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Professor da PUC-Rio e economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo escreve quinzenalmente

Opinião | Brasil não tem nada a comemorar com o tarifaço dos Estados Unidos

Desvio de comércio decorrente do aumento das tarifas por parte dos EUA deverá ter um efeito importante sobre economia brasileira

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Foto do author José Márcio de Camargo

Ainda que muitos analistas tenham “comemorado” o fato de o Brasil, assim como outros países da América Latina, ter sido “agraciado” com a tarifa geral mínima de 10% sobre todas as importações oriundas do País, o desvio de comércio decorrente do aumento generalizado das tarifas pelos Estados Unidos sobre as importações de outros países deverá ter um efeito bastante importante sobre a economia brasileira.

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A China foi o país diretamente mais atingido, com tarifa adicional de 34%, o que, somado às tarifas já preexistentes, deverá gerar tarifas superiores a 70%. Em seguida vêm outros países do leste asiático, como Vietnã, Tailândia, Camboja, Laos, entre outros, todos com tarifas acima de 40%; e a União Europeia, cuja tarifa mínima foi definida em 20%. Isso além das tarifas para produtos específicos, como automóvel, aço e alumínio (25%).

Todos (exceto a União Europeia) são países cuja estrutura produtiva está diretamente ligada à China, rotas de passagem das exportações chinesas de produtos industriais para os Estados Unidos, como aparelhos audiovisuais, celulares, eletrodomésticos, vestuário, calçados etc.

Essa distribuição indica que o objetivo é reverter o processo de desindustrialização da economia americana. O propósito é eliminar a competitividade desses produtos nos Estados Unidos e, supostamente, incentivar as empresas a deslocar sua produção para o país.

O propósito das tarifas de Trump é eliminar a competitividade de produtos de fora nos Estados Unidos e, supostamente, incentivar as empresas a deslocar sua produção para o país Foto: Mark Schiefelbein/AP

Isso também explica por que os países da América Latina foram contemplados com a tarifa mínima de 10%, na medida em que são países exportadores de alimentos e minerais, não competitivos nos mercados de produtos industriais.

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Esse efeito é reforçado pela provável desaceleração da economia chinesa, fortemente dependente das exportações para os Estados Unidos, que serão taxadas em mais de 60%.

Com a redução da demanda nos Estados Unidos, uma parte importante da oferta desses países terá de procurar outros mercados, e a América Latina, inclusive o Brasil, deverá ser um dos principais destinos desses produtos.

De um lado, isso vai significar menos pressão inflacionária (exceto se a taxa de câmbio entrar em trajetória de desvalorização). De outro, vai afetar negativamente a produção industrial no Brasil, o que deverá gerar desindustrialização e redução do crescimento do PIB.

Qual dos efeitos vai ser dominante, é impossível prever, e vai, em grande parte, depender da reação da política fiscal à desaceleração do setor industrial. Quanto mais expansionista a política fiscal, maior o efeito inflacionário via desvalorização do real.

Opinião por José Márcio de Camargo

Professor aposentado do Departamento de Economia da PUC-Rio, é economista-chefe da Genial Investimentos

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