Às vésperas das eleições presidenciais, os fundos de investimento brasileiros demostram receio em relação às empresas estatais. Os investimentos realizados por eles nas companhias públicas estão hoje no menor nível desde 2008, com R$ 36,1 bilhões em ações dessas empresas, que são listadas na Bolsa. O volume, considerando os dados de meados de agosto, representa queda de 43% em relação à posição do fim do ano passado e de 71% na comparação com 2019, momento pré-pandemia e quando se atingiu a máxima histórica, com R$ 124,5 bilhões.
Segundo analistas, a menor alocação reflete diretamente as pesquisas que mostram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na liderança, num momento em que parte da Faria Lima começa a deixar clara sua preferência por um segundo mandato de Jair Bolsonaro, pela visão de que seu governo é pró-mercado, deixando de lado as críticas sobre a gastança promovida pelo presidente em busca da reeleição. Antes de 2019, contudo, o pico anterior de investimentos em empresas estatais havia sido em 2010, exatamente durante o governo Lula, com um valor de R$ 94,4 bilhões. Em 2008, ano da quebra do banco Lehman Brothers e pior patamar da série histórica, os investimentos em ações de empresas do governo somaram R$ 30,4 bilhões.
O levantamento, feito pelo TC/Economatica a pedido do Estadão, abarca todas as estatais listadas na Bolsa, tanto as da esfera federal quanto as estatuais: são 20, ao todo. Os números ainda consideram os investimentos da Eletrobras, privatizada neste ano, mas que ainda possui a União como principal acionista, ou seja, a desestatização não explica o tombo no volume dos investimentos em empresas públicas neste ano. A leitura deve também levar em consideração que, além da maior ou menor alocação em estatais no período, o levantamento espelha o desempenho dos papéis, que em alguns casos perderam valor ao longo deste ano. O estudo também não leva em conta a compra de fundos estrangeiros no País.
Gestores de fundos consultados pela reportagem afirmam que hoje tem pesado na decisão de investimento a proximidade das eleições e a leitura de que há mais chances de privatizações em um segundo governo de Jair Bolsonaro do que em um novo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, que já se posicionou contra a venda de estatais. “Hoje o mercado ainda atribui uns 60% de chance para o Lula, uns 35% de chance para o Bolsonaro e uns 5% para outras hipóteses”, comenta uma fonte que pediu anonimato.
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No momento, a aversão ao risco está alta, o que se reflete nos CDS (Credit Default Swap), título que funciona como uma espécie de seguro para operações de crédito no país. No acumulado do ano, esse índice já subiu 18%. Recentemente, superou a casa dos 300 pontos, atingindo o maior patamar desde abril de 2020, o pior momento da pandemia.
No geral em anos eleitorais, explica o sócio e analista de fundos da Nord Research, Luiz Felippo, um dos pontos relevantes ao mercado é sobre uma possível troca do comando das estatais, algo que pode indicar qual será a adoção de políticas estratégicas pela empresa. “Há alguma incerteza sobre o tipo de gestão que a estatal pode ter, e isso pode deixar os gestores mais receosos. E há também na Bolsa outras empresas com preços atrativos, o que leva a uma competição”, diz.
O sócio e gestor da RPS Capital, Gustavo Fabrício, confirma que o cenário político tem grande influência na Bolsa dada a proximidade das eleições, em outubro. “Estamos há menos de três meses da escolha do próximo presidente do Brasil, e isso apresenta um impacto muito grande no que acontecerá com as empresas estatais. O governo Bolsonaro mostrou-se mais liberal para essas empresas, melhorando produtividade e dando liberdade de preço. O governo Lula, assim como Dilma e o PT, teve um passado mais estatizante e controlador de preços, fazendo com que algumas empresas estatais fossem deficitárias para buscar um controle de preços e inflação de forma artificial”, afirma. Por essa razão, explica, o mercado opta em não tomar o risco nesse momento.
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