‘Situação fiscal não explica os juros tão extraordinariamente altos no Brasil’, diz Jeffrey Sachs

Em evento do BNDES, economista americano disse que juros elevados são um impeditivo para a elevação da taxa de investimentos no País

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RIO - Não há fundamentos econômicos, nem mesmo olhando para a situação fiscal, para explicar taxas de juros tão elevadas no Brasil, disse nesta terça-feira, 21, o economista americano Jeffrey Sachs, professor da Universidade Columbia, em palestra por vídeo durante seminário na sede do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Segundo o economista, os juros elevados são um impeditivo à elevação da taxa de investimento como proporção do Produto Interno Bruto (PIB), com destaque para o investimento público. Para Sachs, o baixo nível da taxa de investimento é o principal responsável pelo “problema fundamental” do Brasil, um crescimento econômico cronicamente baixo.

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“A situação fiscal do Brasil é distorcida por taxas de juros extraordinariamente altas. As taxas reais são tão altas não por causa dos fundamentos fiscais, mas por outras razões. Não por causa do orçamento”, afirmou Sachs, durante o seminário Estratégias de Desenvolvimento Sustentável para o Século XXI, promovido pelo BNDES em parceria com o Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

É o segundo dia do evento, anunciado em janeiro pelo presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, para debater temas da política econômica e marcar a criação de uma Comissão de Estudos Estratégicos, coordenada pelos economistas André Lara Resende e José Roberto Afonso.

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Às vésperas da divulgação da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) sobre a Selic, amanhã, o primeiro dia de seminário ontem já tinha sido marcado por críticas às elevadas taxas de juros no Brasil, por parte do vice-presidente Geraldo Alckmin e do economista americano Joseph Stiglitz, vencedor do Prêmio Nobel de economia em 2001.

O próprio presidente Lula vem criticando o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, pelo patamar de taxa Selic, hoje em 13,75% ao ano. Mas reduzir as taxas, como defendem os críticos, não é uma tarefa tão simples. A inflação tem se mostrado alta e resiliente, ainda fora da meta perseguida pelo BC. Reduzir a taxa de juros, nesse cenário, poderia sinalizar que o Banco Central não se preocupa com o atual nível de inflação, o que poderia ter consequências desastrosas para a economia.

O Brasil já viveu um cenário parecido durante o governo de Dilma Rousseff, quando a taxa de juros acabou sendo reduzida a um patamar de 7%, incompatível, segundo analistas, com a inflação da época. A avaliação é que essa foi uma das principais razões para a recessão que atingiu o País entre 2014 e 2016.

Perfil da dívida

Em sua palestra, Sachs minimizou a situação fiscal do Brasil. O endividamento, em termos líquidos, não é tão mais elevado que o de outros países emergentes, disse o americano. Além disso, o perfil da dívida pública é basicamente interno, com baixo endividamento externo. Por fim, o déficit primário nas contas públicas é relativamente pequeno, quando comparado ao de outras economias.

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“O peculiar é que o déficit (nominal) total é enorme, porque as taxas de juros são elevadas”, afirmou Sachs, ressaltando que, por causa da taxa básica, o juro médio da dívida pública do Brasil está em torno de 11% ao ano, contra 2% ao ano na dívida pública dos Estados Unidos, que tem um endividamento maior. Com isso, o Brasil gasta 7% do PIB com juros, no Orçamento. Enquanto isso, os EUA gastam 1,5% do PIB com juros.

O economista Jeffrey Sachs, durante seminário internacional realizado na sede do BNDES nesta terça-feira, 21.  Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Se a situação fiscal não justificaria taxas de juros elevadas, as pressões inflacionárias também não, continuou o economista americano. “A inflação é comparável com a dos EUA e da Europa”, afirmou Sachs. O BC poderia fixar a taxa básica de juros (Selic, hoje em 13,75% ao ano) em níveis mais elevados para “proteger” uma quantidade limitada de reservas cambiais, mas não é o caso do Brasil, completou o economista. “As reservas equivalem a 12 meses de importações, uma das relações mais elevadas do mundo.”

Por isso, segundo Sachs, a explicação para uma Selic tão elevada é uma “charada”, explicada por outras razões, que não o desequilíbrio fiscal, a inflação elevada ou o baixo nível de reservas. Uma das razões é que “a política do BC” coloca a Selic muito alta. “Parece que é por causa da política monetária ou por causa de um medo geral com crises”, afirmou Sachs.

Classificação de risco

O economista americano aproveitou para criticar as agências internacionais de classificação de risco. Para Sachs, não há fundamentos para o Brasil ter notas de crédito abaixo do grau de investimento - em 2015, com a Standard & Poor’s (S&P) à frente, as agências baixaram a nota soberana do Brasil, tirando o grau de investimento (nível a partir do qual a dívida pública de um país é considerada um investimento menos arriscado).

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Sachs sugeriu que o governo brasileiro faça gestões junto a organismos como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e às agências para melhorar suas notas. Em seguida, dado que o economista não considera o endividamento público elevado, especialmente o externo, Sachs recomendou que o governo recorresse a financiamentos de longo prazo com organismos multilaterais, como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), para ampliar os investimentos públicos, em infraestrutura e capital humano, em “vários pontos porcentuais” do PIB.

“A dívida aumentaria um pouco, mas o crescimento econômico também aumentaria. Se não, o Brasil ficará preso no baixo crescimento até aumentar as taxas de investimento significativamente”, afirmou Sachs.

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