte do restante da população luta contra a inflação nos preços dos alimentos e combustíveis. Os bancos oferecem crédito a consumidores de ambos os tipos, mas nem tanto às empresas, que temem que a maioria dos seus consumidores seguirá apertando o cinco pelos próximos anos.

“No momento, nada indica que os investidores se sintam mais confiantes em relação à Índia”, disse Subramanian.

Mas ele segue esperançoso. O crescimento anual, mesmo se inferior a 6%, não é nem um pouco desprezível. A infraestrutura nova e melhorada deve atrair mais investimento privado em algum momento. E os benefícios da riqueza dos consumidores, ainda que mal distribuída, pode levar com o tempo a um aumento na renda de mais pessoas.

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A grande dúvida é se a Índia conseguirá ficar com uma parte significativa dos negócios globais herdada da China. O exemplo mais chamativo é o da Apple, megaempresa de US$ 3 trilhões que está lentamente transferindo parte da sua cadeia de fornecimento para fora da China. Seu caro iPhone responde por apenas 5% do mercado indiano. Mas, atualmente, cerca de 7% dos iPhones do mundo são feitos na Índia, e o JPMorgan Chase estimou que a Apple pretende chegar à marca de 25% até 2025. Com isso, muitas coisas se tornarão possíveis para a Índia.

“Devemos manter a cabeça aberta”, disse Subramanian. /Tradução de Augusto Calil

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