Em meio às ações tomadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para resgatar a política estatista adotada em governos anteriores do PT, às incertezas que cercam a área fiscal e à retomada da trajetória ascendente da dívida pública, o ex-ministro da Economia Paulo Guedes deverá lançar não apenas um, mas dois livros sobre sua gestão, que prometem estimular a comparação entre os resultados alcançados por ele e sua equipe e a atual realidade econômica do País.
Além da publicação escrita com o ex-ministro de Minas e Energia Adolfo Sachsida, também ex-secretário de Política Econômica, anunciada há três dias, Guedes deverá lançar outro livro a respeito de sua passagem pelo governo, com o ex-secretário especial da Fazenda Waldery Rodrigues Junior, que foi seu braço direito no ministério.
Como a obra com Sachsida, o livro feito com Waldery – cujo título será Caminho da Prosperidade: Política Econômica no período 2019-2022 – ainda está em processo de finalização e não tem editora e data de publicação definidas. Mas, segundo o ex-titular da Fazenda, o lançamento deverá ocorrer até o fim de maio, o que significa que ele acontecerá de forma quase simultânea ao do livro de Sachsida, que também deverá ser publicado nos próximos dois a três meses.
Enquanto a publicação com Sachsida, intitulada A política econômica no período 2019-2022: Consolidação fiscal e reformas pró-mercado para aumento de produtividade, é mais resumida e centrada na agenda microeconômica e em questões ligadas ao Ministério de Minas e Energia, a obra com Waldery vai trazer um relato detalhado das ações implementadas na gestão de Guedes, ancorado num conjunto robusto de dados e gráficos, que deverá ser disponibilizado em nuvem para livre acesso do público após o lançamento.
Com dois volumes, 16 capítulos e cerca de 700 páginas, o livro de Guedes com Waldery – que antecipou ao Estadão, em primeira mão, seu conteúdo – tem uma abordagem mais técnica e analítica e procura costurar as medidas realizadas no governo passado como um todo coerente, permeado pela visão de que os problemas do País são interligados e devem ser tratados levando em conta as implicações nas demais áreas.
De acordo com Waldery, o livro procura também inserir as ações implementadas nesse período no seu contexto histórico, comparando os resultados atingidos com os de outras administrações. As comparações consideram um período mais longo, de 1994 a 2023, e um período mais curto, de 2018 a 2023, que inclui os quatro anos da gestão do ex-ministro, o ano anterior e o ano seguinte.
Embora com forte ênfase nas questões macroeconômicas, em especial na área fiscal, “que é onde o Brasil precisava e ainda precisa entrar”, conforme o ex-secretário da Fazenda, o novo livro dedica o segundo volume às questões microeconômicas, como a aprovação dos novos marcos regulatórios e o desenvolvimento do mercado de capitais.
Segundo Waldery a ideia é que a publicação, que contou com a colaboração de vários ex-auxiliares de Guedes, seja usada como uma referência por estudantes e professores de cursos de Economia, tanto na graduação como na pós-graduação e no doutorado.
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No campo das contas públicas, considerado “há décadas” pelo ex-ministro como sendo a mais importante entre todas as políticas macroeconômicas, conforme Waldery, a orientação desde o começo era para que o controle de gastos fosse além do que estava previsto no teto fiscal, extinto no governo Lula, pelo qual o crescimento das despesas num ano estava limitado ao nível do ano anterior, corrigido pela inflação.
Do combate às três torres – gastos com benefícios da Previdência e despesas com pessoal e com o pagamento dos juros da dívida pública – aos “3Ds” – desindexação, desvinculação e desobrigação -, o livro mostra como Guedes conseguiu deixar uma herança fiscal positiva no fim de sua gestão, com a dívida pública em nível inferior ao de 2018 e um superávit primário de R$ 54,9 bilhões em 2022 em valores atualizados, que foram transformados num déficit de R$ 264,5 bilhões, de acordo com Waldery, no primeiro ano do governo Lula.
A obra dedica uma atenção especial às diferentes ferramentas usadas pelo governo por Guedes para reduzir a dívida pública, como as vendas de ativos e a antecipação do pagamento dos empréstimos feitos pelo Tesouro ao BNDES no governo Dilma, de quase R$ 500 bilhões, considerados como operações impróprias pelo TCU (Tribunal de Contas da União).
