O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, na semana passada, anular uma decisão de 2022 sobre a chamada “revisão da vida toda” do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que havia concedido vitória aos aposentados. Os ministros não chegaram a julgar o recurso do INSS que questiona a revisão, mas a anulação veio por meio do julgamento de uma ação sobre o fator previdenciário, que estava havia 25 anos no Supremo.
O que o STF decidiu sobre a revisão da vida toda do INSS?
O julgamento ocorreu dentro do mesmo processo que questionava a validade do fator previdenciário, um índice criado em 1999 que considera vários critérios para definir o valor das aposentadorias. Ele tinha o objetivo de incentivar o segurado a trabalhar por mais tempo. Para isso, reduzia o benefício de quem se aposentava antes. Nesse ponto, o Supremo rejeitou a ação e declarou a constitucionalidade do fator previdenciário.
Os ministros também validaram outro dispositivo da mesma lei, que instituiu uma regra de transição entre dois regimes de previdência. O anterior a 1999 considerava os 36 maiores salários nos últimos 48 meses antes do afastamento para o cálculo do benefício. A partir dessa lei, passou-se a contabilizar os 80% maiores salários de toda a vida do trabalhador. Essa regra de transição previa que seriam excluídos dessa conta os salários anteriores a julho de 1994.
Esse entendimento é oposto ao que foi definido no julgamento da “revisão da vida toda”, em dezembro de 2022. Na ocasião, os ministros havia considerado que os aposentados teriam o direito de optar pela aplicação da regra mais benéfica no cálculo da aposentadoria, o que permitiria que aqueles que entraram na Justiça pudessem pedir o recálculo do benefício com base em todas as contribuições feitas ao longo da vida.
Na prática, a Corte decidiu que a regra de transição é obrigatória, e, por consequência, o segurado não pode optar pela regra que lhe for mais favorável. Dessa forma, a tese definida no julgamento da “revisão da vida toda” perdeu validade.
Quem será diretamente afetado pela decisão do INSS?
Todas as pessoas que já haviam dado entrada no pedido, assim como aquelas que se enquadravam no direito de pleitear a revisão, foram diretamente afetadas pela decisão, informa Theodoro Agostinho, especialista em direito previdenciário. A partir de agora, a revisão em uma regra mais vantajosa não será mais possível para essas pessoas.
Assim, o entendimento do STF reflete diretamente nos processos em andamento, que serão extintos. “Aqueles que porventura tiveram seu pedido julgado favorável agora estarão sob a iminência de responderem uma ação rescisória que certamente será proposta pelo INSS”, complementa o advogado.
O que falta o STF fazer?
Provavelmente nada mais será feito, segundo Agostinho. Pessoas que estão como amicus curiae (que entram em um processo com a função de fornecer subsídios ao órgão julgador – no caso, o STF) ainda poderão tentar pleitear o julgamento dos embargos de declaração, recursos para pedir esclarecimentos ou correções da decisão judicial. No entanto, o advogado acredita que a modificação do entendimento seja pouco provável.
Histórico
A lei que instituiu o fator previdenciário também criou uma regra de transição prevendo que, para segurados filiados antes da edição da norma, em 26 de novembro de 1999, o cálculo da média salarial abrangeria apenas 80% das maiores contribuições posteriores a julho de 1994, quando foi lançado o Plano Real. Já a regra definitiva, para os que se filiaram após a lei, leva em consideração 80% dos salários de contribuição de todo o período contributivo (vida toda).
Já era consenso que a regra do fator previdenciário seria declarada constitucional, pela manifestação do Supremo em outros momentos a favor da validade da regra. Portanto o foco da discussão girou em torno do impacto deste julgamento na decisão sobre a revisão da vida toda.
O STF definiu que a regra de transição do fator previdenciário é de aplicação obrigatória, entendimento apresentado pelo ministro Cristiano Zanin, que considerou que, como a Constituição Federal veda a aplicação de critérios diferenciados para a concessão de benefícios, não é possível que o segurado escolha uma forma de cálculo que lhe seja mais benéfica. Também votaram nesse sentido os ministros Flávio Dino, Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Kássio Nunes Marques (relator). A decisão livra a União de um impacto estimado em R$ 480 bilhões para as contas públicas.
Os processos de segurados que pedem a revisão da vida foram interrompidos desde julho do ano passado, quando o ministro Alexandre de Moraes suspendeu o trâmite em todas as instâncias da Justiça. Na decisão, ele assinalou que a suspensão valeria até o fim do julgamento do recurso do INSS contra a revisão da vida toda. Um estudo anexado ao processo no Supremo afirma que, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), até 31 de outubro de 2023, havia 61.411 ações em todo o país./COLABORARAM JESSICA BRASIL SKROCH E LAVÍNIA KAUCZ
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