RIO - A queda no custo da energia elétrica e uma nova rodada de reduções nos preços dos alimentos fizeram o Brasil registrar uma deflação de 0,02% em agosto, o primeiro resultado negativo do ano. Os dados são do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgados nesta terça-feira, 10, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O resultado do IPCA de agosto, o mais baixo desde junho de 2023, ficou aquém das estimativas de analistas do mercado financeiro ouvidos pelo Projeções Broadcast, que apontava uma alta mediana de 0,02%. Como consequência, a taxa de inflação acumulada em 12 meses arrefeceu, após três meses de avanços consecutivos, descendo a 4,24% em agosto.
Entretanto, o recuo de agosto não altera o cenário de inflação esperada para os próximos meses, o que consolida uma aposta de alta de 0,25 ponto porcentual na taxa básica de juros, a Selic, na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, avaliou o economista João Savignon, da gestora Kínitro Capital. A meta de inflação perseguida pelo BC em 2024 é de 3,00%, com teto de tolerância de 4,50%.
“Esse alívio que tivemos hoje não é suficiente para criar algum tipo de mudança de aposta em relação ao aperto monetário”, ressaltou Savignon. “Isso acaba consolidando, na verdade, o movimento de uma alta de 0,25 ponto.”
A leitura de agosto do IPCA foi bastante positiva, mas não deve ser suficiente para impedir o início de um ciclo de alta na taxa Selic, com elevação de 0,25 ponto porcentual no juro básico na reunião da próxima semana do Copom, corroborou o economista-sênior do Banco Inter, André Valério. O peso das expectativas de inflação de médio e longo prazo ainda desancoradas deve levar o BC a aumentar os juros, prevê.
“Existe uma diferença entre o que achamos que o BC deveria fazer e o que ele vai fazer. Na nossa visão, haveria espaço para aguardar, com a Selic em 10,5%, mas a desancoragem e a pressão do mercado vão pesar mais”, afirmou Valério. “Teria que vir uma queda (no IPCA) muito mais intensa para mudar isso”, reforçou.
Para o economista-chefe da gestora de recursos G5 Partners, Luis Otávio de Sousa Leal, o IPCA de agosto foi uma leitura boa “sob qualquer ponto de vista”, mas alguns pontos ainda demandam atenção, como a inflação de serviços.
“Além disso, a trégua de agosto deve durar pouco”, atenta Leal, que cita a pressão sobre o custo da energia elétrica pela nova mudança na bandeira tarifária, de verde para vermelha 1, acarretando cobrança extra sobre as contas de luz, além da possibilidade de a estiagem puxar para cima também a inflação de alimentos.
Em agosto, a queda de 2,77% na energia elétrica residencial exerceu o maior alívio individual sobre o IPCA, devido a uma substituição da bandeira tarifária amarela pela verde, o que eliminou, na ocasião, cobranças extras nas contas de luz. Para setembro, é esperado “forte aumento da tarifa de energia elétrica residencial decorrente da adoção de bandeira tarifária vermelha”, que adicionará cerca de 0,24 ponto porcentual ao IPCA do mês, calculou Matheus Ferreira, analista da Tendências Consultoria Integrada.
“Além disso, a expectativa de queda menos intensa das cotações de alimentos e de avanço das passagens aéreas impactarão positivamente os preços livres no próximo mês (setembro)”, estimou Ferreira.
Os gastos das famílias com Alimentação e bebidas recuaram 0,44% no mês de agosto, segunda queda consecutiva, motivada por uma maior oferta de itens alimentícios nas gôndolas de supermercados, apontou o IBGE. Ficaram mais baratos no mês a batata inglesa (-19,04%), o tomate (-16,89%) e a cebola (-16,85%). Na direção oposta, houve aumentos no mamão (17,58%), banana-prata (11,37%) e café moído (3,70%).
“A gente tem, historicamente, no início do ano temperaturas mais altas, chuvas mais intensas. E nesse meio do ano, a temperatura é mais amena, o volume de chuvas diminui, isso acaba favorecendo os preços de alimentos”, apontou André Almeida, gerente do Sistema Nacional de Índices de Preços do IBGE.
Quanto aos custos dos transportes, a gasolina ficou 0,67% mais cara, item de maior pressão individual sobre o IPCA do mês. Porém, a alta foi compensada por uma queda de 4,93% nos preços das passagens aéreas.
“Houve quedas de passagens aéreas e outros serviços de características turísticas, tradicionalmente mais demandados em meses de férias, em que as pessoas viajam mais e demandam mais esse tipo de serviço”, justificou Almeida, do IBGE, referindo-se a aluguel de veículo e pacote turístico./Colaborou Anna Scabello
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.