A economia global vem enfrentando grandes incertezas, ainda decorrentes da absorção dos efeitos da pandemia (inflação e recomposição das cadeias de suprimentos), da aceleração da crise climática, de um forte avanço tecnológico e de uma mudança geopolítica de porte, com a formação de dois grandes blocos.
É nesse contexto que a expressiva vitória de Donald Trump vai adicionar um grande grau de imprevisibilidade e de volatilidade. Há consenso entre analistas do cenário com Trump: elevação de tarifas, política agressiva de imigração, redução de tributos e elevação do déficit fiscal, tudo levando a uma pressão inflacionária.
No seu devido tempo, deveremos ter também a reversão na trajetória dos juros determinados pelo Fed. Pelo menos no caso das tarifas, existem visões mais otimistas, dizendo que Trump as usará mais como arma de negociação, sem aumentá-las exageradamente. A conferir.
Esse é um cenário ruim para os EUA: polarização política, protecionismo, piora na inflação e nos juros e ainda um provável ajuste nas Bolsas de Valores. Em consequência, projetamos também problemas para o resto do mundo.
Como já temos comentado muitas vezes, a desaceleração do crescimento da China parece inevitável. É perfeitamente possível um cessar-fogo na Ucrânia e no Oriente Médio, com impacto no petróleo. A elevação esperada na produção encontrará uma demanda bem fraca, derrubando as cotações.
Leia também
Finalmente, apesar da decepção quanto ao volume financeiro comprometido na COP-29, acreditamos que a transição energética seguirá adiante. Especialmente pelo engajamento de boa parte dos agentes econômicos, famílias e empresas.
Tudo isso implica um ambiente mais difícil para o nosso País, inclusive porque parte da recente desvalorização do real decorre diretamente desse novo cenário americano.
* * * * *
O pacote divulgado nesta semana foi um desastre raramente visto. A economia está crescendo entre 3% e 3,5%, com uma taxa de desemprego baixa e uma forte expansão na renda disponível das famílias. Ao mesmo tempo, a situação fiscal vem piorando persistentemente e a inflação tem subido.
Era, pois, o momento de fazer um ajuste nos gastos, com alteração de regras, que permitissem uma mudança nas expectativas e nas trajetórias futuras de inflação, juros e câmbio.
Em vez disso, o Palácio do Planalto optou por privilegiar “boas notícias”, desidratou os cortes e antecipou o anúncio de um projeto de IR, mal preparado e precariamente divulgado.
Ruim mesmo.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.