RIO E SÃO PAULO - Sob pressão dos reajustes de medicamentos e encarecimento de alimentos, a inflação oficial no País acelerou de 0,16% em março para 0,38% em abril, segundo os dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) divulgados nesta sexta-feira, 10, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Apesar do avanço, o resultado foi o mais baixo para o mês desde 2021. Como consequência, a taxa acumulada em 12 meses arrefeceu pelo sétimo mês consecutivo: de 3,93% em março para 3,69% em abril, a mais baixa desde junho de 2023, aproximando-se mais da meta de inflação perseguida pelo Banco Central em 2024 (a meta é de 3,0%, com teto de tolerância de 4,50%).
A leitura de abril apresentou uma das composições mais benignas dos últimos seis meses, uma “boa notícia” para o Banco Central, que, no entanto, não deve abandonar a postura mais conservadora de cortes mais brandos na taxa básica de juros, a Selic, adotada na última reunião do Comitê e Política Monetária (Copom), avaliou a economista da corretora de investimentos CM Capital, Carla Argenta.
“Tivemos duas leituras consecutivas de inflação mais baixa nos serviços, que estavam pressionados por efeitos sazonais, no início do ano. Essa pressão que tínhamos visto antes não deveria assustar, porque sempre no início e fim de ano temos avanço nos serviços. Passados os efeitos sazonais, permanecem os efeitos da conjuntura macro, que é de arrefecimento desses itens”, observou Argenta.
Para Rafaela Vitoria, economista-chefe do Banco Inter, o IPCA de abril ficou acima do esperado, mas ainda sadio, sem sinais evidentes de reaceleração da inflação.
“Com a mudança no ritmo de cortes feita pelo Copom na última reunião devido à mudança no cenário externo, antecipamos a continuidade do ciclo de queda nos juros com cortes adicionais de 25 pontos-base (0,25 ponto porcentual), levando a Selic a 9,25% ao final de 2024″, previu Rafaela Vitória, economista-chefe do Inter.
A inflação de abril trouxe algumas surpresas em itens voláteis, com destaque para a gasolina e alguns alimentos, mas a abertura dos dados mostrou comportamento benigno, corroboraram economistas do banco Bradesco, em relatório.
“Os preços de alimentação no domicílio ficaram pouco acima do esperado (no IPCA de abril). As coletas ainda indicam um cenário benigno para o grupo nos próximos meses, mas os possíveis impactos das enchentes no Rio Grande do Sul demandam atenção”, escreveram os economistas do Bradesco, que calculam que as enchentes no estado devem contribuir com uma alta de 0,20 ponto porcentual na inflação, com destaque para pressões de preços de arroz e soja.
Alimentos mais caros
Na passagem de março para abril, o consumidor se deparou com menos alimentos com aumentos de preços, porém, os reajustes foram mais agudos, apontou André Almeida, gerente do Sistema Nacional de Índices de Preços do IBGE. O custo da alimentação subiu 0,70% em abril, mas o índice de difusão de itens alimentícios, que mostra o porcentual de produtos com aumentos de preços, desceu de 61% em março para 53% no último mês.
“Teve variação de dois dígitos no tomate e cebola”, apontou Almeida. “Teve variações mais altas em alimentos que têm peso relevante no consumo das famílias, isso acaba contribuindo para essa aceleração.”
Segundo o pesquisador, os preços dos alimentos têm subido nos últimos meses por uma influência climática sazonal, agravada nesta temporada pela ocorrência do fenômeno El Niño. A ocorrência de chuvas intensas e de ondas de calor ainda prejudica algumas lavouras, reduzindo a oferta de determinados itens.
O custo da alimentação no domicílio subiu 0,81% em abril. As famílias pagaram mais pelo mamão (22,76%), cebola (15,63%), tomate (14,09%) e café moído (3,08%). Já os preços das carnes recuaram 0,97%.
“Tem maior oferta de animais para abate, os preços das carnes têm caído nos últimos meses”, justificou Almeida.
A alimentação fora de casa aumentou 0,39% em abril: o lanche subiu 0,44%, enquanto a refeição avançou 0,34%.
Os gastos com saúde subiram 1,16%, influenciados pelo encarecimento do plano de saúde (0,76%), mas, sobretudo, dos produtos farmacêuticos, que aumentaram 2,84% em abril, em decorrência da autorização do reajuste de até 4,50% nos preços dos medicamentos a partir de 31 de março. Os destaques foram as altas do antidiabético (4,19%), do anti-infeccioso e antibiótico (3,49%) e do hipotensor e hipocolesterolêmico (3,34%).
Gasolina sobe, passagem aérea desce
Os combustíveis aumentaram 1,74%em abril. O etanol subiu 4,56%, a gasolina avançou 1,50%, e o óleo diesel aumentou 0,32%. A gasolina foi o item de maior pressão individual sobre a inflação de abril, uma contribuição de 0,08 ponto porcentual. A alta, porém, foi integralmente compensada por uma queda de 12,09% no preço das passagens aéreas, principal contribuição individual para conter a inflação oficial no País, -0,08 ponto porcentual.
Nos primeiros quatro meses de 2024, as passagens aéreas já recuaram 39,53%, mas ainda não devolveram a alta de 82,03% acumulada nos últimos quatro meses de 2023, ponderou André Almeida.
A energia elétrica deu o segundo maior alívio inflacionário no mês de abril, ao recuar 0,46%. Foram registrados reajustes tarifários positivos e negativos em diferentes áreas pesquisadas em abril, mas houve influência também de variações em impostos que incidem sobre a conta de luz.
“Teve queda de PIS/Cofins em diversas áreas da pesquisa, o que contribui para a queda na média (da energia) do Brasil”, disse Almeida.
Tragédia no Sul
As chuvas no Rio Grande do Sul podem prejudicar a produção de alimentos importantes na cesta de consumo das famílias, como o arroz, mas ainda é preciso aguardar para verificar quais seriam os eventuais impactos nos preços, apontou André Almeida, do IBGE.
“Nós não fazemos previsão”, frisou Almeida. “O Rio Grande do Sul é o maior produtor de arroz, tem produção de soja, de milho, tem produção de produtos importantes, produção de ração animal. As chuvas podem impactar a produção desses produtos, mas, (para saber) como isso vai se refletir nos preços desses produtos a gente precisa aguardar”, completou.
A inflação oficial do País, medida pelo IPCA, é decorrente de apurações de preços em 16 municípios ou regiões metropolitanas. A região metropolitana de Porto Alegre responde por um peso de 8,61% na formação da taxa do IPCA.
Questionado sobre o andamento da coleta do IPCA em território gaúcho, o IBGE respondeu que só conseguirá prestar esclarecimentos após avaliar melhor o impacto das chuvas.
“O IBGE segue avaliando o impacto das enchentes na coleta de dados no Rio Grande do Sul e vai se pronunciar quando tiver segurança técnica sobre as possíveis medidas a serem adotadas, de acordo com a pesquisa”, informou o IBGE à imprensa. “Vale lembrar que permanece a situação de calamidade no Rio Grande do Sul, inclusive com a ocorrência de chuvas.”
O instituto divulgou nesta sexta-feira, 10, os dados da inflação pelo IPCA de abril. O período de coleta do IPCA-15 referente a maio, com data de divulgação prevista para o próximo dia 28, se estenderia de 16 de abril ao dia 15 deste mês.
Questionado sobre quais seriam as soluções para uma eventual ausência significativa de respostas para a apuração da inflação no Rio Grande do Sul, o instituto respondeu que vai responder apenas “quando tiver todas as informações tecnicamente seguras”.
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