A pandemia é tratada num capítulo à parte, que inclui os programas lançados na época pelo governo, para suavizar seus efeitos para as empresas, os cidadãos e também para os Estados e municípios. Segundo Waldery, apesar de despesas governamentais terem gerado um déficit primário de R$ 745 bilhões em 2020, equivalente a quase 10% do PIB, elas não se tornaram permanentes, permitindo que, em 2021, o resultado das contas públicas voltasse ao nível de antes da pandemia.
Ações keynesianas
“Com a pandemia, houve uma pausa temporária na política fiscal que estava sendo implementada e tivemos de adotar ações keynesianas que não faziam parte do cardápio inicial, mas eram necessárias naquele momento”, afirmou. “Mas, logo em seguida, do ponto de vista fiscal, foi como se pandemia não tivesse existido.”
O livro deve mostrar que, mesmo com o corte de impostos e reduções de alíquotas de importação, a receita em 2021 foi superior à do pré-pandemia, em 2019, comprovando a previsão de Guedes de retomada em V da economia, que chegou a ser ridicularizada na época por muitos de seus pares, e houve superávit primário em 2022,o primeiro em oito anos. A visão de Guedes e sua equipe era de que a redução de tributos alivia a vida dos empreendedores e dos consumidores e acaba por produzir um efeito positivo na economia, levando a um aumento de arrecadação.
Além destas questões, o livro deverá abordar, entre outros temas, a interação das políticas fiscal e monetária, o novo pacto federativo, a abertura comercial, a desestatização e o desinvestimento, as reformas microeconômicas, como o novo marco de garantias, a alta do emprego formal, a redução da pobreza e da desigualdade e a ampliação significativa da digitalização de serviços públicos.
Os livros de Guedes com Waldery e Sachsida deverão ser complementados por um documentário sobre o legado do ex-ministro, que está sendo produzido pelo empresário Wiston Ling, responsável pela sua aproximação com o ex-presidente Jair Bolsonaro, em 2018, a ser lançado ainda este ano. E, no futuro, se os planos se concretizarem, Guedes ainda pretende escrever seu relato pessoal sobre sua experiência no governo.
Com tudo isso, não vai faltar material para quem quiser conhecer melhor o trabalho do ex-ministro e de sua equipe no extinto Ministério da Economia, marcado pela liberalização econômica, pelo equilíbrio fiscal e pela pandemia, na ótica dos próprios personagens da história.
Confira a seguir os capítulos dos dois volumes do livro de Paulo Guedes com Waldery Rodrigues Junior.
Caminho da Prosperidade: Política Econômica no Período 2019-2022 - Volume I
Cap 1. Introdução (princípios fundamentais, diretrizes e motivações para a política econômica implementada)
Parte A: Modelo (Abordagem) de Equilíbrio Geral para a gestão macroeconômica
Cap 2. Política Fiscal I: Equilíbrio e consolidação Fiscal, 3 Ds, ataque às “três torres, reforma da Previdência e regras fiscais
Cap 3. Política Fiscal II: Política Orçamentária responsável, Plano Mais Brasil, mecanismos parafiscais, gestão da dívida pública e herança fiscal positiva
Cap 4. COVID-19: Gestão e estratégia econômica no enfrentamento da mais grave pandemia dos últimos 100 anos
Cap 5. Política monetária, Conselho Monetário Nacional (CMN) e interação com Política Fiscal
Cap 6. Política creditícia e de regulação
Cap 7. Mercado de trabalho e emprego e redução da pobreza/desigualdade
Cap 8. Pacto Federativo e relacionamento com Estados/DF/municípios
Parte B: Abertura econômica e protagonismo internacional
Cap 9. Balança comercial/comércio exterior, estratégia geopolítica internacional e herança positiva no setor externo
Cap 10. Protagonismo internacional em segurança energética e segurança alimentar
Anexo: Governo em 12 slides
Caminho da Prosperidade: Política Econômica no Período 2019-2022 - Volume II
Parte C: Políticas microeconômicas e de impacto social e desenvolvimento dos mercados de capitais
Cap 11. Reformas microeconômicas e marcos regulatórios
Cap 12. Melhorias no quadro institucional
Cap 13. Desestatização e desinvestimento
Cap 14. Programas de Parcerias de Investimento (PPI)
Cap 15. Desburocratização, gestão e governo digital
Cap 16. Conclusão
Anexos e referências bibliográficas
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