A decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de tornar o ex-presidente Jair Bolsonaro inelegível por oito anos foi motivo de júbilo entre seus adversários. Como seria de se esperar, um sentimento de euforia contagiou a esquerda e a turma do centro que “fez o L” nas eleições “pela democracia”.
Embora o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha evitado se envolver diretamente com a questão, afirmando apenas que esse é um “problema da Justiça”, seus aliados falaram por ele nas redes sociais e fora delas, aproveitando a oportunidade para pontificar contra o “genocida”, o “golpismo” e o “fascismo”.
“Grande dia”, disse a deputada Gleisi Hoffmann, “presidenta” do PT. “O Brasil respira”, afirmou o deputado Guilherme Boulos, do PSOL, líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto). “Dia histórico. O TSE fez Justiça”, declarou a ministra do Planejamento, Simone Tebet, candidata à Presidência pelo MDB no primeiro turno. “Não se derrota o nazismo com flores”, observou, por sua vez, o deputado André Janones, do Avante. “Inelegível, oito anos, viva o Brasil”, bradou a cantora Maria Bethânia, durante um show em Oeiras, na região metropolitana de Lisboa, em Portugal.
Nome mais ‘civilizado’
Do lado da direita, o afastamento de Bolsonaro das disputas eleitorais até 2030 alimentou a expectativa de que um nome mais “civilizado” possa representar o grupo – aí incluídos os autodenominados “liberais progressistas”, ligados historicamente ao PSDB, que se aliaram a Lula no ano passado – em 2026.
Desde já, largaram na frente o governador de São Paulo e ex-ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos), e a senadora Tereza Cristina (PP), ex-ministra da Agricultura, além do governador de Minas, Romeu Zema (Novo), que apoiou o ex-presidente no segundo turno das eleições. Apesar da proximidade que têm com Bolsonaro, em maior ou menor grau, seus nomes despontaram como alternativas mais palatáveis no campo da direita que rechaça a atuação e os modos truculentos do ex-capitão.
É difícil, porém, imaginar que um deles possa ser o representante do grupo em condições competitivas em 2026 sem contar com o apoio de Bolsonaro. Ao contrário do que muita gente imagina, da esquerda e da direita, o revés do ex-presidente no TSE está longe de significar o fim de sua força política.
Um contingente expressivo dos brasileiros pode achar Bolsonaro um horror, por tudo o que ele diz e faz, e ter estourado champanhe para comemorar a sua inelegibilidade. Mas quem se deixar levar pela rejeição ao ex-presidente e acreditar que sua força foi eliminada no tapetão corre o sério risco de ser desmentido pelos fatos. O próprio Bolsonaro deu a letra, ao comentar a decisão do TSE: “Estou na UTI, mas não morri ainda”.
Não dá para ignorar que ele recebeu 60 milhões de votos nas eleições, quase a metade dos votos válidos, e representa uma parcela significativa da sociedade, por mais que isso pareça inconcebível para seus oponentes. Ainda que uma parte considerável de seus votos no segundo turno tenha vindo de eleitores de centro-direita e até de centro que não são bolsonaristas, mas preferem o demo a Lula e ao PT, a influência política de Bolsonaro não vai evaporar da noite para o dia.
Mesmo que a decisão do TSE e os acontecimentos de 8 de janeiro tenham levado uma parcela adicional de seus apoiadores a riscá-lo do mapa para sempre, boa parte, provavelmente, não só continua ao seu lado como ainda foi incensada pelo que considera como um “julgamento político” do ex-presidente e pelo fato de que os atos de Brasília tenham sido tratados impropriamente como uma tentativa de golpe de Estado.
‘Poste’
Não dá para negar também que o ex-presidente conseguiu, para o bem ou para o mal, dar uma face popular para a direita no País, já que seus votos estão longe de se limitar aos extratos de maior renda da população, como afirma a esquerda, nem que sua liderança se tornou um fenômeno político, cujo significado ainda carece de ser melhor estudado e compreendido em toda a sua extensão.
Agora, se Bolsonaro vai acabar apoiando no pleito de 2026 um dos nomes que ganharam os holofotes nos últimos dias, só o tempo dirá. Existe ainda a possibilidade de que ele prefira recrutar um “poste” mais alinhado ao bolsonarismo raiz para representá-lo, como fez Lula com o atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao apoiá-lo como candidato do PT em 2018, quando estava na prisão. O que parece certo, por ora, é que, de um jeito ou de outro, o peso político de Bolsonaro deverá sobreviver à decisão do TSE, mesmo que ele não possa ter seu nome nas cédulas de votação.
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