PUBLICIDADE

Publicidade

Análise|Inflação recua no mês, mas ainda falta construir um dinamismo sustentável

Enquanto o governo oscila entre a gastança e a prudência fiscal, as projeções do mercado apontam 2024 como mais um ano de expansão econômica, mas o avanço esperado para 2025 recuou de 1,92% para 1,90%

Foto do author Rolf Kuntz

Favorecido por um inverno ameno e boa produção de comida, o brasileiro conseguiu sobreviver com menor despesa em agosto, quando recuaram os principais índices de preços ao consumidor, puxados pelos custos da alimentação (-0,44%) e da habitação (-0,51%). O aumento do emprego e da renda do trabalho, nos meses anteriores, já havia dado algum alívio às famílias, na maioria endividadas e com dificuldade para manter as prestações em dia.

PUBLICIDADE

A chamada inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), diminuiu 0,02% no mês, mas subiu 4,24% em 12 meses, superando de longe o centro da meta (3%) e ficando pouco abaixo do limite de tolerância, 4,5%. Esses números valem para um público muito amplo, com renda mensal de até 40 salários mínimos. Para o povo mais modesto, com ganho de até cinco mínimos por mês, a taxa caiu 0,14% em agosto e aumentou 3,71% em 12 meses – número mais favorável que o do período encerrado em julho, 4,06%.

O governo pode celebrar o recuo da inflação mensal, mas continua obrigado a buscar o centro da meta. A alta de preços acumulada nos 12 meses até julho havia batido em 4,50%. Apesar da recente melhora, sobra uma longa distância até os 3% fixados como objetivo central para este ano e para os seguintes. A margem de tolerância é um espaço para acomodar desvios inevitáveis ou dificilmente evitáveis. Não é uma justificativa para políticas frouxas. Também seria perigoso entender a meta permanente, semelhante à usada nos Estados Unidos, como um alvo menos importante.

Queda nos custos da alimentação (-0,44%) ajudou no recuo do índice oficial de inflação no mês Foto: Serjão Carvalho/Estadão

Resta ao Banco Central (BC), nessa condição, manter o aperto necessário para alcançar o alvo ainda longínquo. Se houver algum afrouxamento da política, na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), previsto para os dias 17 e 18 deste mês, deverá ser muito cauteloso. Talvez nem haja afrouxamento. No mercado financeiro, a mediana das projeções elevou de 10,50% para 11,25% a taxa básica de juros (Selic) esperada para o final deste ano.

Essa mudança acompanhou o aumento da inflação estimada para 2024. Em quatro semanas o cálculo subiu de 4,20% para 4,30%. No mesmo período, o déficit projetado para as contas públicas permaneceu em 0,60% do Produto Interno Bruto (PIB), mas têm aumentado os sinais de inquietação no mundo das finanças.

As incertezas no mercado estão associadas à aparente despreocupação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação à saúde das contas públicas. O presidente se mostra pouco disposto a conter o dispêndio federal, como se o dinheiro aplicado em investimentos ou em programas sociais fosse diferente daquele destinado a outras finalidades. As aplicações são de fato diferentes e devem produzir efeitos distintos, mas o dinheiro tem a mesma natureza e a mesma finitude, em todos os casos. Os ministros econômicos sabem disso e às vezes parecem convencer o presidente a aceitar alguma prudência. Mas sua influência é limitada pelo entusiasmo de seu chefe e, além disso, são alvos constantes do fogo amigo.

Enquanto o governo oscila entre a gastança e a prudência fiscal, as projeções do mercado apontam 2024 como mais um ano de expansão econômica. Em quatro semanas o crescimento do PIB estimado para este ano subiu de 2,20% para 2,68%, de acordo com a pesquisa Focus. Mas o avanço esperado para 2025 recuou, no mesmo intervalo, de 1,92% para 1,90%. O governo continua falhando, segundo avaliação do mercado, em criar condições para um dinamismo sustentável.

Publicidade

Análise por Rolf Kuntz

Jornalista

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.