O ministro do STF, Flávio Dino, avalizou formalmente a concessão de crédito extraordinário para fazer frente aos gastos para combater os incêndios florestais no País. Estes gastos não serão contabilizados nas limitações da Lei de Responsabilidade Fiscal, das metas fiscais e dos gastos com investimentos permitidos pelo arcabouço fiscal.
Independentemente da urgência e da indispensabilidade dos gastos, a decisão do ministro, além de ser mais uma interferência do Judiciário em assunto que cabe ao Legislativo, é mais uma exceção aos limites impostos pela legislação ao aumento de gastos do governo.
Quando do anúncio do arcabouço fiscal, a principal dúvida entre analistas e investidores era se o governo seria capaz de atingir as metas definidas.
Para atingir este objetivo, o governo conseguiu aprovar no Congresso um grande conjunto de medidas de aumento da carga tributária e, portanto, de receitas. Porém, o aumento dos gastos públicos, em particular dos gastos obrigatórios, não apenas forçou o governo a afrouxar significativamente as metas de 2025 e 2026, assim como manteve a dúvida sobre a capacidade de atingir as metas em 2024.
Porém, o que mais preocupa é a tendência a retirar gastos das metas a serem atingidas. Além dos gastos para financiar as medidas para combater os incêndios, já foram excepcionalizadas os gastos para pagar precatórios (R$ 44 bilhões), as enchentes no Rio Grande do Sul (estimados em R$ 29 bilhões), o programa Gás para Todos (R$ 14 bilhões), entre outros, além do custo para o Tesouro da renegociação das dívidas dos Estados (R$ 60 bilhões/ano). O resultado é que, mesmo se cumprir as metas, o déficit primário vai aumentar.
As metas de superávit primário e de investimentos foram definidas para controlar o aumento da dívida pública. E os aumentos de gastos terão de ser financiados por aumento da dívida, mesmo não sendo contabilizados nas metas. Em outras palavras, as metas do arcabouço fiscal perderam a função para a qual elas foram definidas.
Por nossas projeções, a dívida pública deverá atingir 85,7% do PIB em 2026, mesmo sem as exceções já definidas e as que ainda virão no futuro. E sem expectativa de estabilização no horizonte relevante.
O resultado é o aumento da percepção de risco do Brasil, da taxa de juros demandada pelos investidores para financiar a dívida e pressão sobre a taxa de câmbio. Mais cedo ou mais tarde, será indispensável um forte ajuste fiscal de caráter estrutural, que ataque a origem do problema, o aumento dos gastos obrigatórios, para evitar que a trajetória da dívida domine a política monetária, tornando-a inócua. Para que servem mesmo as metas fiscais?
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.